Poemas sobre Árvores de Ricardo Reis

6 resultados
Poemas de árvores de Ricardo Reis. Leia este e outros poemas de Ricardo Reis em Poetris.

Se a Vida Fosse Sempre Vida

Felizes, cujos corpos sob as árvores
Jazem na úmida terra,
Que nunca mais sofrem o sol, ou sabem
Das doenças da lua.

Verta Eolo a caverna inteira sobre
O orbe esfarrapado,
Lance Netuno, em cheias mãos, ao alto
As ondas estoirando.

Tudo lhe é nada, e o próprio pegureiro
Que passa, finda a tarde,
Sob a árvore onde jaz quem foi a sombra
Imperfeita de um deus,

Não sabe que os seus passos vão cobrindo
O que podia ser,
Se a vida fosse sempre vida, a glória
De uma beleza eterna.

Segue o Teu Destino

Segue o teu destino,
Rega as tuas plantas,
Ama as tuas rosas.
O resto é a sombra
De árvores alheias.

A realidade
Sempre é mais ou menos
Do que nos queremos.
Só nós somos sempre
Iguais a nós-proprios.

Suave é viver só.
Grande e nobre é sempre
Viver simplesmente.
Deixa a dor nas aras
Como ex-voto aos deuses.

Vê de longe a vida.
Nunca a interrogues.
Ela nada pode
Dizer-te. A resposta
Está além dos deuses.

Mas serenamente
Imita o Olimpo
No teu coração.
Os deuses são deuses
Porque não se pensam.

Abdica e Sê Rei de Ti Mesmo

Frutos, dão-os as árvores que vivem,
Não a iludida mente, que só se orna
Das flores lívidas
Do íntimo abismo.

Quantos reinos nos seres e nas cousas
Te não talhaste imaginário! Quantos,
Com a charrua,
Sonhos, cidades!

Ah, não consegues contra o adverso muito
Criar mais que propósitos frustrados!
Abdica e sê
Rei de ti mesmo.

Passamos e Agitamo-nos Debalde

Antes de nós nos mesmos arvoredos
Passou o vento, quando havia vento,
E as folhas não falavam
De outro modo do que hoje.

Passamos e agitamo-nos debalde.
Não fazemos mais ruído no que existe
Do que as folhas das árvores
Ou os passos do vento.

Tentemos pois com abandono assíduo
Entregar nosso esforço à Natureza
E não querer mais vida
Que a das árvores verdes.

Inutilmente parecemos grandes.
Salvo nós nada pelo mundo fora
Nos saúda a grandeza
Nem sem querer nos serve.

Se aqui, à beira-mar, o meu indício
Na areia o mar com ondas três o apaga,
Que fará na alta praia
Em que o mar é o Tempo?

Os Grandes Indiferentes

Ouvi contar que outrora, quando a Pérsia
Tinha não sei qual guerra,
Quando a invasão ardia na cidade
E as mulheres gritavam,
Dois jogadores de xadrez jogavam
O seu jogo contínuo.

À sombra de ampla árvore fitavam
O tabuleiro antigo,
E, ao lado de cada um, esperando os seus
Momentos mais folgados,
Quando havia movido a pedra, e agora
Esperava o adversário.
Um púcaro com vinho refrescava
Sobriamente a sua sede.

Ardiam casas, saqueadas eram
As arcas e as paredes,
Violadas, as mulheres eram postas
Contra os muros caídos,
Traspassadas de lanças, as crianças
Eram sangue nas ruas…
Mas onde estavam, perto da cidade,
E longe do seu ruído,
Os jogadores de xadrez jogavam
O jogo de xadrez.

Inda que nas mensagens do ermo vento
Lhes viessem os gritos,
E, ao refletir, soubessem desde a alma
Que por certo as mulheres
E as tenras filhas violadas eram
Nessa distância próxima,
Inda que, no momento que o pensavam,
Uma sombra ligeira
Lhes passasse na fronte alheada e vaga,

Continue lendo…

Nada Tem Sentido

Nos altos ramos de árvores frondosas
O vento faz um rumor frio e alto,
Nesta floresta, em este som me perco
E sozinho medito.

Assim no mundo, acima do que sinto,
Um vento faz a vida, e a deixa, e a toma,
E nada tem sentido — nem a alma
Com que penso sozinho.