Poemas sobre Luz

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Poemas de luz escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Só os Lábios Respiram

Só os lábios respiram. Simples gesto vivo,
exílio do som onde se oculta o pavor da
palavra, pátria salgada cerrada no vazio
da casa de velhos deuses ávidos de preces.
Na garra da águia se fecha e rompe a boca,
templo e entranha, prodígio e anel
do eco, sinal esparso do caído concerto
da vida. Por estes soberbos montes, estas
rasas colinas, estas águas circulantes,
vai o grito da cegueira, o delírio lasso
na manhã, a saciada loucura do escuro
nome nocturno. Como um fragor dos céus,
caminha o canto agudo das árduas cigarras
perseguindo a funesta morte. Por esta
paisagem parda, que lábios me guardam
do próximo desastre, a mudança em ave,
cio ou sal, erva ou peixe, cicatriz ou
mito, veia ou água? Que lábios respiram
na coisa mortal que serei após o termo
da eterna efemeridade deste meu corpo,
coma de luz, deste desejo, rijo resíduo,
deste pensamento, disfarce ou máscara,
deste rapto do tempo, deste
coração que começa?

Não Consentem os Deuses Mais que a Vida

Não consentem os deuses mais que a vida.
Tudo pois refusemos, que nos alce
A irrespiráveis píncaros,
Perenes sem ter flores.
Só de aceitar tenhamos a ciência,
E, enquanto bate o sangue em nossas fontes,
Nem se engelha conosco
O mesmo amor, duremos,
Como vidros, às luzes transparentes
E deixando escorrer a chuva triste,
Só mornos ao sol quente,
E refletindo um pouco.

visto a esta luz

Visto a esta luz és um porto de mar
como reverberos de ondas onde havia mãos
rebocadores na brancura dos braços

Constroem-te um ponte
que deverá cingir-te os rins para sempre

O que há horrível no teu corpo diurno
é a sua avareza de palavras
és tu inutilmente iluminado e quente
como um resto saído de outras eras
que te fizeram carne e se foram embora
porque verdade sem erro certo verdadeiro
nada era noite bastante para tocarmos melhor
as nossas mãos de nautas navegando o espaço
os corpos um e dois do navio de espelhos
filhos e filhas do imponderável
de cabeça para baixo a ver a terra girar

Quero-te sempre como nã querer-te?
mas esta luz de sinopla nas calças!
este interposto objecto
e o seu leve peso de eternidade

Aspiração

Sinto que há na minha alma um vácuo imenso e fundo,
E desta meia morte o frio olhar do mundo
Não vê o que há de triste e de real em mim;
Muita vez, ó poeta, a dor é casta assim;
Refolha-se, não diz no rosto o que ela é,
E nem que o revelasse, o vulgo não põe fé
Nas tristes comoções da verde mocidade,
E responde sorrindo à cruel realidade.

Não assim tu, ó alma, ó coração amigo;
Nu, como a consciência, abro-me aqui contigo;
Tu que corres, como eu, na vereda fatal
Em busca do mesmo alvo e do mesmo ideal.
Deixemos que ela ria, a turba ignara e vã;
Nossas almas a sós, como irmã junto a irmã,
Em santa comunhão, sem cárcere, sem véus.
Conversarão no espaço e mais perto de Deus.

Deus quando abre ao poeta as portas desta vida
Não lhe depara o gozo e a glória apetecida;
Tarja de luto a folha em que lhe deixa escritas
A suprema saudade e as dores infinitas.
Alma errante e perdida em um fatal desterro,

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Xácara do Infinito

Fazia papa-luaça
com lama azul dos paúis;
e embaciava a vidraça;
ou de olhos baços, azuis,
parados, largos, serenos,
como o silêncio dos mudos,
ou fitos, picos, pequenos,
venenos de ângulos agudos.

Ou gargalhava estridente
como um riscar de repente
de uma faúlha de luz
em escuros de urros e uuus
que arrefecia os cabelos!
E a dissonância em novelos
rolava fundo e medonho
a meio do chão:.. Catrapuz!…
como um vómito de luz
a estoirar dentro dum sonho!

Ou escancarava a vidraça
a rir pedradas de lata;
mas logo o feixe-desfeixe
porque a lata se desata
e cai em pata de pata
na lájea das cousas mortas
das mortas noites sem portas!

