Poemas sobre CĂ©u de CecĂ­lia Meireles

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Poemas de céu de Cecília Meireles. Leia este e outros poemas de Cecília Meireles em Poetris.

Como se Morre de Velhice

Como se morre de velhice
ou de acidente ou de doença,
morro, Senhor, de indiferença.

Da indiferença deste mundo
onde o que se sente e se pensa
nĂŁo tem eco, na ausĂŞncia imensa.

Na ausência, areia movediça
onde se escreve igual sentença
para o que é vencido e o que vença.

Salva-me, Senhor, do horizonte
sem estĂ­mulo ou recompensa
onde o amor equivale Ă  ofensa.

De boca amarga e de alma triste
sinto a minha própria presença
num céu de loucura suspensa.

(Já não se morre de velhice
nem de acidente nem de doença,
mas, Senhor, só de indiferença.)

Jornal, longe

Que faremos destes jornais, com telegramas, notĂ­cias,
anĂşncios, fotografias, opiniões…?

Caem as folhas secas sobre os longos relatos de guerra:
e o sol empalidece suas letras infinitas.

Que faremos destes jornais, longe do mundo e dos homens?
Este recado de loucura perde o sentido entre a terra e o céu.

De dia, lemos na flor que nasce e na abelha que voa;
de noite, nas grandes estrelas, e no aroma do campo serenado.

Aqui, toda a vizinhança proclama convicta:
“Os jornais servem para fazer embrulhos”.

E Ă© uma das raras vezes em que todos estĂŁo de acordo.

Gargalhada

Hornem vulgar! Homem de coração mesquinho!
Eu te quero ensinar a arte sublime de rir.
Dobra essa orelha grosseira, e escuta
o ritmo e o som da minha gargalhada:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

NĂŁo vĂŞs?
É preciso jogar por escadas de mármore baixelas de ouro.
Rebentar colares, partir espelhos, quebrar cristais,
vergar a lâmina das espadas e despedaçar estátuas,
destruir as lâmpadas, abater cúpulas,
e atirar para longe os pandeiros e as liras…

O riso magnĂ­fico Ă© um trecho dessa mĂşsica desvairada.

Mas Ă© preciso ter baixelas de ouro,
compreendes?
— e colares, e espelhos, e espadas e estátuas.
E as lâmpadas, Deus do céu!
E os pandeiros ágeis e as liras sonoras e trĂ©mulas…

Escuta bem:

Ah! Ah! Ah! Ah!
Ah! Ah! Ah! Ah!

Só de três lugares nasceu até hoje esta música heróica:
do céu que venta,
do mar que dança,
e de mim.

SolidĂŁo

Imensas noites de Inverno,
com frias montanhas mudas,
Ă© o mar negro, mais eterno,
mais terrĂ­vel, mais profundo.

(…)

A noite fecha seus lábios
– terra e cĂ©u – guardado nome.
E os seus longos sonhos sábios
geram a vida dos homens.

Geram os olhos incertos,
por onde descem os rios
que andam nos campos abertos
da claridade do dia.