Sonetos sobre Terra de Francisco Joaquim Bingre

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O Tempo Gastador de Mil Idades

O Tempo gastador de mil idades,
Que na décima esfera vive e mora,
NĂŁo descansa co’a FĂșria tragadora,
De exercitar, feroz, suas crueldades.

Ele destrĂłi as Ă­nclitas cidades,
As egĂ­pcias pirĂąmides devora:
Sua dentada fouce assoladora,
Rompe forças viris, destrói beldades.

O bronze, o ouro, o rĂ­gido diamante,
A sua mĂŁo pesada amolga e gasta
Levando tudo ao nada, em giro errante.

Como trovĂŁo feroz rugindo arrasta,
Quanto cobre na Terra o sol radiante,
SĂł da Virtude com temor se afasta.

Inferno

HĂĄ no centro da Terra ampla caverna,
Reino imenso dos anjos rebelados,
Lago horrendo de enxofres inflamados,
Que acende o sopro da Vingança eterna.

O seu fogo maldito Ă© sem lucerna,
Que faz trevas dos fumos condensados.
Seus tectos e alçapÔes, enfarruscados,
NĂŁo deixam lĂĄ entrar a luz externa.

Silvosos gritos, hĂłrridos lamentos,
Blasfémias, maldiçÔes, desata o vício
Bramando, sem cessar, em seus tormentos.

Que imensos réus no eterno precipício
Caindo estĂŁo, a todos os momentos!
O Inferno sem fim, fatal suplĂ­cio.

JuĂ­zo

Quando, nos quatro Ăąngulos da Terra,
Troarem as trombetas ressurgentes,
Despertadoras dos mortais dormentes,
Por onde um Deus irado aos homens berra:

Prontos, num campo, em apinhada serra,
Todos nus assistir devem viventes
Ao JuĂ­zo Final e ver, patentes,
Seus delitos, que um livro eterno encerra.

Então, aberto o Céu, e o Inferno aberto,
Todos ali verĂŁo: e a sorte imensa
Duma mĂĄgoa sem fim, dum gozo certo.

VerĂŁo recto juiz pesar a ofensa
Na balança integral, e o justo acerto,
Dando da vida e morte igual sentença.

Terra

Ó Terra, amável mãe da Natureza!
Fecunda em produçÔes de imensos entes,
Criadora das prĂłvidas sementes
Que abastam toda a tua redondeza!

Teu amor sem igual, sem par fineza,
Teus maternais efeitos providentes
DĂŁo vida aos seres todos existentes,
DĂŁo brio, dĂŁo vigor, dĂŁo fortaleza.

Tu rasgas do teu corpo as grossas veias
E as cristalinas fontes de ĂĄgua pura
Tens, para a nossa sede, sempre cheias.

Tu, na vida e na morte, com ternura
Amas os filhos teus, tu te recreias
Em lhes dar, no teu seio, a sepultura.

Ar

Vivificante ar, pai da existĂȘncia,
Assopro animador do Autor Divino,
Deste nosso subtil moto contino
Composto, onde um Deus pĂŽs sua ciĂȘncia!

Tu tens, Ăł ar, a excelsa preeminĂȘncia
De ser exalação do bafo Trino,
Tu susténs, sem cair, o home a pino:
Sem ti tem sempre pronta a decadĂȘncia.

Tu as ardentes febres lhe mitigas
Nesta, do mundo, trabalhosa lida,
Nestas da Terra (sem cessar) fadigas.

Tu és o sustentåculo da vida,
Porém, quando do corpo te desligas,
Lhe dĂĄs, com dor, eterna despedida.