E logo a Noite corria,
e a vista via… – não via:
porque entre o ver e o não ver
há uma distância a correr
que pode ser… – ou não ser
uma distância a valer!

Aquele espaço intervalo
dum cabelo ou duma unha
à sensação de ter unha
é uma distância a cavalo
como a distância da unha
ao movimento da unha!

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Estar Só é Estar no Íntimo do Mundo

Por vezes   cada objecto   se ilumina
do que no passar é pausa íntima
entre sons minuciosos que inclinam
a atenção para uma cavidade mínima
E estar assim tão breve e tão profundo
como no silêncio de uma planta
é estar no fundo do tempo ou no seu ápice
ou na alvura de um sono que nos dá
a cintilante substância do sítio
O mundo inteiro assim cabe num limbo
e é como um eco límpido e uma folha de sombra
que no vagar ondeia entre minúsculas luzes
E é astro imediato de um lúcido sono
fluvial e um núbil eclipse
em que estar só é estar no íntimo do mundo

Num Bairro Moderno

Dez horas da manhã; os transparentes
Matizam uma casa apalaçada;
Pelos jardins estancam-se as nascentes,
E fere a vista, com brancuras quentes,
A larga rua macadamizada.

Rez-de-chaussée repousam sossegados,
Abriram-se, nalguns, as persianas,
E dum ou doutro, em quartos estucados,
Ou entre a rama do papéis pintados,
Reluzem, num almoço, as porcelanas.

Como é saudável ter o seu conchego,
E a sua vida fácil! Eu descia,
Sem muita pressa, para o meu emprego,
Aonde agora quase sempre chego
Com as tonturas duma apoplexia.

E rota, pequenina, azafamada,
Notei de costas uma rapariga,
Que no xadrez marmóreo duma escada,
Como um retalho da horta aglomerada
Pousara, ajoelhando, a sua giga.

E eu, apesar do sol, examinei-a.
Pôs-se de pé, ressoam-lhe os tamancos;
E abre-se-lhe o algodão azul da meia,
Se ela se curva, esguelhada, feia,
E pendurando os seus bracinhos brancos.

Do patamar responde-lhe um criado:
“Se te convém, despacha; não converses.
Eu não dou mais.” È muito descansado,
Atira um cobre lívido, oxidado,
Que vem bater nas faces duns alperces.

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Acto de Contrição

Pela luz rara da garagem dois vultos
vão pôr o lixo. São velhos desconhecidos. Um
ao outro dão passagem (a
máscara de um cumprimento) esquivos na
escatológica arqueologia das misérias.
Homens de lixo na mão: exímios
a ocultar
versos da vida doméstica (quando
o gesto liso cabe ao avental abundante que os
devolve a casa). Há
em todo esse agravo uma redenção ferida
(um juízo resolvido) como que um
indulto lento.

Escreve!

Não sei o que supor
Do teu silêncio. Escreve!
Quem é amado deve
Ser grato ao menos, flor!

Se eu fosse tão feliz
Que te falasse um dia,
De viva voz diria
Mais do que a carta diz.

Mas olha, tal qual é,
Não rias desse escrito,
Que pouco ou muito é dito
Tudo de boa-fé.

Há nesse teu olhar
A doce luz da Lua,
Mas luz que se insinua
A ponto de abrasar…

Pareça nele, sim,
Que há só doçura, embora,
Há fogo que devora…
Que me devora a mim!

Que mata, mas que dá
Uma suave morte;
Mata da mesma sorte
Que uma árvore que há;

Que ao pé se lhe ficou
Acaso alguém dormindo
Adormeceu sorrindo…
Porém não acordou!

Esse teu seio então…
Que encantadora curva!
Como de o ver se turva
A vista e a razão!

Como até mesmo o ar
Suspende a gente logo,
Pregando olhos de fogo
Em tão formoso par!

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Amo-te Sempre

Amo-te sempre
com um pouco de barco e de vento
com uma humildade de mar à tua volta
dentro do meu corpo; com o desespero
de ser tempo;

com um pouco de sol e uma fonte
adormecida na ternura.

