Textos sobre Inesperado de Pablo Neruda

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Textos de inesperado de Pablo Neruda. Leia este e outros textos de Pablo Neruda em Poetris.

Os Deuses Reclinados

… Por todos os lados as estĂĄtuas de Buda, de Lorde Buda… As severas, verticais, carcomidas estĂĄtuas, com um dourado de resplendor animal, com uma dissolução como se o ar as desgastasse… Crescem-lhes nas faces, nas pregas das tĂșnicas, nos cotovelos, nos umbigos, na boca e no sorriso pequenas mĂĄculas: fungos, porosidades, vestĂ­gios excrementĂ­cios da selva… Ou entĂŁo as jacentes, as imensas jacentes, as estĂĄtuas de quarenta metros de pedra, de granito areento, pĂĄlidas, estendidas entre as sussurrantes frondes, inesperadas, surgindo de qualquer canto da selva, de qualquer plataforma circundante… Adormecidas ou nĂŁo adormecidas, estĂŁo ali hĂĄ cem anos, mil anos, mil vezes mil anos… Mas sĂŁo suaves, com uma conhecida ambiguidade ultraterrena, aspirando a ficar e a ir-se embora… E aquele sorriso de suavĂ­ssima pedra, aquela majestade imponderĂĄvel, mas feita de pedra dura, perpĂ©tua, para quem sorriem, para quem, sobre a terra sangrenta?… Passaram as camponesas que fugiam, os homens do incĂȘndio, os guerreiros mascarados, os falsos sacerdotes, os turistas devoradores…

E manteve-se no seu lugar a estĂĄtua, a imensa pedra com joelhos, com pregas na tĂșnica de pedra, com o olhar perdido e nĂŁo obstante existente, inteiramente inumana e de alguma forma tambĂ©m humana, de alguma forma ou de alguma contradição estatuĂĄria,

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A Palavra

…Tudo o que vocĂȘ quiser, sim senhor, mas sĂŁo as palavras que cantam, que sobem e descem… Prosterno-me diante delas… Amo–as, abraço-as, persigo-as, mordo-as, derreto-as… Amo tanto as palavras… As inesperadas… As que glutonamente se amontoam, se espreitam, atĂ© que de sĂșbito caem… VocĂĄbulos amados… Brilham como pedras de cores, saltam como irisados peixes, sĂŁo espuma, fio, metal, orvalho… Persigo algumas palavras… SĂŁo tĂŁo belas que quero pĂŽ-las a todas no meu poema… Agarro-as em voo, quando andam a adejar, e caço-as, limpo-as, descasco-as, preparo-me diante do prato, sinto-as cristalinas, vibrantes, ebĂșrneas, vegetais, oleosas, como frutas, como algas, como ĂĄgatas, como azeitonas… E entĂŁo revolvo-as, agito-as, bebo-as, trago-as, trituro-as, alindo-as, liberto-as… Deixo-as como estalactites no meu poema, como pedacinhos de madeira polida, como carvĂŁo, como restos de naufrĂĄgio, presentes das ondas… Tudo estĂĄ na palavra… Uma ideia inteira altera-se porque uma palavra mudou de lugar, ou porque outra se sentou como um reizinho dentro de uma frase que nĂŁo a esperava, nas que lhe obedeceu… Elas tĂȘm sombra, transparĂȘncia, peso, penas, pĂȘlos, tĂȘm de tudo quanto se lhes foi agregando de tanto rolar pelo rio, de tanto transmigrar de pĂĄtria, de tanto serem raĂ­zes… SĂŁo antiquĂ­ssimas e recentĂ­ssimas… Vivem no fĂ©retro escondido e na flor que desponta…

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