Poemas sobre InocĂŞncia

25 resultados
Poemas de inocência escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Livro dos Amantes

I

Glorifiquei-te no eterno.
Eterno dentro de mim
fora de mim perecĂ­vel.
Para que desses um sentido
a uma sede indefinĂ­vel.

Para que desses um nome
Ă  exactidĂŁo do instante
do fruto que cai na terra
sempre perpendicular
Ă  humidade onde fica.

E o que acontece durante
na rapidez da descida
é a explicação da vida.

II

Harmonioso vulto que em mim se dilui.
Tu Ă©s o poema
e Ă©s a origem donde ele flui.
Intuito de ter. Intuito de amor
nĂŁo compreendido.
Fica assim amor. Fica assim intuito.
Prometido.

III

PrĂ­ncipe secreto da aventura
em meus olhos um dia começada e finita.
Onda de amargura numa água tranquila.
Flor insegura enlaçada no vento que a suporta.
Pássaro esquivo em meus ombros de aragem
reacendendo em cadĂŞncia e em passagem
a lua que trazia e que apagou.

IV

Dá-me a tua mão por cima das horas.
Quero-te conciso.
AdĂŁo depois do paraĂ­so
errando mais nítido à distância
onde te exalto porque te demoras.

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SugestĂŁo

Sede assim — qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

Flor que se cumpre,
sem pergunta.

Onda que se esforça,
por exercĂ­cio desinteressado.

Lua que envolve igualmente
os noivos abraçados
e os soldados já frios.

Também como este ar da noite:
sussurrante de silĂŞncios,
cheio de nascimentos e pétalas.

Igual Ă  pedra detida,
sustentando seu demorado destino.
E Ă  nuvem, leve e bela,
vivendo de nunca chegar a ser.

Ă€ cigarra, queimando-se em mĂşsica,
ao camelo que mastiga sua longa solidĂŁo,
ao pássaro que procura o fim do mundo,
ao boi que vai com inocĂŞncia para a morte.

Sede assim qualquer coisa
serena, isenta, fiel.

NĂŁo como o resto dos homens.

O Amor em Visita

Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lĂşbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marĂ­timo
e o pĂŁo for invadido pelas ondas –
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpitantes.
Ele – imagem vertiginosa e alta de um certo pensamento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.

Em cada mulher existe uma morte silenciosa.
E enquanto o dorso imagina, sob os dedos,
os bordões da melodia,
a morte sobe pelos dedos, navega o sangue,
desfaz-se em embriaguez dentro do coração faminto.
– Oh cabra no vento e na urze,

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Um CĂ©u e Nada Mais

Um céu e nada mais — que só um temos,
como neste sistema: sĂł um sol.
Mas luzes a fingir, dependuradas
em abóbada azul — como de tecto.
E o seu nĂşmero tal, que deslumbrados
neram os teus olhos, se tas mostrasse,
amor, tĂŁo de ribalta azul, como de
circo, e dança então comigo no
trapézio, poema em alto risco,
e um levíssimo toque de mistério.
Pega nas lantejoulas a fingir
de sóis mal descobertos e lança
agora a âncora maior sobre o meu
coração. Que não te assuste o som
desse trovĂŁo que ainda agora ouviste,
era de deus a sua voz, ou mito,
era de um anjo por demais caĂ­do.
Mas, de verdade: natural fenĂłmeno
a invadir-te as veias e o cérebro,
tão frágil como álcool, tão de
potente e liso como álcool
implodindo do céu e das estrelas,
imensas a fingir e penduradas
sobre abĂłbada azul. Se te mostrasse,
amor, a cor do pesadelo que por
aqui passou agora mesmo, um céu
e nada mais — que nada temos,
que nĂŁo seja esta angĂşstia de
mortais (e a maldição da rima,

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LĂşcia

(Alfred de Musset)

Nós estávamos sós; era de noite;
Ela curvara a fronte, e a mĂŁo formosa,
Na embriaguez da cisma,
TĂŞnue deixava errar sobre o teclado;
Era um murmĂşrio; parecia a nota
De aura longĂ­nqua a resvalar nas balsas
E temendo acordar a ave no bosque;
Em torno respiravam as boninas
Das noites belas as volĂşpias mornas;
Do parque os castanheiros e os carvalhos
Brando embalavam orvalhados ramos;
OuvĂ­amos a noite, entre-fechada,
A rasgada janela
Deixava entrar da primavera os bálsamos;
A várzea estava erma e o vento mudo;
Na embriaguez da cisma a sós estávamos
E tĂ­nhamos quinze anos!

Lúcia era loura e pálida;
Nunca o mais puro azul de um céu profundo
Em olhos mais suaves refletiu-se.
Eu me perdia na beleza dela,
E aquele amor com que eu a amava – e tanto ! –
Era assim de um irmĂŁo o afeto casto,
Tanto pudor nessa criatura havia!

Nem um som despertava em nossos lábios;
Ela deixou as suas mĂŁos nas minhas;
TĂ­bia sombra dormia-lhe na fronte,

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