Textos sobre Caminhos de Friedrich Nietzsche

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Textos de caminhos de Friedrich Nietzsche. Leia este e outros textos de Friedrich Nietzsche em Poetris.

Virtudes Inconscientes

Todas as qualidades pessoais de que um homem tem consciência – sobretudo quando supõe que os que o rodeiam as vêem, que saltam aos olhos dos outros -, estão submetidas a leis da evolução completamente diferentes daquelas que regem as qualidades que ele conhece mal ou não conhece, as qualidades que a sua finura dissimula ao observador mais subtil e que parecem entrincheirar-se atrás da cortina do nada. Assim como a delicada gravura que esculpe a escama da serpente: seria um erro ver nela ou uma arma ou um ornamento, porque só é possível descobri-la ao microscópio, por consequência com um olho cuja potência é devida a tais artifícios que os animais para os quais ela teria por sua vez servido de arma ou de ornamento não possuem semelhante!
As nossas qualidade morais visíveis e, nomeadamente, aquelas que nós acreditamos serem tais, seguem o seu caminho; e as do mesmo nome que se não vêem, que não podem portanto servir-nos de arma ou de ornamento, seguem assim o seu caminho, provavelmente completamente diferente, decoradas de linhas, de finuras e de esculturas que poderiam talvez dar prazer a um deus munido com um microscópio divino. Eis por exemplo o nosso zelo,

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Em que Medida o Homem Activo é Preguiçoso

Creio que cada um deve ter uma opinião própria sobre todas as coisas, acerca das quais são possíveis opiniões, porque ele mesmo é uma coisa singular, única, que ocupa uma posição nova, nunca vista, em relação a todas as outras coisas. Mas a preguiça, que jaz no fundo da alma do homem activo, impede-o de tirar água do seu próprio poço. Com a liberdade das opiniões passa-se o mesmo que com a saúde: ambas são individuais, nem de uma nem de outra se pode formular um conceito universalmente válido. Aquilo de que um indivíduo necessita para a sua saúde já é motivo de doença para outro, e muitos caminhos e meios para se chegar à liberdade de espírito podem ser considerados por naturezas superiormente desenvolvidas como caminhos e meios que afastam da liberdade.

Pensamentos não Acabados

Tal como não só a idade viril, mas também a juventude e a infância têm um valor em si e não devem de modo algum ser consideradas somentes como passagens e pontes, assim também os pensamentos não acabados têm o seu valor. Não se deve por isso, atormentar um poeta com uma subtil interpretação e divertir-se com a incerteza do seu horizonte, como se o caminho para vários pensamentos ainda estivesse aberto. Está-se no limiar; espera-se como no desenterramento de um tesouro: é como se devesse estar iminente um feliz achado de pensamento profundo. O poeta antecipa qualquer coisa do prazer que o pensador tem, ao encontrar uma ideia fundamental, e, com isso, torna-nos cobiçosos, de modo que nós tentamos apanhá-la; esta, porém, passa, esvoaçando, sobre a nossa cabeça e mostra as mais belas asas de borboleta… e, contudo, escapa-nos.

A Vida não me Desapontou

Não, a vida não me desapontou! Pelo contrário, todos os anos a acho melhor, mais desejável, mais misteriosa… desde o dia em que vejo a mim a grande libertadora, a ideia de que a vida podia ser experiência para aqueles que procuram saber, e não dever, fatalidade, duplicidade!… Quanto ao próprio conhecimento, seja ele para outros aquilo que quiser, um leito de repouso, ou o caminho para um leito de repouso, ou distracção ou vagabundagem, para mim é um mundo de perigos, é um universo de vitórias onde os sentimentos heróicos têm a sua sala de baile. «A vida é um meio de conhecimento»; quando se tem este princípio no coração, pode viver-se não somente corajoso mas feliz, pode-se rir alegremente!

Dignidade Perdida

A meditação perdeu toda a sua dignidade exterior; ridicularizou-se o cerimonial e a atitude solene daquele que reflecte; já não se poderia continuar a suportar um sages da velha escola. Pensamos demasiado depressa, e pelo caminho, em plena marcha, no meio de negócios de toda a espécie, mesmo quando se trate das coisas mais graves; temos apenas necessidade de pouca preparação, e até de pouco silêncio: tudo se passa como se tivéssemos na cabeça uma máquina que girasse incessantemente e que prosseguisse o seu trabalho, mesmo nas piores circunstâncias. Outrora, quando alguém se queria pôr a pensar – era uma coisa excepcional! – era coisa que se notava imediatamente ; notava-se que queria tornar-se mais sábio e que se preparava para uma ideia: o seu rosto ganhava uma expressão como em oração; o homem detinha-se na sua marcha; ficava até imóvel durante horas na rua, apoiado numa perna ou nas duas, quando a ideia lhe «surgia». A coisa «valia» então «esse trabalho».

