Sonetos sobre Palavras de LuĂ­s Filipe Castro Mendes

3 resultados
Sonetos de palavras de LuĂ­s Filipe Castro Mendes. Leia este e outros sonetos de LuĂ­s Filipe Castro Mendes em Poetris.

Tentação

Eu não resistirei à tentação,
nĂŁo quero que de mim possas perder-te,
que sĂł na fonte fria da razĂŁo
renasça a minha sede de beber-te.

Eu não resistirei à tentação
de quanto adivinhei nesta amargura:
um sim que sĂł assalta quem diz nĂŁo,
um corpo que entrevi na selva escura.

Resistirei a te chamar paixĂŁo,
a te perder nos versos, nas palavras:
mas não resistirei à tentação
de te dizer que o céu é o que rasa

a luz que nos teus olhos eu perdi
e que na terra toda nĂŁo mais vi.

Fim do Dia

Aquieta-se o silĂȘncio na folhagem,
que em ĂĄrvores teceu amor antigo;
sobressalto transposto da viagem
que o dia rumoroso fez consigo.

O coração, que é sombra na paisagem,
dĂĄ Ă s palavras vĂŁs outro sentido;
e Ă© murmĂșrio desfeito na aragem,
que do entardecer recolhe abrigo.

Ares assim se fazem de uma luz
que torna como baço o sol poente;
e o coração à estrema se reduz,
como o dia se volve mais ausente.

Recolhem-se as palavras no vagar
que dia nem fulgor nos podem dar.

CrĂ­tica da Poesia

Que a frenética poesia me perdoe
se a um baço rumor levanto o laço,
pois que verso nĂŁo hĂĄ onde nĂŁo soe
a mĂșsica discreta doutro espaço.

Horizonte do verso Ă© a dureza:
jĂĄ mansidĂŁo nĂŁo cabe neste olhar
que se pousa na faca sobre a mesa
e aprende nela o fio do seu cantar.

Mas se olhar nela pousa, como corta?
E se as palavras sabemos retomar,
quem nos devolve a chave dessa porta
onde a herança estå por encerrar?

TĂŁo longe estĂĄ de nĂłs a poesia
como nuvem nos rouba a luz do dia.