Os Recursos de um Poeta

Presumo que um poeta dispõe de recursos muito mais amplos do que os meramente verbais e que, utilizando-os mesmo em exclusivo, eles devem tender Ă  organização nĂŁo apenas literária, ou gramatical, ou rĂ­tmica. Compreendo que se possam fazer poemas recorrendo, por exemplo, Ă  expressĂŁo matemática, ao grafismo, Ă  tĂ©cnica comercial e industrial, Ă s máquinas, Ă  mĂşsica, ou a qualquer outra fonte e tipo de sintaxe. Por outro lado, imagino que as preocupações do poeta se devem libertar da linguagem organizada para o diálogo. Max Bense afirma algo de semelhante, ao acentuar que «no conceito convencional de literatura, põe-se a ĂŞnfase na função comunicativa-social dela, enquanto que, no conceito progressivo, se insiste na sua função experimentativa-intelectual». Interessa-me, portanto, chegado que sou Ă  convicção de me haver limitado, nos livros anteriores, a mover-me em cĂ­rculo sobre uma linguagem esgotada – interessa-me digo, muito menos executar, uma gramática literária, destinada ao diálogo, do que perfazer um organismo internamente coerente e bastante. A comunicação será consequente, se for. De qualquer modo, bani a ideia, do diálogo, no meu estilo. Mas sinto-me ligado aos escritos antigos como alguĂ©m se pode sentir ligado a um paciente e doloroso erro…