Inominado Nome
Persigo-o no ininteligĂvel arbĂtrio
dos astros, na clandestina linfa
que percorre os tĂşrgidos corredores
do indecifrável, nos falsos indĂcios
que, de fogos fátuos, escurecema persistente incógnita do nome.
Em persegui-lo persisto onde, bem
sei, não lograrei achá-lo, que nunca
achado será em tempo ou espaço
que excedam meu limite e dimensĂŁo.Um nome, ainda obscuro, pressinto
no sal da boca amarga, Conheço-lhe
o rosto familiar, desfocado embora,
no halo do tempo e da distância.
É, creio, a face indefectĂvel de tudoquanto tenho de calar. Este nome
(este rosto) habita-me silente, contra
a recusa, a mentira, ou a calĂşnia.
Na epiderme, nos nervos e na carne,
sobre a lĂngua e o palato, adivinho-lheforma, sabor e propĂłsito. Ouço-o
dentro de mim, mau grado
o queira ou nĂŁo, que em mim
só está sofrê-lo porque em mim
vive e dura, enquanto eu dure e viva.E nĂŁo por meu mal, que meu
mal seria, mais que perdĂŞ-lo,
sem ele viver.
Um rosto persigo,
um nome guardo no sal da bocaamarga,
Poemas sobre Recusa
5 resultadosOrfeu Rebelde
Orfeu rebelde, canto como sou:
Canto como um possesso
Que na casca do tempo, a canivete,
Gravasse a fĂşria de cada momento;
Canto, a ver se o meu canto compromete
A eternidade do meu sofrimento.Outros, felizes, sejam os rouxinĂłis…
Eu ergo a voz assim, num desafio:
Que o céu e a terra, pedras conjugadas
Do moinho cruel que me tritura,
Saibam que há gritos como há nortadas,
ViolĂŞncias famintas de ternura.Bicho instintivo que adivinha a morte
No corpo dum poeta que a recusa,
Canto como quem usa
Os versos em legĂtima defesa.
Canto, sem perguntar Ă Musa
Se o canto Ă© de terror ou de beleza.
Fim
Quando eu morrer batam em latas,
Rompam aos saltos e aos pinotes,
Façam estalar no ar chicotes,
Chamem palhaços e acrobatas!Que o meu caixão vá sobre um burro
Ajaezado Ă andaluza…
A um morto nada se recusa,
Eu quero por força ir de burro.
Viver
Mas era apenas isso,
era isso, mais nada?
Era sĂł a batida
numa porta fechada?E ninguém respondendo,
nenhum gesto de abrir:
era, sem fechadura,
uma chave perdida?Isso, ou menos que isso
uma noção de porta,
o projecto de abri-la
sem haver outro lado?O projecto de escuta
Ă procura de som?
O responder que oferta
o dom de uma recusa?Como viver o mundo
em termos de esperança?
E que palavra Ă© essa
que a vida não alcança?
Natal
Mais uma vez, cá vimos
Festejar o teu novo nascimento,
NĂłs, que, parece, nos desiludimos
Do teu advento!Cada vez o teu Reino Ă© menos deste mundo!
Mas vimos, com as mĂŁos cheias dos nossos pomos,
Festejar-te, — do fundo
Da miséria que somos.Os que à chegada
Te vimos esperar com palmas, frutos, hinos,
Somos — não uma vez, mas cada —
Teus assassinos.Ă€ tua mesa nos sentamos:
Teu sangue e corpo Ă© que nos mata a sede e a fome;
Mas por trinta moedas te entregamos;
E por temor, negamos o teu nome.Sob escárnios e ultrajes,
Ao vulgo te exibimos, que te aclame;
Te rojamos nas lajes;
Te cravejamos numa cruz infane.Depois, a mesma cruz, a erguemos,
Como um farol de salvação,
Sobre as cidades em que ferve extremos
A nossa corrupção.Os que em leilão a arrematamos
Como sagrada peça única,
Somos os que jogamos,
Para comércio, a tua túnica.Tais somos, os que, por costume,
Vimos, mais uma vez,