Poemas sobre Fim de Fernando Pessoa

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Poemas de fim de Fernando Pessoa. Leia este e outros poemas de Fernando Pessoa em Poetris.

Sorriso AudĂ­vel das Folhas

Sorriso audĂ­vel das folhas
NĂŁo Ă©s mais que a brisa ali
Se eu te olho e tu me olhas,
Quem primeiro Ă© que sorri?
O primeiro a sorrir ri.

Ri e olha de repente
Para fins de nĂŁo olhar
Para onde nas folhas sente
O som do vento a passar
Tudo é vento e disfarçar.

Mas o olhar, de estar olhando
Onde nĂŁo olha, voltou
E estamos os dois falando
O que se nĂŁo conversou
Isto acaba ou começou?

Como a Noite Ă© Longa!

Como a noite Ă© longa!
Toda a noite Ă© assim…
Senta-te, ama, perto
Do leito onde esperto.
Vem p’r’ao pĂ© de mim…

Amei tanta coisa…
Hoje nada existe.
Aqui ao pé da cama
Canta-me, minha ama,
Uma canção triste.

Era uma princesa
Que amou… Já nĂŁo sei…
Como estou esquecido!
Canta-me ao ouvido
E adormecerei…

Que Ă© feito de tudo?
Que fiz eu de mim?
Deixa-me dormir,

Dormir a sorrir
E seja isto o fim.

Entre o Luar e a Folhagem

Entre o luar e a folhagem,
Entre o sossego e o arvoredo,
Entre o ser noite e haver aragem
Passa um segredo.
Segue-o minha alma na passagem.

Tênue lembrança ou saudade,
PrincĂ­pio ou fim do que nĂŁo foi,
NĂŁo tem lugar, nĂŁo tem verdade.
Atrai e dĂłi.

Segue-o meu ser em liberdade.

Vazio encanto Ă©brio de si,
Tristeza ou alegria o traz?
O que sou dele a quem sorri?
Nada Ă© nem faz.
SĂł de segui-lo me perdi.

Mensagem – Mar PortuguĂŞs

MAR PORTUGUĂŠS

Possessio Maris

I. O Infante

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te portuguĂŞs.
Do mar e nĂłs em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

II. Horizonte

Ă“ mar anterior a nĂłs, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
’Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa —
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves,

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O Infante

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
Deus quis que a terra fosse toda uma,
Que o mar unisse, já não separasse.
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma,

E a orla branca foi de ilha em continente,
Clareou, correndo, até ao fim do mundo,
E viu-se a terra inteira, de repente,
Surgir, redonda, do azul profundo.

Quem te sagrou criou-te portuguĂŞs.
Do mar e nĂłs em ti nos deu sinal.
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez.
Senhor, falta cumprir-se Portugal!

Cansa Sentir Quando se Pensa

Cansa sentir quando se pensa.
No ar da noite a madrugar
Há uma solidão imensa
Que tem por corpo o frio do ar.

Neste momento insone e triste
Em que nĂŁo sei quem hei de ser,
Pesa-me o informe real que existe
Na noite antes de amanhecer.

Tudo isto me parece tudo.
E Ă© uma noite a ter um fim
Um negro astral silĂŞncio surdo
E nĂŁo poder viver assim.

(Tudo isto me parece tudo.
Mas noite, frio, negror sem fim,
Mundo mudo, silĂŞncio mudo –
Ah, nada Ă© isto, nada Ă© assim!)

Entre o Sono e Sonho

Entre o sono e sonho,
Entre mim e o que em mim
É o quem eu me suponho
Corre um rio sem fim.

Passou por outras margens,
Diversas mais além,
Naquelas várias viagens
Que todo o rio tem.

Chegou onde hoje habito
A casa que hoje sou.
Passa, se eu me medito;
Se desperto, passou.

E quem me sinto e morre
No que me liga a mim
Dorme onde o rio corre —
Esse rio sem fim.

Do Vale Ă  Montanha

Do vale Ă  montanha,
Da montanha ao monte, cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por casas, por prados,
Por Quinta e por fonte,
Caminhais aliados.

Do vale Ă  montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por penhascos pretos,
Atrás e defronte,
Caminhais secretos.

Do vale Ă  montanha,
Da montanha ao monte,
Cavalo de sombra,
Cavaleiro monge,
Por quanto Ă© sem fim,
Sem ninguém que o conte,
Caminhais em mim.

Chove ? Nenhuma Chuva Cai…

Chove? Nenhuma chuva cai…
EntĂŁo onde Ă© que eu sinto um dia
Em que ruĂ­do da chuva atrai
A minha inĂştil agonia ?

Onde é que chove, que eu o ouço?
Onde é que é triste, ó claro céu?
Eu quero sorrir-te, e nĂŁo posso,
Ă“ cĂ©u azul, chamar-te meu…

E o escuro ruĂ­do da chuva
É constante em meu pensamento.
Meu ser Ă© a invisĂ­vel curva
Traçada pelo som do vento…

E eis que ante o sol e o azul do dia,
Como se a hora me estorvasse,
Eu sofro… E a luz e a sua alegria
Cai aos meus pés como um disfarce.

Ah, na minha alma sempre chove.
Há sempre escuro dentro de mim.
Se escuro, alguém dentro de mim ouve
A chuva, como a voz de um fim…

Os céus da tua face, e os derradeiros
Tons do poente segredam nas arcadas…

No claustro sequestrando a lucidez
Um espasmo apagado em ódio à ânsia
Põe dias de ilhas vistas do convés

No meu cansaço perdido entre os gelos,

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