Merecer este minuto de palavras habitando
o que há sem fim no teu retrato;
Este mesmo minuto em que chegam e partem navios
– nesta mesma cidade deste
minuto, desta língua, deste
romance diário dos teus olhos –

(e chegarão com armas? refugiados? trigo?
partirão com noivas? missionários? guerras? discursos?)

Merecer a densa beleza do teu corpo
que tem água e ternura, células, penumbra,
que dormiu no berço, dormiu na memória,
que teve soluços, febre, e absurdos desejos
maiores que os braços,

merecer os dias subindo das florestas – e vêm
banhar-se, lentos, nos teus olhos…

Merecer a Igreja, o ajoelhar das palavras,
entre estes cinemas visitando, em duas horas, a alma,
estes eléctricos parando atrás do infinito
para subirem os namorados, a viúva, o cobrador da luz, a
costureira
entre estes homens que ganham dinheiro,

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As Rosas Amo dos Jardins de Adônis

As Rosas amo dos jardins de Adônis,
Essas volucres amo, Lídia, rosas,
Que em o dia em que nascem,
Em esse dia morrem.
A luz para elas é eterna, porque
Nascem nascido já o sol, e acabam
Antes que Apolo deixe
O seu curso visível.
Assim façamos nossa vida um dia,
Inscientes, Lídia, voluntariamente
Que há noite antes e após
O pouco que duramos.

Acordar na Rua do Mundo

madrugada, passos soltos de gente que saiu
com destino certo e sem destino aos tombos
no meu quarto cai o som depois
a luz. ninguém sabe o que vai
por esse mundo. que dia é hoje?
soa o sino sólido as horas. os pombos
alisam as penas, no meu quarto cai o pó.

um cano rebentou junto ao passeio.
um pombo morto foi na enxurrada
junto com as folhas dum jornal já lido.
impera o declive
um carro foi-se abaixo
portas duplas fecham
no ovo do sono a nossa gema.

sirenes e buzinas, ainda ninguém via satélite
sabe ao certo o que aconteceu, estragou-se o alarme
da joalharia, os lençóis na corda
abanam os prédios, pombos debicam

o azul dos azulejos, assoma à janela
quem acordou. o alarme não pára o sangue
desavém-se. não veio via satélite a querida imagem o vídeo
não gravou

e duma varanda um pingo cai
de um vaso salpicando o fato do bancário

Colada à Tua Boca

Colada à tua boca a minha desordem.
O meu vasto querer.
O incompossível se fazendo ordem.
Colada à tua boca, mas descomedida
Árdua
Construtor de ilusões examino-te sôfrega
Como se fosses morrer colado à minha boca.
Como se fosse nascer
E tu fosses o dia magnânimo
Eu te sorvo extremada à luz do amanhecer.

À Beleza

Não tens corpo, nem pátria, nem família,
Não te curvas ao jugo dos tiranos.
Não tens preço na terra dos humanos,
Nem o tempo te rói.
És a essência dos anos,
O que vem e o que foi.

És a carne dos deuses,
O sorriso das pedras,
E a candura do instinto.
És aquele alimento
De quem, farto de pão, anda faminto.

És a graça da vida em toda a parte,
Ou em arte,
Ou em simples verdade.
És o cravo vermelho,
Ou a moça no espelho,
Que depois de te ver se persuade.

És um verso perfeito
Que traz consigo a força do que diz.
És o jeito
Que tem, antes de mestre, o aprendiz.

És a beleza, enfim. És o teu nome.
Um milagre, uma luz, uma harmonia,
Uma linha sem traço…
Mas sem corpo, sem pátria e sem família,
Tudo repousa em paz no teu regaço.

A Mais Bela Noite do Mundo

Hoje,
será o fim!

Hoje
nem este falso silêncio
dos meus gestos malogrados
debruçando-se
sobre os meus ombros nus
e esmagados!

Nem o luar, pano baço de cenário velho,
escutando
a minha prisão de viver
a lição que me ditavam:
– Menino! acende uma vela na tua vida,
que o sol, a luz e o ar
são perfumes de pecado.
Tem braços longos e tentadores – o dia!

– Menino! recolhe-te na sombra do meu regaço
que teus pés
são feitos de barro e cansaço!

(Era esta a voz do papão
pintado de belo
na máscara de papelão).

