Sonetos sobre SilĂȘncio de Martins Fontes

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Sonetos de silĂȘncio de Martins Fontes. Leia este e outros sonetos de Martins Fontes em Poetris.

Beijos No Ar

No silĂȘncio da noite, alta e deserta,
inebriante, férvido sintoma,
uma fragrĂąncia feminina assoma
e tentadoramente me desperta.

Entrou-me, em ondas, a janela aberta,
como se se quebrara uma redoma,
da qual fugira o delirante aroma,
que o mistério do amor assim me oferta.

De que dama-da-noite ou jasmineiro,
de que magnĂłlia em flor, em fevereiro,
se exala esse cĂĄlido desejo?

Ela sonha comigo: esse perfume
vem da sua saudade, que presume,
embora em sonho, ter-me dado um beijo!

Longus

É de manhã, no outono. À luz, o orvalho
doira os mirtais de trĂȘmulas capelas.
e, sobre o solo, recobrindo o atalho,
hĂĄ milhares de folhas amarelas…

A Filetas, ao pé de amplo carvalho,
ouvem as narraçÔes e pastorelas,
um rapaz, aindaingĂȘnuo e sem trabalho,
e a mais linda de todas as donzelas…

É a narrativa do florir dos prados,
que o mais doce dos velhos barbilongos
conta ao casal de jovens namorados…

SilĂȘncio… Ouvi-lhe o beijo dos ditongos,
os silĂĄbicos sons, que musicados,
cantam na amĂĄvel pastoral de Longus…

A Água Toda Secou Até Nos Olhos

— Meu culto ao Ceará, Coração do Brasil.

O rio vai morrer, sem que nada o socorra,
sem que ninguém, jamais, bendiga o moribundo.
Morre na solidĂŁo, no silĂȘncio profundo,
e o malårico mal o mantém em modorra.

A enfermidade faz que da boca lhe escorra
o limo, feito fel, viscoso e nauseabundo.
E o terror se lhe vĂȘ das Ăłrbitas ao fundo.
ParalĂ­tico jaz na estreitez da masmorra.

Tu só, tu, meu Irmão, que a miséria não vence.
Que suportando a sede, a fome, a febre, o frio,
sem que prĂȘmio nenhum teu martĂ­rio compense.

Poeta, herĂłi, semideus, sabes o desvario,
a sobre-humana dor, a bravura, cearense,
de quem se suicidou, vendo morrer o rio.