Sonetos sobre Desejos de Antero de Quental

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Sonetos de desejos de Antero de Quental. Leia este e outros sonetos de Antero de Quental em Poetris.

Amor Vivo

Amar! mas d’um amor que tenha vida…
NĂŁo sejam sempre tĂ­midos harpejos,
NĂŁo sejam sĂł delirios e desejos
D’uma douda cabeça escandecida…

Amor que vive e brilhe! luz fundida
Que penetre o meu ser — e não só beijos
Dados no ar — delírios e desejos —
Mas amor… dos amores que tĂŞm vida…

Sim, vivo e quente! e já a luz do dia
Não virá dissipa-lo nos meus braços
Como nĂ©voa da vaga fantasia…

Nem murchará do sol á chama erguida…
Pois que podem os astros dos espaços
Contra dĂ©beis amores… se tĂŞm vida?

Elogio da Morte

I

Altas horas da noite, o Inconsciente
Sacode-me com força, e acordo em susto.
Como se o esmagassem de repente,
Assim me pára o coração robusto.

NĂŁo que de larvas me povĂ´e a mente
Esse vácuo nocturno, mudo e augusto,
Ou forceje a razĂŁo por que afugente
Algum remorso, com que encara a custo…

Nem fantasmas nocturnos visionários,
Nem desfilar de espectros mortuários,
Nem dentro de mim terror de Deus ou Sorte…

Nada! o fundo dum poço, húmido e morno,
Um muro de silĂŞncio e treva em torno,
E ao longe os passos sepulcrais da Morte.

II

Na floresta dos sonhos, dia a dia,
Se interna meu dorido pensamento.
Nas regiões do vago esquecimento
Me conduz, passo a passo, a fantasia.

Atravesso, no escuro, a névoa fria
D’um mundo estranho, que povĂ´a o vento,
E meu queixoso e incerto sentimento
Só das visões da noite se confia.

Que mĂ­sticos desejos me enlouquecem?
Do Nirvana os abismos aparecem,
A meus olhos, na muda imensidade!

N’esta viagem pelo ermo espaço,

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Ideal

Aquela, que eu adoro, nĂŁo Ă© feita
De lĂ­rios nem de rosas purpurinas,
NĂŁo tem as formas languidas, divinas
Da antiga VĂ©nus de cintura estreita…

NĂŁo Ă© a Circe, cuja mĂŁo suspeita
Compõe filtros mortaes entre ruinas,
Nem a Amazona, que se agarra ás crinas
D’um corcel e combate satisfeita…

A mim mesmo pergunto, e nĂŁo atino
Com o nome que dĂŞ a essa visĂŁo,
Que ora amostra ora esconde o meu destino…

É como uma miragem, que entrevejo,
Ideal, que nasceu na solidĂŁo,
Nuvem, sonho impalpável do Desejo…

Transcendentalismo

(A J. P. Oliveira Martins)

Já sossega, depois de tanta luta,
Já me descansa em paz o coração.
CaĂ­ na conta, enfim, de quanto Ă© vĂŁo
O bem que ao Mundo e Ă  Sorte se disputa.

Penetrando, com fronte nĂŁo enxuta,
No sacrário do templo da Ilusão,
SĂł encontrei, com dor e confusĂŁo,
Trevas e pĂł, uma matĂ©ria bruta…

Não é no vasto mundo — por imenso
Que ele pareça à nossa mocidade —
Que a alma sacia o seu desejo intenso…

Na esfera do invisĂ­vel, do intangĂ­vel,
Sobre desertos, vácuo, soledade,
VĂ´a e paira o espĂ­rito impassĂ­vel!

Sempre o Futuro, Sempre! e o Presente

Sempre o futuro, sempre! e o presente
Nunca! Que seja esta hora em que se existe
De incerteza e de dor sempre a mais triste,
E sĂł farte o desejo um bem ausente!

Ai! que importa o futuro, se inclemente
Essa hora, em que a esperança nos consiste,
Chega… Ă© presente… e sĂł á dor assiste?…
Assim, qual é a esperança que não mente?

Desventura ou delirio?… O que procuro,
Se me foge, Ă© miragem enganosa,
Se me espera, peor, espectro impuro…

Assim a vida passa vagarosa:
O presente, a aspirar sempre ao futuro:
O futuro, uma sombra mentirosa.

Oceano Nox

Junto do mar, que erguia gravemente
A trágica voz rouca, enquanto o vento
Passava como o vĂ´o do pensamento
Que busca e hesita, inquieto e intermitente,

Junto do mar sentei-me tristemente,
Olhando o céu pesado e nevoento,
E interroguei, cismando, esse lamento
Que saĂ­a das coisas, vagamente…

Que inquieto desejo vos tortura,
Seres elementares, força obscura?
Em volta de que idéia gravitais?

Mas na imensa extensĂŁo, onde se esconde
O Inconsciente imortal, sĂł me responde
Um bramido, um queixume, e nada mais…

Transcedentalismo

Já sossega, depois de tanta luta,
Já me descansa em paz o coração.
CaĂ­ na conta, enfim, de quanto Ă© vĂŁo
O bem que ao Mundo e Ă  Sorte se disputa.

Penetrando, com fronte nĂŁo enxuta,
No sacrário do templo da Ilusão,
SĂł encontrei, com dor e confusĂŁo,
Trevas e pĂł, uma matĂ©ria bruta…

NĂŁo Ă© no vasto Mundo – por imenso
Que ele pareça Ă  nossa mocidade –
Que a alma sacia o seu desejo intenso…

Na esfera do invisĂ­vel, do intangĂ­vel,
Sobre desertos, vácuo, soledade,
Voa e paira o espĂ­rito impassĂ­vel!