Eram inúteis e magoadas as noites da minha rua…
Noites de lua
que lembravam as grilhetas
da minha vida parada.

– Amanhã,
terás os mestres, as aulas, os amigos e os livros
e o espectáculo da morgue
morando durante dias
nos teus sentidos gorados.

Amanhã,
será o ultrapassar outra curva
no teu caminho destinado.

(Era esta a voz do papão
que acendia a vela,

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Hora Vermelha

Por que vieste, pensamento?
Já me bastava o Mar violento,
Já me bastava o Sol que ardia…
P’los meus sentidos escorria
não sei lá bem que seiva forte
que a carne toda me deixava
qual uma flor ou uma lava
num riso aberto contra a Morte.

Já me bastava tudo isto.
Mas tu vieste, pensamento,
e vieste duro, turbulento.
Vieste com formas e com sangue:
erectos seios de mulher,
as carnes róseas como frutos.

Boca rasgada num pedido
a que se quer e se não quer
dizer que não.
Os braços longos estendidos.
A mão em concha sobre o sexo
que nem a Vénus de Camões.

Aí!, pensamento,
deixa-me a calma da Poesia!
Aqui na praia só com ela,
virgem castíssima, sincera!…
Sua mão branca saberia
chamar cordeiro ao Mar violento,
Pôr meigo, meigo, o Sol que ardia.
Mas tu vieste, pensamento.
Tua nudez, que me obsidia,
logo, subtil, encheu de alento
velhos desejos recalcados,
beijos mordidos
antes de os ver a luz do Dia.

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Olhar Eterno

Aquele olhar tão triste,
Onde ia, feito em lagrima, o que eu sou,
Isto é, tudo o que existe,
No instante em que pousou,
Relampago do Além,
Sobre ti, meu querido e pobre Anjinho,
Já deitado na cama e tão doentinho,
Cercado da afflicção de tua Mãe;
Esse olhar fez-se eterno,
Em meus olhos ficou: é luz do inferno
Que tudo me alumia…

Parece a luz do dia!

As mãos pressentem…

As mãos pressentem a leveza rubra do lume
repetem gestos semelhantes a corolas de flores
voos de pássaro ferido no marulho da alba
ou ficam assim azuis
queimadas pela secular idade desta luz
encalhada como um barco nos confins do olhar

ergues de novo as cansadas e sábias mãos
tocas o vazio de muitos dias sem desejo e
o amargor húmido das noites e tanta ignorância
tanto ouro sonhado sobre a pele tanta treva
quase nada

O Teu Riso

Tira-me o pão, se quiseres,
tira-me o ar, mas
não me tires o teu riso.

Não me tires a rosa,
a flor de espiga que desfias,
a água que de súbito
jorra na tua alegria,
a repentina onda
de prata que em ti nasce.

A minha luta é dura e regresso
por vezes com os olhos
cansados de terem visto
a terra que não muda,
mas quando o teu riso entra
sobe ao céu à minha procura
e abre-me todas
as portas da vida.

Meu amor, na hora
mais obscura desfia
o teu riso, e se de súbito
vires que o meu sangue mancha
as pedras da rua,
ri, porque o teu riso será para as minhas mãos
como uma espada fresca.

Perto do mar no outono,
o teu riso deve erguer
a sua cascata de espuma,
e na primavera, amor,
quero o teu riso como
a flor que eu esperava,
a flor azul, a rosa
da minha pátria sonora.

Ri-te da noite,

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Beleza

Vem do amor a Beleza,
Como a luz vem da chama.
É lei da natureza:
Queres ser bela? – ama.

Formas de encantar,
Na tela o pincel
As pode pintar;
No bronze o buril
As sabe gravar;
E estátua gentil
Fazer o cinzel
Da pedra mais dura…
Mas Beleza é isso? – Não; só formosura.

Sorrindo entre dores
Ao filho que adora
Inda antes de o ver
– Qual sorri a aurora
Chorando nas flores
Que estão por nascer –
A mãe é a mais bela das obras de Deus.
Se ela ama! – O mais puro do fogo dos céus
Lhe ateia essa chama de luz cristalina:

É a luz divina
Que nunca mudou,
É luz… é a Beleza
Em toda a pureza
Que Deus a criou.