Poemas sobre Rosas de Guerra Junqueiro

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Poemas de rosas de Guerra Junqueiro. Leia este e outros poemas de Guerra Junqueiro em Poetris.

O Amor

I

Eu nunca naveguei, pieguíssimo argonauta
Dans les fleuves du tendre, onde há naufrágios bons,
Conduzindo Florian na tolda a tocar frauta,
E cupidinhos d’oiro a tasquinhar bombons.
Nunca ninguém me viu de capa à trovador,
Às horas em que está já Menelau deitado,
A tanger o arrabil sob os balcões em flor
Dos castelos feudais de papelão doirado.
Não canto de Anfitrite as vaporosas fraldas,
(Eu não quero com isto, ó Vénus, descompor-te)
Nem costumo almoçar c’roado de grinaldas,
Nem nunca pastoreei enfim, vestido à corte,
De bordão de cristal e punhos de Alençon,
Borreguinhos de neve a tosar esmeraldas
Num lameiro qualquer de qualquer Trianon.
Eu não bebo ambrósia em taças cristalinas,
Bebo um vinho qualquer do Douro ou de Bucelas,
Nem vou interrogar as folhas das boninas,
Para saber o amor, o tal amor das Elas.
Não visto da poesia a túnica inconsútil,
Pela simples razão, sob o pretexto fútil
De ter visto passar na rua uns pés bonitos;
Nem do meu coração eu fiz um paliteiro,
Onde venha o amor cravar os seus palitos.

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Morena

Não negues, confessa
Que tens certa pena
Que as mais raparigas
Te chamem morena.

Pois eu não gostava,
Parece-me a mim,
De ver o teu rosto
Da cor do jasmim.

Eu não… mas enfim
É fraca a razão,
Pois pouco te importa
Que eu goste ou que não.

Mas olha as violetas
Que, sendo umas pretas,
O cheiro que têm!
Vê lá que seria,
Se Deus as fizesse
Morenas também!

Tu és a mais rara
De todas as rosas;
E as coisas mais raras
São mais preciosas.

Há rosas dobradas
E há-as singelas;
Mas são todas elas
Azuis, amarelas,
De cor de açucenas,
De muita outra cor;
Mas rosas morenas,
Só tu, linda flor.

E olha que foram
Morenas e bem
As moças mais lindas
De Jerusalém.
E a Virgem Maria
Não sei… mas seria
Morena também.

Moreno era Cristo.
Vê lá depois disto
Se ainda tens pena
Que as mais raparigas
Te chamem morena!

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Portugal

Maior do que nós, simples mortais, este gigante
foi da glória dum povo o semideus radiante.
Cavaleiro e pastor, lavrador e soldado,
seu torrão dilatou, inóspito montado,
numa pátria… E que pátria! A mais formosa e linda
que ondas do mar e luz do luar viram ainda!
Campos claros de milho moço e trigo loiro;
hortas a rir; vergéis noivando em frutos de oiro;
trilos de rouxinóis; revoadas de andorinhas;
nos vinhedos, pombais: nos montes, ermidinhas;
gados nédios; colinas brancas olorosas;
cheiro de sol, cheiro de mel, cheiro de rosas;
selvas fundas, nevados píncaros, outeiros
de olivais; por nogais, frautas de pegureiros;
rios, noras gemendo, azenhas nas levadas;
eiras de sonho, grutas de génios e de fadas:
riso, abundância, amor, concórdia, Juventude:
e entre a harmonia virgiliana um povo rude,
um povo montanhês e heróico à beira-mar,
sob a graça de Deus a cantar e a lavrar!
Pátria feita lavrando e batalhando: aldeias
conchegadinhas sempre ao torreão de ameias.
Cada vila um castelo. As cidades defesas
por muralhas, bastiões, barbacãs, fortalezas;
e, a dar fé, a dar vigor,

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Adoração

Eu não te tenho amor simplesmente. A paixão
Em mim não é amor; filha, é adoração!
Nem se fala em voz baixa à imagem que se adora.
Quando da minha noite eu te contemplo, aurora,
E, estrela da manhã, um beijo teu perpassa
Em meus lábios, oh! quando essa infinita graça
do teu piedoso olhar me inunda, nesse instante
Eu sinto – virgem linda, inefável, radiante,
Envolta num clarão balsâmico da lua,
A minh’alma ajoelha, trémula, aos pés da tua!
Adoro-te!… Não és só graciosa, és bondosa:
Além de bela és santa; além de estrela és rosa.
Bendito seja o deus, bendita a Providência
Que deu o lírio ao monte e à tua alma a inocência,
O deus que te criou, anjo, para eu te amar,
E fez do mesmo azul o céu e o teu olhar!…

