Poemas sobre Filas

7 resultados
Poemas de filas escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

O Maestro Sacode a Batuta

O maestro sacode a batuta,
A lânguida e triste a mĂşsica rompe …

Lembra-me a minha infância, aquele dia
Em que eu brincava ao pé dum muro de quintal
Atirando-lhe com, uma bola que tinha dum lado
O deslizar dum cĂŁo verde, e do outro lado
Um cavalo azul a correr com um jockey amarelo …

Prossegue a música, e eis na minha infância
De repente entre mim e o maestro, muro branco,
Vai e vem a bola, ora um cĂŁo verde,
Ora um cavalo azul com um jockey amarelo…

Todo o teatro é o meu quintal, a minha infância
Está em todos os lugares e a bola vem a tocar música,
Uma mĂşsica triste e vaga que passeia no meu quintal
Vestida de cĂŁo verde tornando-se jockey amarelo…
(TĂŁo rápida gira a bola entre mim e os mĂşsicos…)

Atiro-a de encontra à minha infância e ela
Atravessa o teatro todo que está aos meus pés
A brincar com um jockey amarelo e um cĂŁo verde
E um cavalo azul que aparece por cima do muro
Do meu quintal…

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Poema do homem-rĂŁ

Sou feliz por ter nascido
no tempo dos homens-rĂŁs
que descem ao mar perdido
na doçura das manhãs.
Mergulham, imponderáveis,
por entre as águas tranquilas,
enquanto singram, em filas,
peixinhos de cores amáveis.
VĂŁo e vĂŞm, serpenteiam,
em compassos de ballet.
Seus lentos gestos penteiam
madeixas que ninguém vê.

Com barbatanas calçadas
e pulmões a tiracolo,
roçam-se os homens no solo
sob um céu de águas paradas.

Sob o luminoso feixe
correm de um lado para outro,
montam no lombo de um peixe
como no dorso de um potro.

Onde as sereias de espuma?
Tritões escorrendo babugem?
E os monstros cor de ferrugem
rolando trovões na bruma?

Eu sou o homem. O Homem.
Desço ao mar e subo ao céu.
Não há temores que me domem
É tudo meu, tudo meu.

Devo-te

Devo-te tanto como um pássaro
deve o seu voo Ă  lavada
planície do céu.

Devo-te a forma
novĂ­ssima de olhar
teu corpo onde Ă s vezes
desce o pudor o silĂŞncio
de uma pálpebra mais nada.

Devo-te o ritmo
de peixe na palavra,
a genesĂ­aca, doce
violĂŞncia dos sentidos;
esta tinta de sol
sobre o papel de silĂŞncio
das coisas – estes versos
doces, curtos, de abelhas
transportando o pĂłlen
levĂ­ssimo do dia;
estas formigas na sombra
da prĂłpria pressa e entrando
todas em fila no tempo:
com uma pergunta frágil
nas antenas, um recado invisĂ­vel, o peso
que as deixa ser e esquece;
e a tua voz que compunha
uma casa, uma rosa
a toda a volta – Ăł meu amor vieste
rasgar um sol das minhas mĂŁos!

O Sentimento dum Ocidental

I

Avé-Maria

Nas nossas ruas, ao anoitecer,
Há tal soturnidade, há tal melancolia,
Que as sombras, o bulĂ­cio, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo absurdo de sofrer.

O céu parece baixo e de neblina,
O gás extravasado enjoa-me, perturba;
E os edifícios, com as chaminés, e a turba
Toldam-se duma cor monĂłtona e londrina.

Batem carros de aluguer, ao fundo,
Levando à via-férrea os que se vão. Felizes!
Ocorrem-me em revista, exposições, países:
Madrid, Paris, Berlim, S. Petersburgo, o mundo!

Semelham-se a gaiolas, com viveiros,
As edificações somente emadeiradas:
Como morcegos, ao cair das badaladas,
Saltam de viga em viga os mestres carpinteiros.

Voltam os calafates, aos magotes,
De jaquetĂŁo ao ombro, enfarruscados, secos;
Embrenho-me, a cismar, por boqueirões, por becos,
Ou erro pelos cais a que se atracam botes.

E evoco, entĂŁo, as crĂłnicas navais:
Mouros, baixéis, heróis, tudo ressuscitado!
Luta Camões no Sul, salvando um livro a nado!
Singram soberbas naus que eu nĂŁo verei jamais!

E o fim da tarde inspira-me; e incomoda!

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Carta Ă  Minha Filha

Lembras-te de dizer que a vida era uma fila?
Eras pequena e o cabelo mais claro,
mas os olhos iguais. Na metáfora dada
pela infância, perguntavas do espanto
da morte e do nascer, e de quem se seguia
e porque se seguia, ou da total ausĂŞncia
de razĂŁo nessa cadeia em sonho de novelo.

Hoje, nesta noite tĂŁo quente rompendo-se
de junho, o teu cabelo claro mais escuro,
queria contar-te que a vida é também isso:
uma fila no espaço, uma fila no tempo
e que o teu tempo ao meu se seguirá.

Num estilo que gostava, esse de um homem
que um dia lembrou Goya numa carta a seus
filhos, queria dizer-te que a vida é também
isto: uma espingarda Ă s vezes carregada
(como dizia uma mulher sozinha, mas grande
de jardim). Mostrar-te leite-creme, deixar-te
testamentos, falar-te de tigelas – Ă© sempre
olhar-te amor. Mas é também desordenar-te à
vida, entrincheirar-te, e a mim, em fila descontĂ­nua
de mentiras, em carinho de verso.

E o que queria dizer-te Ă© dos nexos da vida,
de quem a habita para além do ar.

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Poeminha da Negação da Afirmação

Sou um homem bem comum
sem nenhuma aspiração.
NĂŁo quero ser general
e muito menos sultĂŁo.
Sou moderado de gastos,
de ambição reduzida,
nĂŁo sonho ser big-shot
estou contente da vida.
Nunca invejei o prĂłximo
nem lhe cobiço a mulher,
pego o meu lugar na fila
e seja o que Deus quiser.
NĂŁo sou mau pai, nem mau esposo,
Grosseiro nem invejoso
– sĂł um pouco mentiroso.

Poema para Galileo

Estou olhando o teu retrato, meu velho pisano,
aquele teu retrato que toda a gente conhece,
em que a tua bela cabeça desabrocha e floresce
sobre um modesto cabeção de pano.
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da tua velha Florença.
(NĂŁo, nĂŁo, Galileo! Eu nĂŁo disse Santo OfĂ­cio.
Disse Galeria dos OfĂ­cios.)
Aquele retrato da Galeria dos Ofícios da requintada Florença.
Lembras-te? A Ponte Vecchio, a Loggia, a Piazza della Signoria…
Eu sei… Eu sei…
As margens doces do Arno Ă s horas pardas da melancolia.
Ai que saudade, Galileo Galilei!

Olha. Sabes? Lá em Florença
está guardado um dedo da tua mão direita num relicário.
Palavra de honra que está!
As voltas que o mundo dá!
Se calhar até há gente que pensa
que entraste no calendário.

Eu queria agradecer-te, Galileo,
a inteligĂŞncia das coisas que me deste.
Eu,
e quantos milhões de homens como eu
a quem tu esclareceste,
ia jurar – que disparate, Galileo!
– e jurava a pés juntos e apostava a cabeça
sem a menor hesitação –
que os corpos caem tanto mais depressa
quanto mais pesados sĂŁo.

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