Textos sobre Superiores de Friedrich Nietzsche

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Textos de superiores de Friedrich Nietzsche. Leia este e outros textos de Friedrich Nietzsche em Poetris.

A Inquietação Moderna

Em direcção a oeste, a movimentação moderna torna-se cada vez maior, de modo que, para os Americanos, os habitantes da Europa na sua totalidade se apresentam como seres que gostam do sossego e dele usufruem, quando estes mesmos, no entanto, voam em confusão como abelhas e vespas. Esta movimentação torna-se tão grande que a cultura superior já não pode madurar os seus frutos; é como se as estações do ano se seguissem umas às outras demasiado depressa. Por falta de sossego, a nossa civilização vai dar a uma nova barbárie. Em nenhuma época, os activos, ou seja, os irrequietos, foram tão considerados. Reforçar em grande medida o elemento contemplativo faz parte, por conseguinte, das necessárias correcções que se tem de efectuar no carácter da humanidade. No entanto, desde já, cada indivíduo, que seja calmo e constante de coração e de cabeça, tem o direito de crer que possui não só um bom temperamento, mas também uma virtude de utilidade geral e que, ao conservar essa atitude, até cumpre uma missão superior.

Dificultar Equivale a Facilitar e Inversamente

Muita coisa, que em certas fases do homem lhe dificulta a vida, serve, numa fase superior, para lha facilitar, porque esses homens aprenderam a conhecer maiores complicações da vida. O inverso sucede igualmente: é assim, por exemplo, que a religião tem um duplo rosto, conforme uma pessoa ergue para ela o olhar, para que ela o livre da sua cruz e das suas penas, ou baixa para ela o olhar como para as cadeias que lhe foram postas, a fim de que não suba pelos ares demasiado alto.

O Defeito dos Homens Activos

Aos activos falta, habitualmente, a actividade superior: refiro-me à individual. Eles são activos enquanto funcionários, comerciantes, eruditos, isto é, como seres genéricos, mas não enquanto pessoas perfeitamente individualizadas e únicas; neste aspecto, são indolentes. A infelicidade das pessoas activas é a sua actividade ser quase sempre um tanto absurda. Não se pode, por exemplo, perguntar ao banqueiro, que junta dinheiro, qual o objectivo da sua incansável actividade: ela é irracional. Os homens activos rebolam como rebola a pedra, em conformidade com a estupidez da mecânica. Todos os homens se dividem, como em todos os tempos também ainda actualmente, em escravos e livres; pois quem não tiver para si dois terços do seu dia é um escravo, seja ele, de resto, o que quiser: político, comerciante, funcionário, erudito.

Felicidade e Cultura

A visão das imediações da nossa infância comove-nos: a casa de campo, a igreja com as sepulturas, a lagoa e o bosque… é sempre com padecimento que voltamos a ver isso. Apodera-se de nós a compaixão para com nós próprios, pois por que sofrimentos não passámos, desde então! E ali continua a estar tudo tão calmo, tão eterno: só nós estamos mudados, tão agitados; até tornamos a encontrar algumas pessoas, nas quais o tempo não meteu dente mais do que num carvalho: camponeses, pescadores, habitantes da floresta… são os mesmos. Comoção, compaixão consigo próprio, à vista da cultura inferior, é sinal de cultura superior; donde se conclui que, por intermédio desta, a felicidade, em todo o caso, não foi acrescida. Justamente, quem quiser colher da vida felicidade e deleite só tem que se desviar sempre da cultura superior.

Amor e Justiça

Porque é que se sobrestima o amor em detrimento da justiça e se diz dele as coisas mais lindas, como se ele fosse uma entidade muito superior àquela? Pois não é ele visivelmente mais estúpido que aquela? Por certo, mas, precisamente por isso, tanto mais agradável para todos. Ele é estúpido e possui uma rica cornucópia; tira desta os seus presentes e distribui-os a qualquer pessoa, mesmo que esta não os mereça e até nem sequer lhe agradeça por isso. É imparcial como a chuva, a qual, segundo a Bíblia e a experiência, não só encharca o injusto até aos ossos, mas também, em determinadas circunstâncias, o justo.

