Sonetos sobre Crânio de Cruz e Souza

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Sonetos de crânio de Cruz e Souza. Leia este e outros sonetos de Cruz e Souza em Poetris.

Na Mazurka

Morava num palácio — estranha BabilĂ´nia
De arcadas colossais, de impávidos zimbórios,
Alcovas de damasco e torreões marmóreos,
Volutas primorais de arquitetura jĂ´nia.

Assim, quando surgia em meio aos peristilos
Descendo, qual mulher de SĂ©fora, vaidosa,
Envolta em ouropéis, em sedas, luxuosa,
Cercam-na do belo os mĂ­sticos sigilos!

E quando nos saraus, assim como um rainĂşnculo,
O lábio lhe tremia e o olhar, vivo carbúnculo,
Vibrava nos salões, como uma adaga turca,

Ou como o sol em cheio e rubro sobre o BĂłsforo,
— nos crânios os Homens sentiam ter mais fĂłsforo…
Ao vĂŞ-la escultural no passo da Mazurka…

Soneto

A Moreira de Vasconcelos

Na luta dos impossĂ­veis,
do espirito e da matéria,
tu és a águia sidérea
dos pensamentos terrĂ­veis!
(Do Autor)

É um pensar flamejador, dardânico
Uma explosão de rápidas idéias,
Que como um mar de estranhas odisséias
Saem-lhe do crânio escultural, titânico!…

Parece haver um cataclismo enorme
Lá dentro, em ânsia, a rebentar, fremente!…
Parece haver a convulsĂŁo potente,
Dos rubros astros num fragor disforme!…

HĂŁo de ruir na transfusĂŁo dos mundos
Os monumentos colossais profundos,
As cousas vĂŁs da brasileira histĂłria!

Mas o seu vulto, sobre a luz alçado,
Oh! há de erguer-se de arrebĂłis c’roado,
Como Atalaia nos umbrais da glĂłria!!…

Metamorfose

A Carlos Ferreira

O sol em fogo pelo ocaso explode
Nesse estertor, que os crânios assoberba.
Vivo, o clarĂŁo, nuns frocos exacerba
Dos ideais a original nevrose.

Da natureza os anafis mouriscos
Ante o cariz da atmosfera muda,
Soam queixosos, numa nota aguda,
Da luz que esvai-se aos derradeiros discos.

O pensamento que flameja e luta
Nos ares rasga aprofundado sulco…
A sombra desce nos lisins da gruta;

E a lua nova — a peregrina Onfale,
Como em um plaustro luminoso, hiulco,
Surge através dos pinheirais do vale.

Guerra Junqueiro

Quando ele do Universo o largo supedâneo
Galgou como os clarões — quebrando o que nĂŁo serve,
Fazendo que explodissem os astros de seu crânio,
As gemas da razĂŁo e os mĂşsculos da verve;

Quando ele esfuziou nos páramos as trompas,
As trompas marciais — as liras do estupendo,
Pejadas de prodĂ­gios, assombros e de pompas,
Crescendo em proporções, crescendo e recrescendo;

Quando ele retesou os nervos e as artérias
Do verso orbicular — rasgando das misĂ©rias
O ventre do Ideal na forte hematemese.

Clamando — Ă© minha a luz, que o sĂ©culo propague-a,
Quando ele avassalou os píncaros da águia
E o sol do Equador vibrou-lhe aquelas teses!

Alçando O Livro Colossal Ardente

Alçando o livro colossal ardente
Traças no crânio um sulco luminoso,
E vais seguindo o remontar garboso
Do sol fagueiro lá no espaço ingente!

Ergues a fronte juvenil potente
Já como herói ou lutador famoso
E c’uma forma de pensar honroso
Fazes-te esperança da brasílea gente!

Seis vezes astro de maior grandeza
Enfim lá surges nos exames belos
Enfim triunfas na brilhante empresa!

Seis vezes quebras da ignorância os elos,
Seis vezes vives com mais sĂŁ firmeza,
Gemem seis vezes a louvar-te os prelos!…

Quando Apareces, Fica-Se ImpassĂ­vel

Quando apareces, fica-se impassĂ­vel
E mudo e quedo, trĂŞmulo, gelado!…
Quer-se ficar com atenção, calado,
Quer-se falar sem mesmo ser possĂ­vel!.

Anda-se c’o a alma n’um estado horrĂ­vel
O coração completamente ervado!…
Quer-se dar palmas, mas sem ser notado,
Quer-se gritar, n’uma explosĂŁo temĂ­vel!…

Sobe-se e desce-se ao paĂ­s das fadas,
Vaga-se co’as nuvens das mansões douradas
Sob um esforço colossal, titânico!…

E as idĂ©ias galopando voam…
Então lá dentro sem parar, ressoam
As indomáveis convulsões do crânio!!…