Sonetos sobre Horas de Fernanda de Castro

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Sonetos de horas de Fernanda de Castro. Leia este e outros sonetos de Fernanda de Castro em Poetris.

Um Pássaro a Morrer

Não é vida nem morte, é uma passagem,
nem antes nem depois: somente agora,
um minuto nos tantos duma hora.
Uma pausa. Um intervalo. Uma viragem.

Prisioneira de mim, onde a coragem
de quebrar as algemas, ir-me embora,
se tudo o que em mim ria agora chora,
se já não me seduz outra viagem?

E nada disto é céu nem é inferno.
Tristeza, só tristeza. Sol de Inverno,
sem uma flor a abrir na minha mão,

sem um búzio a cantar ao meu ouvido.
Só tristeza, um silêncio desmedido
e um pássaro a morrer: meu coração.

Até que um Dia…

Meus versos eram rosas, lírios, heras,
borboletas, regatos, cotovias
cantando suas doces melodias,
anjos, sereias, ninfas e quimeras.

Meus versos eram pombas entre as feras
e, na festa das horas e dos dias,
ia dançando penas e alegrias
e o ano tinha quatro primaveras.

E a festa continua… é também festa
o cardo e a urze, o tojo, a murta, a giesta,
a chuva no beiral, o vento Norte,

o gosto a mar, a lágrimas, a sal,
até que um dia a vida, a bem ou mal,
exausta de cantar me empreste à morte.