Sonetos sobre Inocência de Vitorino Nemésio

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Sonetos de inocência de Vitorino Nemésio. Leia este e outros sonetos de Vitorino Nemésio em Poetris.

A concha

A minha casa é concha. Como os bichos
Segreguei-a de mim com paciência:
Fechada de marés, a sonhos e a lixos,
O horto e os muros só areia e ausência.

Minha casa sou eu e os meus caprichos.
O orgulho carregado de inocência
Se às vezes dá uma varanda, vence-a
O sal que os santos esboroou nos nichos.

E telhadosa de vidro, e escadarias
Frágeis, cobertas de hera, oh bronze falso!
Lareira aberta pelo vento, as salas frias.

A minha casa… Mas é outra a história:
Sou eu ao vento e à chuva, aqui descalço,
Sentado numa pedra de memória.

O Futuro Perfeito

À minha neta Anica

A neta explora-me os dentes,
Penteia-me como quem carda.
Terra da sua experiência,
Meu rosto diverte-a, parda
Imagem dada à inocência.

Finjo que lhe como os dedos,
Fura-me os olhos cansados,
Intima aos meus próprios medos
Deixa-mos sossegados.

E tira, tira puxando
Coisas de mim, divertida.
Assim me vai transformando
Em tempo da sua vida.