Sonetos sobre Estranhos de Vasco Mouzinho de Quebedo

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Sonetos de estranhos de Vasco Mouzinho de Quebedo. Leia este e outros sonetos de Vasco Mouzinho de Quebedo em Poetris.

Soneto XXI

As Relíquias de S. Cruz de Coimbra

Aquela Águia gentil de vista estranha
A Cristo viu, co’ a mão de estrelas chea,
Solícito, qual anda o que semea
C’os olhos longos no que ao longe apanha.

Lavrador foi no mundo, e com tamanha
Sede que inda de lá fruito granjea.
Mas ai Senhor, em terra e triste area,
Mal estrelas se dão, pouco se ganha.

Bem sabe Cristo o que semea, e onde:
As vivas mortes são de mortas vidas
(Que hoje neste sagrado templo esconde)

Estrelas, que de carne estão vistidas.
A quem semea seu valor responde,
E bem, donde as semea merecidas.

Soneto XI

Lá nua estranha e solitária terra,
De gente e nação bárbara habitada,
O metal nobre não se estima em nada
Que embalde seu valor e preço encerra.

Ouro, com que se arrea e move guerra
A corações, a Dama delicada,
Serve lá de grilhão, que em apertada
Corrente a malfeitores fecha e cerra.

Nace esta confusão e diferença
Do muito que uns o seu valor alcançam,
E do pouco que de outros se conhece.

Julguem do Sol, e sua glória imensa
Os olhos d’Águia, já que todos cansam,
Que só para tais olhos resplandece.

Soneto XIX

Qual mísera Calisto, quando atenta
Que abrindo o dia vão ao largo estanho
As mais estrelas a seu doce banho,
Só com seu Plaustro só ficar lamenta,

Tal, quando me a memória representa
Banharem-se outros nesse mar estranho,
De graças mil gosando bem tamanho,
A falta dessa glória me atormenta.

E como inda que irada Juno a tolha
Decer ao mar, não deixa em noite clara
Ferir nele seus raios do alto assento,

Assi, por mais que a sorte em tudo avara
Para si deste corpo a parte escolha,
Livre, porém, me fica o pensamento.