Sonetos sobre Alegria de Florbela Espanca

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Sonetos de alegria de Florbela Espanca. Leia este e outros sonetos de Florbela Espanca em Poetris.

Nervos D’Oiro

Meus nervos, guizos de oiro a tilintar
Cantam-me n’alma a estranha sinfonia
Da volĂșpia, da mĂĄgoa e da alegria,
Que me faz rir e que me faz chorar!

Em meu corpo fremente, sem cessar,
Agito os guizos de oiro da folia!
A Quimera, a Loucura, a Fantasia,
Num rubro turbilhĂŁo sinto-As passar!

O coração, numa imperial oferta.
Ergo-o ao alto! E, sobre a minha mĂŁo,
É uma rosa de pĂșrpura, entreaberta!

E em mim, dentro de mim, vibram dispersos,
Meus nervos de oiro, esplĂȘndidos, que sĂŁo
Toda a Arte suprema dos meus versos!

Alvorecer

A noite empalidece. Alvorecer…
Ouve-se mais o gargalhar da fonte…
Sobre a cidade muda, o horizonte
É uma orquídea estranha a florescer.

HĂĄ andorinhas prontas a dizer
A missa d’alva, mal o sol desponte.
Gritos de galos soam monte em monte
Numa intensa alegria de viver.

Passos ao longe… um vulto que se esvai…
Em cada sombra Colombina trai…
Anda o silĂȘncio em volta a q’rer falar…

E o luar que desmaia, macerado,
Lembra, pĂĄlido, tonto, esfarrapado,
Um Pierrot, todo branco, a soluçar…

A Tua Voz de Primavera

Manto de seda azul, o céu reflete
Quanta alegria na minha alma vai!
Tenho os meus lĂĄbios Ășmidos: tomai
A flor e o mel que a vida nos promete!

Sinfonia de luz meu corpo nĂŁo repete
O ritmo e a cor dum mesmo desejo… olhai!
Iguala o sol que sempre Ă s ondas cai,
Sem que a visĂŁo dos poentes se complete!

Meus pequeninos seios cor-de-rosa,
Se os roça ou prende a tua mão nervosa,
TĂȘm a firmeza elĂĄstica dos gamos…

Para os teus beijos, sensual, flori!
E amendoeira em flor, só ofereço os ramos,
SĂł me exalto e sou linda para ti!

A Vida

É vĂŁo o amor, o Ăłdio, ou o desdĂ©m;
InĂștil o desejo ou o sentimento…
Lançar um grande amor aos pés de alguém
O mesmo é que lançar flores ao vento!

Todos somos no mundo “Pedro Sem”,
Uma alegria Ă© feita dum tormento,
Um riso Ă© sempre o eco dum lamento,
Sabe-se lĂĄ um beijo de onde vem!

A mais nobre ilusĂŁo morre… desfaz-se…
Uma saudade morta em nĂłs renasce
Que no mesmo momento Ă© jĂĄ perdida…

Amar-te a vida inteira eu nĂŁo podia.
A gente esquece sempre o bem de um dia.
Que queres, meu Amor, se Ă© isto a vida!…

Torre de NĂ©voa

Subi ao alto, Ă  minha Torre esguia,
Feita de fumo, névoas e luar,
E pus-me, comovida, a conversar
Com os poetas mortos, todo o dia.

Contei-lhes os meus sonhos, a alegria
Dos versos que sĂŁo meus, do meu sonhar,
E todos os poetas, a chorar,
Responderam-me então: “Que fantasia,

Criança doida e crente! Nós também
Tivemos ilusÔes, como ninguém,
E tudo nos fugiu, tudo morreu! …”

Calaram-se os poetas, tristemente …
E Ă© desde entĂŁo que eu choro amargamente
Na minha Torre esguia junto ao cĂ©u! …