Poemas sobre Inúteis de Fernando Namora

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Poema da Hora Escoada

Minhas mãos
– duas chamas débeis de vela
unidas no mesmo destino.

Minhas mãos
derretidas em cera
que vai escorrendo,
gota a gota,
ao longo do corpo hirto
da vela moribunda.
Que vai escorrendo,
lenta,
na calmaria falsa e densa
da luz delida e mortuária do meu quarto.

E o livro de Anatomia,
grave e inútil,
aberto em frente.

E todo o mundo,
que me espera
e desespera,
nas páginas inúteis e graves
do livro de Anatomia.

E as horas
morrendo, morrendo,
como uma vela que se vai derretendo
no quarto frio de um morto.

Ai! minhas mãos, minhas mãos
– duas chamas débeis de vela
unidas no mesmo destino!

– Que horas serão?

A vida
é uma vela de corpo hirto
que se vai derretendo, derretendo,
na calmaria falsa e densa
de um quarto de morto.

Pilotagem

E os meus olhos rasgarão a noite;

E a chuva que vier ferir-me nas vidraças
Compreenderá, então, a sua inutilidade;

E todos os sinos que alimentavam insónias
hão-de repetir as horas mortas
só para os ouvidos da torre;

E os outros ruídos abafar-se-ão no manto negro da noite;

E a mão alva que me apontava os nortes
e ficou debruçada no postigo
amortalhada pela neve
reviverá de novo;

E os meus braços se erguerão transfigurados
para o abraço virgem dos teus braços
que andava perdido, sem dar fé deste seu reino;

E todas as luzes que tresnoitaram os homens
apagar-se-ão;

E o silêncio virá cheio de promessas
que não se cansaram na viagem;

E todos os povos de Babel
com as riquezas que há no mundo
virão festejar a paz em minha honra;

E os caminhos se abrirão
para os homens que seguirem de mãos dadas:

O sangue derramado de Cristo
terá finalmente significação,
e da inútil cruz do martírio
se erguerá o pendão da vitória;

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A Mais Bela Noite do Mundo

Hoje,
será o fim!

Hoje
nem este falso silêncio
dos meus gestos malogrados
debruçando-se
sobre os meus ombros nus
e esmagados!

Nem o luar, pano baço de cenário velho,
escutando
a minha prisão de viver
a lição que me ditavam:
– Menino! acende uma vela na tua vida,
que o sol, a luz e o ar
são perfumes de pecado.
Tem braços longos e tentadores – o dia!

– Menino! recolhe-te na sombra do meu regaço
que teus pés
são feitos de barro e cansaço!

(Era esta a voz do papão
pintado de belo
na máscara de papelão).

Eram inúteis e magoadas as noites da minha rua…
Noites de lua
que lembravam as grilhetas
da minha vida parada.

– Amanhã,
terás os mestres, as aulas, os amigos e os livros
e o espectáculo da morgue
morando durante dias
nos teus sentidos gorados.

Amanhã,
será o ultrapassar outra curva
no teu caminho destinado.

(Era esta a voz do papão
que acendia a vela,

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