Poemas sobre Café de Mário de Sá-Carneiro

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Poemas de café de Mário de Sá-Carneiro. Leia este e outros poemas de Mário de Sá-Carneiro em Poetris.

Serradura

A minha vida sentou-se
E não há quem a levante,
Que desde o Poente ao Levante
A minha vida fartou-se.

E ei-la, a mona, lá está,
Estendida, a perna traçada,
No infindável sofá
Da minha Alma estofada.

Pois Ă© assim: a minha Alma
Outrora a sonhar de RĂşssias,
Espapaçou-se de calma,
E hoje sonha sĂł pelĂşcias.

Vai aos Cafés, pede um bock,
LĂŞ o “Matin” de castigo,
E não há nenhum remoque
Que a regresse ao Oiro antigo:

Dentro de mim Ă© um fardo
Que não pesa, mas que maça:
O zumbido dum moscardo,
Ou comichĂŁo que nĂŁo passa.

Folhetim da “Capital”
Pelo nosso JĂşlio Dantas –
Ou qualquer coisa entre tantas
Duma antipatia igual…

O raio já bebe vinho,
Coisa que nunca fazia,
E fuma o seu cigarrinho
Em plena burocracia!…

Qualquer dia, pela certa,
Quando eu mal me precate,
É capaz dum disparate,
Se encontra a porta aberta…

Isto assim nĂŁo pode ser…
Mas como achar um remédio?

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Esta inconstancia de mim próprio em vibração
É que me ha de transpôr às zonas intermédias,
E seguirei entre cristais de inquietação,
A retinir, a ondular… Soltas as rĂ©deas,
Meus sonhos, leões de fogo e pasmo domados a tirar
A tĂ´rre d’ouro que era o carro da minh’Alma,
TransviarĂŁo pelo deserto, muribundos de Luar –
E eu sĂł me lembrarei num baloiçar de palma…
Nos oásis, depois, hão de se abismar gumes,
A atmosfera ha de ser outra, noutros planos:
As rĂŁs hĂŁo de coaxar-me em roucos tons humanos
Vomitando a minha carne que comeram entre estrumes…

*       *       *

Há sempre um grande Arco ao fundo dos meus olhos…
A cada passo a minha alma Ă© outra cruz,
E o meu coração gira: Ă© uma roda de cĂ´res…
NĂŁo sei aonde vou, nem vejo o que persigo…
Já nĂŁo Ă© o meu rastro o rastro d’oiro que ainda sigo…
Resvalo em pontes de gelatina e de bolĂ´res…
Hoje, a luz para mim Ă© sempre meia-luz…

. . . . . . . . . . .

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