Inominado Nome
Persigo-o no ininteligĂvel arbĂtrio
dos astros, na clandestina linfa
que percorre os tĂșrgidos corredores
do indecifrĂĄvel, nos falsos indĂcios
que, de fogos fĂĄtuos, escurecema persistente incĂłgnita do nome.
Em persegui-lo persisto onde, bem
sei, nĂŁo lograrei achĂĄ-lo, que nunca
achado serå em tempo ou espaço
que excedam meu limite e dimensĂŁo.Um nome, ainda obscuro, pressinto
no sal da boca amarga, Conheço-lhe
o rosto familiar, desfocado embora,
no halo do tempo e da distĂąncia.
Ă, creio, a face indefectĂvel de tudoquanto tenho de calar. Este nome
(este rosto) habita-me silente, contra
a recusa, a mentira, ou a calĂșnia.
Na epiderme, nos nervos e na carne,
sobre a lĂngua e o palato, adivinho-lheforma, sabor e propĂłsito. Ouço-o
dentro de mim, mau grado
o queira ou nĂŁo, que em mim
sĂł estĂĄ sofrĂȘ-lo porque em mim
vive e dura, enquanto eu dure e viva.E nĂŁo por meu mal, que meu
mal seria, mais que perdĂȘ-lo,
sem ele viver.
Um rosto persigo,
um nome guardo no sal da bocaamarga,
Poemas sobre SilĂȘncio de Rui Knopfli
3 resultadosO Livro Fechado
Quebrada a vara, fechei o livro
e nĂŁo serĂĄ por incĂșria ou descuido
que algumas pĂĄginas se reabram
e os mesmos fantasmas me visitem.
Fechei o livro, Senhor, fechei-o,mas os mortos e a sua memĂłria,
os vivos e sua presença podem mais
que o ĂĄlcool de todos os esquecimentos.
Abjurado, recusei-o e cumpro,
na gangrena do corpo que me coube,em lugar que lhe nĂŁo compete,
o dia a dia de um destino tolerado.
Na raça de estranhos em que mudei,
é entre estranhos da mesma raça
que, dissimulado e obediente, o sofro.Aventureiro, ou nĂŁo, servidor apenas
de qualquer missĂŁo remota ao sol poente,
em amanuense me tornei do horizonte
severo e restrito que me nĂŁo pertence,
lavrador vergado sobre solo alheioonde nĂŁo cai, nem vinga, desmobilizada,
a sombra elĂptica do guerreiro.
Fechei o livro, calei todas as vozes,
contas de longe cobradas em nada.
Fale, somente, o silĂȘncio que lhes sucede.
Metodologia
Convoco os duendes da inquietação
e da alegria, urdindo um laborioso
rito circular, delicada teia iridiscente
de que, relutante, a luz se vĂĄ
pouco a pouco enamorando.Palavras nĂŁo as profiro
sem que antes as tenha encantado
de vagarosa ternura; mal esboçados,
gestos ou afagos, apenas me afloram
a hesitante extremidade dos dedosque, aquĂĄticos e transidos, estacam
no limiar surpreso do seu rosto.
Movimentos longos da tarde
e sussurros graves da noite
que tendessem para a imobilidadee o silĂȘncio, nĂŁo seriam mais cautos
e aéreos. Quietas eståtuas de cristal,
intensamente nos fitamos, enquanto
trémula, lenta e comburente,
a luz mais pura nos atravessa.