Os Lugares-Comuns
Quando o homem que ia casar comigo
chegou a primeira vez na minha casa,
eu estava saindo do banheiro, devastada
de angelismo e carĂȘncia. Mesmo assim,
ele me olhou com olhos admirados
e segurou minha mĂŁo mais que
um tempo normal a pessoas
acabando de se conhecer.
Nunca mencionei o facto.
Até hoje me ama com amor
de vagarezas, sĂșbitos chegares.
Quando eu sei que ele vem,
eu fecho a porta para a grata surpresa.
Vou abri-la como o fazem as noivas
e as amantes. Seu nome Ă©:
Salvador do meu corpo.
Poemas sobre Corpo de Adélia Prado
3 resultadosSensorial
Obturação, é da amarela que eu ponho.
Pimenta e cravo,
mastigo Ă boca nua e me regalo.
Amor, tem que falar meu bem,
me dar caixa de mĂșsica de presente,
conhecer vĂĄrios tons pra uma palavra sĂł.
EspĂrito, se for de Deus, eu adoro,
se for de homem, eu testo
com meus seis instrumentos.
Fico gostando ou perdoo.
Procuro sol, porque sou bicho de corpo.
Sombra terei depois, a mais fria.
A Casa
à um chalé com alpendre,
forrado de hera.
Na sala,
tem uma gravura de Natal com neve.
NĂŁo tem lugar pra esta casa em ruas que se conhecem.
Mas afirmo que tem janelas,
claridade de lĂąmpada atravessando o vidro,
um noivo que ronda a casa
â esta que parece sombria â
e uma noiva lĂĄ dentro que sou eu.
Ă uma casa de esquina, indestrutĂvel.
Moro nela quando lembro,
quando quero acendo o fogo,
as torneiras jorram,
eu fico esperando o noivo, na minha casa aquecida.
NĂŁo fica em bairro esta casa
infensa à demolição.
Fica num modo tristonho de certos entardeceres,
quando o que um corpo deseja Ă© outro corpo pra escavar.
Uma ideia de exĂlio e tĂșnel.