Recordam-se Vocês do Bom Tempo d’Outrora

(Dedicatória de introdução a «A Musa em Férias»)

Recordam-se vocês do bom tempo d’outrora,
Dum tempo que passou e que não volta mais,
Quando íamos a rir pela existência fora
Alegres como em Junho os bandos dos pardais?
C’roava-nos a fronte um diadema d’aurora,
E o nosso coração vestido de esplendor
Era um divino Abril radiante, onde as abelhas
Vinham sugar o mel na balsâmina em flor.
Que doiradas canções nossas bocas vermelhas
Não lançaram então perdidas pelo ar!…
Mil quimeras de glória e mil sonhos dispersos,
Canções feitas sem versos,
E que nós nunca mais havemos de cantar!
Nunca mais! nunca mais! Os sonhos e as esp’ranças
São áureos colibris das regiões da alvorada,
Que buscam para ninho os peitos das crianças.
E quando a neve cai já sobre a nossa estrada,
E quando o Inverno chega à nossa alma,então
Os pobres colibris, coitados, sentem frio,
E deixam-nos a nós o coração vazio,
Para fazer o ninho em outro coração.
Meus amigos, a vida é um Sol que chega ao cúmulo
Quando cantam em nós essas canções celestes;

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O Teu Aniversário

Pediste-me sorrindo, ó minha flor gentil,
Uns versos às tuas vinte alvoradas de Abril.
Vinte anos já!… não creio, estás equivocada…
Enganas-te. Eu irei perguntar à alvorada
Quantas vezes pousou em êxtase, ao de leve,
A sua boca de rosa em tua fronte de neve.
Vinte anos! Podes crer, pomba que eu idolatro,
Que se o corpo fez vinte, a alma, não: fez quatro.
A tua alma nasceu inefável, divina,
Para ser sempre grande e sempre pequenina.
É como a estrela d’alva; enche o seu esplendor
O Mundo, e ela não enche o cálix duma flor!…

A Minha Filha

(Vendo-a dormir)

Que alma intacta e delicada!
Que argila pura e mimosa!
É a estrela d’alvorada
Dentro dum botão de rosa!

E, enquanto dormes tranquila,
Vejo o divino esplendor
Da alma a sair da argila,
Da estrela a sair da flor!

Anjos, no azul inocente,
Sobre o teu hálito leve
Desdobram candidamente,
Em pálio, as asas de neve…

E eu, urze má das encostas,
Eu sinto o dever sagrado
De te beijar— de mãos postas!
De te abençoar — ajoelhado!

Em Viagem

Desde aquela dor tamanha
Do momento em que parti
Um só prazer me acompanha,
Filha, o de pensar em ti:

Por sobre a negra paisagem
Do meu ermo coração
O luar branco da tua imagem
Veste um benigno clarão.

A tarde, no azul celeste,
Há uma estrela esmorecida,
Que é o beijo que tu me deste
Na hora da despedida.

Beijo tão longo e dolente,
Tão longo e cortado de ais,
Que o meu coração pressente
Que não te torno a ver mais.

Conto no céu estrelado
Lágrimas de oiro sem fim:
É o pranto que tens chorado,
De dia e noite, por mim…

Quando me deito na cama
E vou quase adormecido,
Oiço a tua voz que me chama,
Num suplicante gemido.

Num gemido tão suave,
Tão triste na noite escura,
Que é como uma queixa d’ave
Presa numa sepultura!…

Em sonho, às vezes, meu Deus,
Cuido que vou expirar,
Sem levar nos olhos meus
O teu derradeiro olhar.

E sem extremo conforto
Que eu ness’hora quero ter:
Beijar a fronte do morto
Aquela que o fez viver.

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Elegia

A alegria da vida, essa alegria d’oiro
A pouco e pouco em mim vai-se extinguindo, vai…
Melros alegres de bico loiro,
Ó melros negros, cantai, cantai!

Ando lívido, arrasto o pobre corpo exangue,
Que era feito da luz das claras madrugadas…
Rosas vermelhas da cor do sangue,
Rosas abri-vos às gargalhadas!

Limpidez virginal, graça d’Anacreonte,
Mimo, frescura, força, onde é que estais?… não sei!…
Ó águas vivas, águas do monte,
Ó águas puras, correi, correi!

Eu sinto-me prostrado em lânguido desmaio,
E a minha fronte verga exausta para o chão…
Cedros altivos, sem medo ao raio,
Cedros erguei-vos pela amplidão!