Poemas sobre Mortos de Pedro Homem de Melo

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Poemas de mortos de Pedro Homem de Melo. Leia este e outros poemas de Pedro Homem de Melo em Poetris.

Os Poetas

Nunca os vistes
Sentados nos cafés que há na cidade,
Um livro aberto sobre a mesa e tristes,
IncĂłgnitos, sem oiro e sem idade?

Com magros dedos, coroando a fronte,
Sugerem o nostálgico sentido
De quem rasgasse um pouco de horizonte
Proibido…

Fingem de reis da Terra e do Oceano
(E filhos sĂŁo legĂ­timos do vĂ­cio!)
Tudo o que neles nos pareça humano
É fogo de artifício.

Por vezes, fecham-lhes as portas
— Ódio que a nada se resume —
Voltam, depois, a horas mortas,
Sem um queixume.

E mostram sempre novos laivos
De poesia em seu olhar…

Adolescentes! Afastai-vos
Quando algum deles vos fitar!

Eternidade

A minha eternidade neste mundo
Sejam vinte anos sĂł, depois da morte!
O vento, eles passados, que, enfim, corte
A flor que no jardim plantei tĂŁo fundo.

As minhas cartas leia-as quem quiser!
Torne-se pĂşblico o meu pensamento!
E a terra a que chamei — minha mulher —
A outros dê seu lábio sumarento!

A outros abra as fontes do prazer
E teça o leito em pétalas e lume!
A outros dĂŞ seus frutos a comer
E em cada noite a outros dĂŞ perfume!

O globo tem dois pĂłlos: Ontem e hoje.
Dizemos só: — Meu pai! ou só:— Meu filho!
O resto Ă© baile que nĂŁo deixa trilho.
Rosto sem carne; fixidez que foge.

Venham beijar-me a campa os que me beijam
Agora, frágeis, frívolos e humanos!
Os que me virem, morto, ainda me vejam
Depois da morte, vivo, ainda vinte anos!

Nuvem subindo, anis que se evapora…
Assim um dia passe a minha vida!
Mas, antes, que uma lágrima sentida
Traga a certeza de que alguém me chora!

Adro!

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Escárnio

O meu amor anda em fama.
Mesmo assim lhe quero bem.
Cegueira? Seja o que for!
Os olhos do meu amor
Não os vejo em mais ninguém.

Tentaram deitá-lo à rua,
Mas abri-lhe a minha porta,
E a minha mĂŁo, toda nua,
Varreu toda a noite morta.
Porém, mil vozes, medonhas
Como pedaços de lama,
Segredaram-me vergonhas
Do meu amor que anda em fama.

Ai! a dor! — casa florida…
Ai! o amor! — casa cercada.

Há-de-se acabar a vida
Com a Ăşltima pedrada!..

Fui Pedir um Sonho ao Jardim dos Mortos

Fui pedir um sonho ao jardim dos mortos.
Quis pedi-lo, aos vivos. Disseram-me que nĂŁo.
Os mortos não sabem, lá onde é que estão,
Que neles se enfeitam os meus braços tortos.

Os mortos dormiam… Passei-lhes ao lado.
Arranquei-lhes tudo, tudo quanto pude;
Páginas intactas — um livro fechado
Em cada ataĂşde.

Ai as pedras raras! As pedras preciosas!
Relâmpagos verdes por baixo do mar!
A sombra, o perfume dos cravos, das rosas
Que os dedos, já hirtos, teimavam guardar!

Minha alma é um cadáver pálido, desfeito.
As suas ossadas
Quem sabe onde estĂŁo?
Trago as mĂŁos cruzadas,
Pesam-me no peito.
Quem sabe se a lama onde hoje me deito
Dará flor aos vivos que dizem que não?