Poemas sobre SilĂȘncio de Rui Knopfli

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Poemas de silĂȘncio de Rui Knopfli. Leia este e outros poemas de Rui Knopfli em Poetris.

Inominado Nome

Persigo-o no ininteligĂ­vel arbĂ­trio
dos astros, na clandestina linfa
que percorre os tĂșrgidos corredores
do indecifrĂĄvel, nos falsos indĂ­cios
que, de fogos fĂĄtuos, escurecem

a persistente incĂłgnita do nome.
Em persegui-lo persisto onde, bem
sei, nĂŁo lograrei achĂĄ-lo, que nunca
achado serå em tempo ou espaço
que excedam meu limite e dimensĂŁo.

Um nome, ainda obscuro, pressinto
no sal da boca amarga, Conheço-lhe
o rosto familiar, desfocado embora,
no halo do tempo e da distĂąncia.
É, creio, a face indefectível de tudo

quanto tenho de calar. Este nome
(este rosto) habita-me silente, contra
a recusa, a mentira, ou a calĂșnia.
Na epiderme, nos nervos e na carne,
sobre a lĂ­ngua e o palato, adivinho-lhe

forma, sabor e propósito. Ouço-o
dentro de mim, mau grado
o queira ou nĂŁo, que em mim
sĂł estĂĄ sofrĂȘ-lo porque em mim
vive e dura, enquanto eu dure e viva.

E nĂŁo por meu mal, que meu
mal seria, mais que perdĂȘ-lo,
sem ele viver.
Um rosto persigo,
um nome guardo no sal da boca

amarga,

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O Livro Fechado

Quebrada a vara, fechei o livro
e nĂŁo serĂĄ por incĂșria ou descuido
que algumas pĂĄginas se reabram
e os mesmos fantasmas me visitem.
Fechei o livro, Senhor, fechei-o,

mas os mortos e a sua memĂłria,
os vivos e sua presença podem mais
que o ĂĄlcool de todos os esquecimentos.
Abjurado, recusei-o e cumpro,
na gangrena do corpo que me coube,

em lugar que lhe nĂŁo compete,
o dia a dia de um destino tolerado.
Na raça de estranhos em que mudei,
é entre estranhos da mesma raça
que, dissimulado e obediente, o sofro.

Aventureiro, ou nĂŁo, servidor apenas
de qualquer missĂŁo remota ao sol poente,
em amanuense me tornei do horizonte
severo e restrito que me nĂŁo pertence,
lavrador vergado sobre solo alheio

onde nĂŁo cai, nem vinga, desmobilizada,
a sombra elĂ­ptica do guerreiro.
Fechei o livro, calei todas as vozes,
contas de longe cobradas em nada.
Fale, somente, o silĂȘncio que lhes sucede.

Metodologia

Convoco os duendes da inquietação
e da alegria, urdindo um laborioso
rito circular, delicada teia iridiscente
de que, relutante, a luz se vĂĄ
pouco a pouco enamorando.

Palavras nĂŁo as profiro
sem que antes as tenha encantado
de vagarosa ternura; mal esboçados,
gestos ou afagos, apenas me afloram
a hesitante extremidade dos dedos

que, aquĂĄticos e transidos, estacam
no limiar surpreso do seu rosto.
Movimentos longos da tarde
e sussurros graves da noite
que tendessem para a imobilidade

e o silĂȘncio, nĂŁo seriam mais cautos
e aéreos. Quietas eståtuas de cristal,
intensamente nos fitamos, enquanto
trémula, lenta e comburente,
a luz mais pura nos atravessa.