Poemas sobre Morte de Pedro Homem de Melo

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Poemas de morte de Pedro Homem de Melo. Leia este e outros poemas de Pedro Homem de Melo em Poetris.

Resgate

NĂŁo sou isto nem aquilo
É o meu modo de viver
É, às vezes, tão tranquilo
Que nem chega a dar prazer…
Todavia, onde apareço,
Logo a paz desaparece
E a guerra que não mereço
DĂĄ princĂ­pio Ă  minha prece.
És alegre? VĂȘs-me triste?
Por que nĂŁo te vais embora?
Quem Ă© triste Ă© porque Ă© triste.
E quem chora Ă© porque chora.
Tenho tudo o que nĂŁo tens
Tenho a névoa por remate.
Sou da raça desses cães
Em que toda a gente bate.
SĂł a idade com o tempo
HĂĄ-de vir tornar-me forte.
A uns, basta-lhes o vento…
Aos Poetas, basta a morte.

Eternidade

A minha eternidade neste mundo
Sejam vinte anos sĂł, depois da morte!
O vento, eles passados, que, enfim, corte
A flor que no jardim plantei tĂŁo fundo.

As minhas cartas leia-as quem quiser!
Torne-se pĂșblico o meu pensamento!
E a terra a que chamei — minha mulher —
A outros dĂȘ seu lĂĄbio sumarento!

A outros abra as fontes do prazer
E teça o leito em pétalas e lume!
A outros dĂȘ seus frutos a comer
E em cada noite a outros dĂȘ perfume!

O globo tem dois pĂłlos: Ontem e hoje.
Dizemos só: — Meu pai! ou só:— Meu filho!
O resto Ă© baile que nĂŁo deixa trilho.
Rosto sem carne; fixidez que foge.

Venham beijar-me a campa os que me beijam
Agora, frĂĄgeis, frĂ­volos e humanos!
Os que me virem, morto, ainda me vejam
Depois da morte, vivo, ainda vinte anos!

Nuvem subindo, anis que se evapora…
Assim um dia passe a minha vida!
Mas, antes, que uma lĂĄgrima sentida
Traga a certeza de que alguém me chora!

Adro!

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Simplicidade

Queria, queria
Ter a singeleza
Das vidas sem alma
E a lĂșcida calma
Da matéria presa.

Queria, queria
Ser igual ao peixe
Que livre nas ĂĄguas
Se mexe;

Ser igual em som,
Ser igual em graça
Ao pĂĄssaro leve,
Que esvoaça…

Tudo isso eu queria!
(Ser fraco Ă© ser forte).
Queria viver
E depois morrer
Sem nunca aprender
A gostar da morte.

Aliança

Por tudo quanto sei, mas nĂŁo sabia,
(Feliz de quem um dia ainda o souber!)
Por essa estrela branca em noite fria!
Anunciação, talvez, de poesia…
Por ti, minha mulher!

Por esse homem que sou, mas que nĂŁo era,
Vendo na morte a vida que vier!
Por teu sorriso em minha vida austera.
Anunciação, talvez de Primavera…
Por ti, minha mulher!

Pelo caminho humano a que vieste
Com fĂ© no amor. — Seja o que Deus quiser!
Por certa fonte abrindo a rocha agreste…
Por esse filho loiro que me deste!
Por ti, minha mulher!

Pelo perdĂŁo que espalho aos quatro ventos,
De antemĂŁo cego ao mal que me trouxer
Despeitos surdos, pérfidos momentos;
Pelos teus passos, junto aos meus, mais lentos…
Por ti, minha mulher!

Nada mais digo. Nada. Que nĂŁo posso!
Mas dirĂĄ mais do que eu quem nĂŁo disser
Como eu?: — AvĂ©-Maria… Padre-Nosso…
Por tudo quanto Ă© meu (e que Ă© tĂŁo nosso!)
Por ti, minha mulher!

Ironia

De tanto pensar na morte
Mais de cem vezes morri.
De tanto chamar a sorte
A sorte chamou-me a si.

Deu-me frutos duradoiros
A paz, a fortuna, o amor.
As musas vieram pĂŽr
Na minha fronte os seus loiros…

Hoje o meu sonho procura
Com saudade a poesia
Dos tempos em que eu sofria…

— Que triste coisa a ventura!

DivĂłrcio

Cidade muda, rente a meu lado,
Como um fantasma sob a neblina…
HĂĄ cem mil rostos. Tanto soldado
E tanto abraço desesperado
Nesta cidade tĂŁo masculina!

Cidade muda como um soldado.

Cidade cega. Todos os dias,
A nossa vida fica mais breve,
As nossas mĂŁos ficam mais frias…
Todos os dias, todos os dias,
A morte paga, paga a quem deve.

Cidade cega todos os dias.

Cidade oblĂ­qua. Sexo pesado.
Rio de cinza, lĂșgubre e lento…
Bandeira negra, barco parado,
Nunca o teu nome foi baptizado
Nem o teu beijo foi casamento!

Cidade minha, do meu pecado…

Cidade estranha, sabes que existo?
Os homens passam… Para onde vĂŁo?
SĂł tem amores quem nĂŁo for visto.
Por isso canto, sĂł porque insisto
Em dar combates à tentação.

Oh! a volĂșpia de nĂŁo ser visto!