Poemas sobre Frio de Carlos de Oliveira

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Poemas de frio de Carlos de Oliveira. Leia este e outros poemas de Carlos de Oliveira em Poetris.

Leitura

Quando por fim as árvores
se tornam luminosas; e ardem
por dentro pressentindo;
folha a folha; as chamas
ávidas de frio:
nimbos e cúmulos coroam
a tarde, o horizonte,
com a sua auréola incandescente
de gás sobre os rebanhos.

Assim se movem
as nuvens comovidas
no anoitecer
dos grandes textos clássicos.

Perdem mais densidade;
ascendem na pálida aleluia
de que fulgor ainda?
e são agora
cumes de colinas rarefeitas
policopiando à pressa
a demora das outras
feita de peso e sombra.

Montanha

Sons sob a luz. Mosteiros,
torres sobrenaturais,
vibrando fluidamente no ar;
como? se o fluxo de mica,
os altos blocos de água,
cintilam sem rumor.

Toda esta arquitectura,
lenta percussão, perpassa;
sobre cerros sonoros;
com o seu contorno
infixo, fulgurando. Detenham-se
as estrelas quando
for noite; preguem-se
outros pregos de prata
fora do céu visível.
Sons já sem luz. Pastores
poisam as ocarinas, bebem;
entre colinas ocas;
o frio coalhado
pelas tetas das cabras.

Dentes

Os dentes, porque são dentes,
iniciais. Na espuma,
porque não são saliva
estas ondas
pouco mordentes; este
sal que sobe quase
doce; donde?

Numa espécie
de fogo: amor é fogo
que arde sem se ver;
porque não é
de facto fogo este frio aceso;
da saliva à lava
passa pela espuma.

Só os dentes.
Duros, ácidos, concentram-se
tacteando a pele,
tatuando signos sempre
moventes
de fúria. Mordida
a pele cintila; espelho
dos dentes, do seu esmalte voraz;
suavemente.

Lágrima

A cada hora
o frio
que o sangue leva ao coração
nos gela como o rio
do tempo aos derradeiros glaciares
quando a espuma dos mares
se transformar em pedra.

Ah no deserto
do próprio céu gelado
pudesses tu suster ao menos na descida
uma estrela qualquer
e ao seu calor fundir a neve que bastasse
à lágrima pedida
pela nossa morte.