Poemas sobre Ombros

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Poemas de ombros escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Onde o Mar Falta

Entreabertas as pernas, e pousada
de leve, sobre os ombros, a cabeça,
parecias Ă s vezes, derramada
no fundo, mais espessa.

E eras líquida: vias, através
de tua prĂłpria sombra transparente
a luminosidade dos teus pés,
alados. Porque ausente.

Jamais dizias nada. Sempre tinhas
entre os lĂĄbios, a voz silenciosa
dos que voltam. Onda apĂłs onda, vinhas
(e vens) misteriosa.

Desde a profundidade, do mar. Brusco
nas suas reacçÔes, onde o mar falta
sob as ondas, aí, aí te busco —
e és, como as ondas, alta.

Quando olho o horizonte: quando tudo
se dissolve em si mesmo e, onda apĂłs
onda, me calo. Vejo, e estou mudo.
O mar na tua voz.

Porque vias o mar (tinhas o mar
no olhar) fechando os olhos. E defronte
o vĂ­amos surgir. Bastava olhar,
que tudo era horizonte.

Biografia

Sou aquele a quem busco:
jamais encontrarei a minha sombra.
A noite me acompanha
e sei que luto
com a treva. Combato: sangue a sangue
e corpo a corpo.

Rios sob o meu pulso
escapam ao destino atroz do sono:
durmo com a lembrança
de minha fuga
e o sĂłlido vazio das montanhas.
Sem horizontes.

Avanço com a angĂșstia
prévia: a visão do derradeiro encontro.
Reconheço que canso.
Porque sou surdo:
só ouço a minha voz quando alguém chama
alguém que é outro.

Reconheço um segundo:
crio logo raĂ­zes e sou tronco
sem nenhuma esperança.
Espero tudo
e nĂŁo espero nada que nĂŁo ganhe
outro contorno.

Sou aquele que do hĂșmus
liberta os pés e as pernas sem esforço
até saber que anda
imĂłvel. Fundas
sĂŁo minhas mĂŁos e afundam por instantes.
Encolho os ombros.

Spleen

Quando o cinzento céu, como pesada tampa,
Carrega sobre nĂłs, e nossa alma atormenta,
E a sua fria cor sobre a terra se estampa,
O dia transformado em noite pardacenta;

Quando se muda a terra em hĂșmida enxovia
D’onde a Esperança, qual morcego espavorido,
Foge, roçando ao muro a sua asa sombria,
Com a cabeça a dar no tecto apodrecido;

Quando a chuva, caindo a cĂąntaros, parece
D’uma prisĂŁo enorme os sinistros varĂ”es,
E em nossa mente em frebre a aranha fia e tece,
Com paciente labor, fantåsticas visÔes,

– Ouve-se o bimbalhar dos sinos retumbantes,
Lançando para os céus um brado furibundo,
Como os doridos ais de espĂ­ritos errantes
Que a chorrar e a carpir se arrastam pelo mundo;

Soturnos funerais deslizam tristemente
Em minh’alma sombria. A sucumbida Esp’rança,
Lamenta-se, chorando; e a AngĂșstia, cruelmente,
Seu negro pavilhão sobre os meus ombros lança!

Tradução de Delfim Guimarães

Na Véspera de não Partir Nunca

Na véspera de não partir nunca
Ao menos nĂŁo hĂĄ que arrumar malas
Nem que fazer planos em papel,
Com acompanhamento involuntĂĄrio de esquecimentos,
Para o partir ainda livre do dia seguinte.
NĂŁo hĂĄ que fazer nada
Na véspera de não partir nunca.
Grande sossego de jĂĄ nĂŁo haver sequer de que ter sossego!
Grande tranqĂŒilidade a que nem sabe encolher ombros
Por isto tudo, ter pensado o tudo
É o ter chegado deliberadamente a nada.
Grande alegria de nĂŁo ter precisĂŁo de ser alegre,
Como uma oportunidade virada do avesso.
HĂĄ quantas vezes vivo
A vida vegetativa do pensamento!
Todos os dias sine linea
Sossego, sim, sossego…
Grande tranqĂŒilidade…
Que repouso, depois de tantas viagens, fĂ­sicas e psĂ­quicas!
Que prazer olhar para as malas fĂ­tando como para nada!
Dormita, alma, dormita!
Aproveita, dormita!
Dormita!
É pouco o tempo que tens! Dormita!
É a vĂ©spera de nĂŁo partir nunca!

PĂ”e-me as MĂŁos nos Ombros…

PĂ”e-me as mĂŁos nos ombros…
Beija-me na fronte…
Minha vida Ă© escombros,
A minha alma insonte.

Eu nĂŁo sei por quĂȘ,
Meu desde onde venho,
Sou o ser que vĂȘ,
E vĂȘ tudo estranho.

PÔe a tua mão
Sobre o meu cabelo…
Tudo Ă© ilusĂŁo.
Sonhar Ă© sabĂȘ-lo.

O Amor em Visita

Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lĂșbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marĂ­timo
e o pĂŁo for invadido pelas ondas –
seu corpo arderĂĄ mansamente sob os meus olhos palpitantes.
Ele – imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderĂĄ para mim
sobre um lençol mordido por flores com ågua.

Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordÔes da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
– Oh cabra no vento e na urze,

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