Aos Pregadores de Moral

Não quero fazer moral, mas dou o seguinte conselho àqueles que a fazem: se quereis tirar às melhores coisas todo o prestígio e todo o valor, continuai a falar delas como o fazeis. Fazei disso o centro da vossa moral, repeti de manhã à noite a felicidade da virtude, a tranquilidade da alma, a equidade e a justiça imanente; pelo caminho por onde ides, essas excelentes coisas acabarão por ganhar o coração do povo; a voz do povo estará do seu lado; mas, passando de mão em mão, perderão toda a sua duradoura; pior: o seu ouro transformar-se-á em chumbo. Ah! Como sois peritos nessas contra-alquimias! Como sabeis desvalorizar as substâncias mais preciosas! Tentai, portanto, uma vez, a título de experiência, uma receita diferente, se não quereis, como até agora, conseguir o contrário daquilo que procurais: negai essas excelentes coisas, retirai-lhes o aplauso da multidão, entravai a sua circulação, voltai a fazê-las outra vez o objecto de secreto pudor da alma solitária, dizei que a moral é um fruto proibido! Talvez ganheis então para a vossa causa a única espécie de homens que interessa, quero dizer, a raça dos heróis.

O Caminho da Felicidade

Um sábio perguntava a um louco qual era o caminho da felicidade. O louco respondeu-lhe imediatamente, como alguém a quem se pergunta o caminho da cidade vizinha: «Admira-te a ti mesmo e vive na rua». «

É Preciso Aprender a Amar

Que se passa para nós no domínio musical? Devemos em primeiro lugar aprender a ouvir um motivo, uma ária, de uma maneira geral, a percebê-lo, a distingui-lo, a limitá-lo e isolá-lo na sua vida própria; devemos em seguida fazer um esforço de boa vontade — para o suportar, mau-grado a sua novidade — para admitir o seu aspecto, a sua expressão fisionómica — e de caridade — para tolerar a sua estranheza; chega enfim o momento em que já estamos afeitos, em que o esperamos, em que pressentimos que nos faltaria se não viesse; a partir de então continua sem cessar a exercer sobre nós a sua pressão e o seu encanto e, entretanto, tornamo-nos os seus humildes adoradores, os seus fiéis encantados que não pedem mais nada ao mundo, senão ele, ainda ele, sempre ele.
Não sucede assim só com a música: foi da mesma maneira que aprendemos a amar tudo o que amamos. A nossa boa vontade, a nossa paciência, a nossa equanimidade, a nossa suavidade com as coisas que nos são novas acabam sempre por ser pagas, porque as coisas, pouco a pouco, se despojam para nós do seu véu e apresentam-se a nossos olhos como indizíveis belezas: é o agradecimento da nossa hospitalidade.

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Absurdo, Liberdade e Projecto

Uma vez admitidos dois factos: que o devir não tem fim e que não é dirigido por qualquer grande unidade na qual o indivíduo possa mergulhar totalmente como num elemento de valor supremo, resta só uma escapatória possível: condenar todo esse mundo do devir como ilusório e inventar um mundo situado no além, que seria o mundo verdadeiro. Mas, logo que o homem descobre que este mundo não é senão construído sobre as suas próprias necessidades psicológicas e que ele não é de nenhum modo obrigado a acreditar nele, vemos aparecer a última forma do niilismo, que implica a negação do mundo metafísico e que a si mesma se proíbe de crer num mundo verdadeiro. Alcançado este estado, reconhecemos que a realidade do devir é a única realidade e abstemo-nos de todos os caminhos afastados que conduziriam à crença em outros mundos e em falsos deuses – mas não suportamos este mundo que não temos já a vontade de negar.
(…) Que se passou portanto? Chegámos ao sentimento do não valor da existência quando compreendemos que ela não pode interpretar-se, no seu conjunto, nem com a ajuda do conceito de fim, nem com a do conceito de unidade, nem com a do conceito de verdade.

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A Comédia do Ambicioso

Um homem que aspira a coisas grandes considera todo aquele que encontra no seu caminho, ou como meio, ou como retardamento e impedimento, – ou como um leito de repouso passageiro. A sua “bondade” para com os outros, que o caracteriza e que é superior, só é possível quando ele atinge o seu máximo e domina. A impaciência e a sua consciência de, até aqui, estar sempre condenado à comédia – pois mesmo a guerra é uma comédia e encobre, como qualquer meio encobre o fim -, estraga-lhe todo o convívio: esta espécie de homem conhece a solidão e o que ela tem de mais venenoso.

