Sonetos de Fernando Pessoa

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Sonetos de Fernando Pessoa. Conheça este e outros autores famosos em Poetris.

HĂĄ Um Poeta Em Mim Que Deus Me Disse

HĂĄ um poeta em mim que Deus me disse…
A Primavera esquece nos barrancos
As grinaldas que trouxe dos arrancos
Da sua efĂȘmera e espectral ledice…

Pelo prado orvalhado a meninice
Faz soar a alegria os seus tamancos…
Pobre de anseios teu ficar nos bancos
Olhando a hora como quem sorrisse…

Florir do dia a capitĂ©is de Luz…
Violinos do silĂȘncio enternecidos…
TĂ©dio onde o sĂł ter tĂ©dio nos seduz…

Minha alma beija o quadro que pintou…
Sento-me ao pé dos séculos perdidos
E cismo o seu perfil de inĂ©rcia e vĂŽo…

A Praça

A praça da Figueira de manhã,
Quando o dia Ă© de sol (como acontece
Sempre em Lisboa), nunca em mim esquece,
Embora seja uma memĂłria vĂŁ.

HĂĄ tanta coisa mais interessante
Que aquele lugar lĂłgico e plebeu,
Mas amo aquilo, mesmo aqui … Sei eu
Por que o amo? NĂŁo importa. Adiante …

Isto de sensaçÔes só vale a pena
Se a gente se não pÔe a olhar para elas.
Nenhuma delas em mim serena…

De resto, nada em mim Ă© certo e estĂĄ
De acordo comigo prĂłprio. As horas belas
SĂŁo as dos outros ou as que nĂŁo hĂĄ.

Entre o Bater Rasgado dos PendÔes

Entre o bater rasgado dos pendÔes
E o cessar dos clarins na tarde alheia,
A derrota ficou: como uma cheia
Do mal cobriu os vagos batalhÔes.

Foi em vão que o Rei louco os seus varÔes
Trouxe ao prolixo prélio, sem idéia.
Água que mão infiel verteu na areia —
Tudo morreu, sem rastro e sem razÔes.

A noite cobre o campo, que o Destino
Com a morte tornou abandonado.
Cessou, com cessar tudo, o desatino.

Só no luar que nasce os pendÔes rotos
Mostram no absurdo campo desolado
Uma derrota herĂĄldica de ignotos.