É Virtude Dissimular a Virtude

– Vede, caro Roberto, o senhor de Salazar nĂŁo diz que o sensato deve simular. Sugere-vos, se bem entendi, que deve aprender a dissimular. Simula-se o que nĂŁo se Ă©, dissimula-se o que se Ă©. Se vos gabardes do que nĂŁo fizestes, sois um simulador. Mas se evitardes, sem fazĂȘ-lo notar, mostrar em pleno o que fizestes, entĂŁo dissimulais. É virtude acima de todas as virtudes dissimular a virtude. O senhor de Salazar estĂĄ a ensinar-vos um modo prudente de ser virtuoso, ou de ser virtuoso de acordo com a prudĂȘncia. Desde que o primeiro homem abriu os olhos e soube que estava nu, procurou cobrir-se atĂ© Ă  vista do seu Fazedor: assim a diligĂȘncia no esconder quase nasceu com o prĂłprio mundo. Dissimular Ă© estender um vĂ©u composto de trevas honestas, do qual nĂŁo se forma o falso mas sim dĂĄ algum repouso ao verdadeiro.
A rosa parece bela porque à primeira vista dissimula ser coisa tão caduca, e embora da beleza mortal costume dizer-se que não parece coisa terrena, ela não é mais do que um cadåver dissimulado pelo favor da idade. Nesta vida nem sempre se deve ser de coração aberto, e as verdades que mais nos importam dizem-se sempre até meio.

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