Poemas sobre Corpo de Fernando Namora

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Poemas de corpo de Fernando Namora. Leia este e outros poemas de Fernando Namora em Poetris.

Alheamento

Meu corpo estiraçado, lânguido, ao logo do leito.

O cigarro vago azulando os meus dedos.

O rádio… a mĂşsica…

A tua presença que esvoaça
em torno do cigarro, do ar, da mĂşsica…

AusĂŞncia!, minha doce fuga!

Estranha coisa esta, a poesia,
que vai entornando mágoa nas horas
como um orvalho de lágrimas, escorrendo dos vidros
duma janela,

numa tarde vaga, vaga…

Poema da Hora Escoada

Minhas mĂŁos
– duas chamas dĂ©beis de vela
unidas no mesmo destino.

Minhas mĂŁos
derretidas em cera
que vai escorrendo,
gota a gota,
ao longo do corpo hirto
da vela moribunda.
Que vai escorrendo,
lenta,
na calmaria falsa e densa
da luz delida e mortuária do meu quarto.

E o livro de Anatomia,
grave e inĂştil,
aberto em frente.

E todo o mundo,
que me espera
e desespera,
nas páginas inúteis e graves
do livro de Anatomia.

E as horas
morrendo, morrendo,
como uma vela que se vai derretendo
no quarto frio de um morto.

Ai! minhas mĂŁos, minhas mĂŁos
– duas chamas dĂ©beis de vela
unidas no mesmo destino!

– Que horas serĂŁo?

A vida
Ă© uma vela de corpo hirto
que se vai derretendo, derretendo,
na calmaria falsa e densa
de um quarto de morto.

Ă“ Noite, Coalhada nas Formas de um Corpo de Mulher

Ă“ noite, coalhada nas formas de um corpo de mulher
vago e belo e voluptuoso,
num bailado erótico, com o cenário dos astros, mudos
[e quedos.
Estrelas que as suas mĂŁos afagam e a boca repele,
deixai que os caminhos da noite,
cegos e rectos como o destino,
suspensos como uma nuvem,
sejam os caminhos dos poetas
que lhes decoraram o nome.
Ă“ noite, coalhada nas formas de um corpo de mulher!
Esconde a vida no seio de uma estrela
e fá-la pairar, assim mágica e irreal,
para que a olhemos como uma lua sonâmbula.

Pergunta

Quem vem de longe e sabe o nome do meu lugar
e levou o caminho das conchas em mar
e dos olhos em rio
— quem vem de longe chorar por mim?

Quem sabe que eu findo de dureza
e condensa ternura em suas mĂŁos
para a derramar em afagos
por mim?

Quem ouviu a angĂşstia do meu brado,
sirene de um navio a vadiar no largo,
e me traz seus beijos e sua cor,
perdendo-se na bruma das madrugadas
por mim?

Quem soube das asperezas da viagem
e pediu o pĂŁo negado
e o suor ao corpo torturado,
por mim? por mim?

Quem gerou o mundo e lhe deu seu nome
e seu tamanho — imenso, imenso,
e em mim cabe?