Prejudicar com o que se tem de Melhor

As nossas forças levam-nos por vezes tão longe que não podemos continuar a suportar as nossas fraquezas e disso perecemos: bem nos sucede prever esse resultado, mas não lhe podemos introduzir nenhuma modificação. Usamos então a dureza contra o que seria necessário poupar em nós memos, e a nossa grandeza faz a nossa barbárie.
Esta experiência, que acabamos por pagar com a vida, simboliza a acção dos grandes homens nos outros e no seu tempo: é com aquilo que têm de melhor, com aquilo que são os únicos a poder fazer, que arruinam grande número de seres fracos, incertos, sem vontade própria, ainda em mudança, é com aquilo que têm de melhor em si próprios que se tornam nocivos. Pode até acontecer que só prejudiquem porque aquilo que há de melhor nele só pode ser absorvido, esvaziado de um trago, de qualquer maneira, por seres que ali afogam a sua razão e a sua individualidade, como se fosse num licor excessivamente forte: estão de tal modo embriagados que não poderão deixar de partir os membros em todos os caminhos em que a sua embriaguez os fulminará.

O Que se Pode Prometer

Pode-se prometer acções, mas não sentimentos, pois estes são involuntários. Quem promete a alguém amá-lo sempre, ou odiá-lo sempre, ou ser-lhe sempre fiel, promete algo que não está em seu poder; mas o que pode perfeitamente prometer são aquelas acções que, na verdade, são geralmente as consequências do amor, do ódio, da fidelidade, mas que também podem emanar de outras razões, pois a uma acção conduzem diversos caminhos e motivos. A promessa de amar sempre alguém significa, portanto: enquanto eu te amar, manifestar-te-ei as acções do amor; se eu já não te amar, pois, não obstante, receberás para sempre de mim as mesmas acções, ainda que por outros motivos. De modo que a aparência de que o amor estaria inalterado e continuaria sendo o mesmo permanece na cabeça das outras pessoas. Promete-se, por conseguinte, a persistência da aparência do amor, quando, sem ilusão, se promete a alguém amor perpétuo.

Retrocesso Civilizacional

São talvez as prioridades dos nossos tempos que acarretam um retrocesso e uma eventual depreciação da vida contemplativa. Mas há que confessar que a nossa época é pobre em grandes moralistas, que Pascal, Epicteto, Séneca, Plutarco pouco são lidos ainda, que o trabalho e o esforço – outrora, no séquito da grande deusa Saúde – parecem, por vezes, grassar como uma doença. Porque faltam tempo para pensar e sossego no pensar, já não se examina as opiniões diferentes: a gente contenta-se em odiá-las. Dada a enorme aceleração da vida, o espírito e o olhar são acostumados a ver e a julgar parcial ou erradamente, e toda a gente se assemelha aos viajantes que ficam a conhecer um país e um povo, vendo-os do caminho-de-ferro.
Uma atitude independente e cautelosa em matéria de conhecimento é menosprezada quase como uma espécie de tolice, o espírito livre é difamado, nomeadamente, por eruditos que, na sua arte de observar as coisas, sentem a falta da minúcia e do zelo de formigas que lhes são próprios, e bem gostariam de bani-lo para um canto isolado da ciência: quando ele tem a missão, completamente diferente e superior, de comandar, a partir de uma posição solitária,

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Escolhe Inimigos Que Te Mereçam

Gosto dos valentes; mas não basta bater a torto e a direito; é preciso saber ainda no que se bate. E muitas vezes há mais coragem em se conter e passar adiante, a fim de se reservar para um adversário mais digno. Tende apenas inimigos dignos de ódio, e não inimigos desprezíveis; é necessário que possais estar orgulhosos dos vossos inimigos; já vos ensinei isso.
É necessário reservardes-vos para um adversário mais digno, meus amigos; por isso tereis de passar por cima de muitas ofensas, – passar por cima de muita canalha que vos massacrará com as palavras povo e nação.
Livrai o vosso olhar de se misturar às suas contestações. É um matagal de direitos e de abusos. Ter de considerá-los irrita. Lançar aí os olhos – atirar-se para a confusão – é a mesma coisa; ide-vos pois para os bosques e deixai dormir a vossa espada!
Segui os caminhos que vos pertencem.