Chove. HĂĄ SilĂȘncio
Chove. HĂĄ silĂȘncio, porque a mesma chuva
NĂŁo faz ruĂdo senĂŁo com sossego.
Chove. O cĂ©u dorme. Quando a alma Ă© viĂșva
Do que nĂŁo sabe, o sentimento Ă© cego.
Chove. Meu ser (quem sou) renego…TĂŁo calma Ă© a chuva que se solta no ar
(Nem parece de nuvens) que parece
Que nĂŁo Ă© chuva, mas um sussurrar
Que de si mesmo, ao sussurrar, se esquece.
Chove. Nada apetece…NĂŁo paira vento, nĂŁo hĂĄ cĂ©u que eu sinta.
Chove longĂnqua e indistintamente,
Como uma coisa certa que nos minta,
Como um grande desejo que nos mente.
Chove. Nada em mim sente…
Poemas sobre SilĂȘncio de Fernando Pessoa
4 resultadosMensagem – Mar PortuguĂȘs
MAR PORTUGUĂS
Possessio Maris
I. O Infante
Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, jĂĄ nĂŁo separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.Quem te sagrou criou-te portuguĂȘs.
Do mar e nĂłs em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!II. Horizonte
Ă mar anterior a nĂłs, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
âSplendia sobre as naus da iniciação.Linha severa da longĂnqua costa â
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em ĂĄrvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, hĂĄ aves,
As Horas pela Alameda
As horas pela alameda
Arrastam vestes de seda,Vestes de seda sonhada
Pela alameda alongadaSob o azular do luar…
E ouve-se no ar a expirar –A expirar mas nunca expira –
Uma flauta que delira,Que é mais a idéia de ouvi-la
Que ouvi-la quase tranquilaPelo ar a ondear e a ir…
SilĂȘncio a tremeluzir…
Cansa Sentir Quando se Pensa
Cansa sentir quando se pensa.
No ar da noite a madrugar
HĂĄ uma solidĂŁo imensa
Que tem por corpo o frio do ar.Neste momento insone e triste
Em que nĂŁo sei quem hei de ser,
Pesa-me o informe real que existe
Na noite antes de amanhecer.Tudo isto me parece tudo.
E Ă© uma noite a ter um fim
Um negro astral silĂȘncio surdo
E nĂŁo poder viver assim.(Tudo isto me parece tudo.
Mas noite, frio, negror sem fim,
Mundo mudo, silĂȘncio mudo –
Ah, nada Ă© isto, nada Ă© assim!)