Poemas de Pablo Neruda

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Poemas de Pablo Neruda. Conheça este e outros autores famosos em Poetris.

Sempre

Ao contrário de ti
nĂŁo tenho ciĂşmes.

Vem com um homem
Ă s costas,
vem com cem homens nos teus cabelos,
vem com mil homens entre os seios e os pés,
vem como um rio
cheio de afogados
que encontra o mar furioso,
a espuma eterna, o tempo.

Trá-los todos
até onde te espero:
estaremos sempre sozinhos,
estaremos sempre tu e eu
sozinhos na terra
para começar a vida.

Tédio

Ir levando no caminho os amores perdidos
e os sonhos idos
e os fatais sinais do olvido.

Ir seguindo na dĂşvida das horas apagadas,
pensando que todas as coisas se tornaram amargas
para alongarmos mais a via dolorosa.

E sempre, sempre, sempre recordar a fragrância
das horas que passam sem dúvidas e sem ânsias
e que deixamos longe na estéril errância.

Tradução de Albano Martins

Grita

Amor, quando chegares Ă  minha fonte distante,
cuida para que nĂŁo me morda tua voz de ilusĂŁo:
que minha dor obscura nĂŁo morra nas tuas asas,
nem se me afogue a voz em tua garganta de ouro.

Quando chegares, Amor
Ă  minha fonte distante,
sĂŞ chuva que estiola,
sĂŞ baixio que rompe.

Desfaz, Amor, o ritmo
destas águas tranquilas:
sabe ser a dor que estremece e que sofre,
sabe ser a angĂşstia que se grita e retorce.

NĂŁo me dĂŞs o olvido.
NĂŁo me dĂŞs a ilusĂŁo.
Porque todas as folhas que na terra caĂ­ram
me deixaram de ouro aceso o coração.

Quando chegares, Amor
Ă  minha fonte distante,
desvia-me as vertentes,
aperta-me as entranhas.

E uma destas tardes – Amor de mĂŁos cruĂ©is -,
ajoelhado, eu te darei graças.

Tradução de Rui Lage

Pequena América

Quando vejo a forma
da América no mapa,
amor, Ă© a ti que eu vejo:
as alturas do cobre em tua cabeça,
os teus peitos, trigo e neve,
a tua cintura delgada,
velozes rios que palpitam, doces
colinas e prados
e no frio do sul teus pés completam
a sua geografia de ouro duplicado.

Amor, se te toco,
minhas mĂŁos nĂŁo percorrem
apenas as tuas delĂ­cias,
mas ramos e terras, frutos e água,
a primavera que eu amo,
a lua do deserto, o peito
das pombas selvagens,
a suavidade das pedras polidas
pelas águas do mar ou dos rios
e a vermelha espessura
dos matagais onde
a sede e a fome espreitam.
E assim a minha extensa pátria me recebe,
pequena América, em teu corpo.

Mais ainda: quando te vejo reclinada,
em tua pele eu vejo, em tua cor de aveia,
a nacionalidade do meu carinho.
Porque dos teus ombros
fita-me, inundado de escuro suor,
o cortador de cana
de Cuba abrasadora,
e através da tua garganta
pescadores que tiritam
nas hĂşmidas casas do litoral
cantam-me o seu segredo.

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Amor

Mulher, teria sido teu filho, para beber-te
o leite dos seios como de um manancial,
para olhar-te e sentir-te a meu lado e ter-te
no riso de ouro e na voz de cristal.

Para sentir-te nas veias como Deus num rio
e adorar-te nos ossos tristes de pĂł e cal,
para que sem esforço teu ser pelo meu passasse
e saĂ­sse na estrofe – limpo de todo o mal -.

Como saberia amar-te, mulher, como saberia
amar-te, amar-te como nunca soube ninguém!
Morrer e todavia
amar-te mais.
E todavia
amar-te mais
e mais.

Tradução de Rui Lage