A Comédia do Ambicioso

Um homem que aspira a coisas grandes considera todo aquele que encontra no seu caminho, ou como meio, ou como retardamento e impedimento, – ou como um leito de repouso passageiro. A sua “bondade” para com os outros, que o caracteriza e que é superior, só é possível quando ele atinge o seu máximo e domina. A impaciência e a sua consciência de, até aqui, estar sempre condenado à comédia – pois mesmo a guerra é uma comédia e encobre, como qualquer meio encobre o fim -, estraga-lhe todo o convívio: esta espécie de homem conhece a solidão e o que ela tem de mais venenoso.

Ser Religioso com Vantagem

Há pessoas sóbrias e industriosas, em quem a religião está bordada como uma ourela de humanidade superior: essas fazem muito bem em continuar a ser religiosas, isso embeleza-as. Todas as pessoas, que não entendem de um qualquer ofício relacionado com armas – incluindo nas armas a boca e a pena – tornam-se servis: para essa gente, a religião cristã é muito útil, pois o servilismo toma, assim, a aparência de uma virtude cristã e fica espantosamente embelezado. Pessoas, a quem a sua vida quotidiana parece demasiado vazia e monótona, tornam-se facilmente religiosas: isso é compreensível e perdoável; simplesmente, elas não têm direito de exigir religiosidade daqueles para quem a vida quotidiana não decorre vazia e monótona.

Retrocesso Civilizacional

São talvez as prioridades dos nossos tempos que acarretam um retrocesso e uma eventual depreciação da vida contemplativa. Mas há que confessar que a nossa época é pobre em grandes moralistas, que Pascal, Epicteto, Séneca, Plutarco pouco são lidos ainda, que o trabalho e o esforço – outrora, no séquito da grande deusa Saúde – parecem, por vezes, grassar como uma doença. Porque faltam tempo para pensar e sossego no pensar, já não se examina as opiniões diferentes: a gente contenta-se em odiá-las. Dada a enorme aceleração da vida, o espírito e o olhar são acostumados a ver e a julgar parcial ou erradamente, e toda a gente se assemelha aos viajantes que ficam a conhecer um país e um povo, vendo-os do caminho-de-ferro.
Uma atitude independente e cautelosa em matéria de conhecimento é menosprezada quase como uma espécie de tolice, o espírito livre é difamado, nomeadamente, por eruditos que, na sua arte de observar as coisas, sentem a falta da minúcia e do zelo de formigas que lhes são próprios, e bem gostariam de bani-lo para um canto isolado da ciência: quando ele tem a missão, completamente diferente e superior, de comandar, a partir de uma posição solitária,

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O Homem Cruel

Quando o rico ti­ra um pertence ao pobre (por exemplo, um príncipe que tira a amante ao plebeu), então gera-se um erro no pobre; este acha que aquele tem de ser absoluta­mente infame, para lhe tirar o pouco que ele tem. Mas aquele não sente de modo algum tão profunda­mente o valor de um único pertence, porque está ha­bituado a ter muitos: portanto, não se pode trans­por para o espírito do pobre e não comete tal uma injustiça tão grande como este julga. Ambos têm um do outro uma concepção errada. A injustiça do poderoso, a que mais indigna na História, não é as­sim tão grande como parece. O mero sentimento hereditário de ser um ser superior, com direitos su­periores, torna uma pessoa bastante fria e deixa-lhe a consciência tranquila: até todos nós, se a distância entre nós e um outro ente for muito grande, já não sentimos absolutamente nada de injusto e matamos um mosquito, por exemplo, sem qualquer remorso.
Assim, não é sinal de maldade em Xerxes (a quem mesmo todos os Gregos descrevem como eminente­mente nobre) quando ele tira a um pai o seu filho e o manda esquartejar, porque este havia manifestado uma inquieta e ominosa desconfiança em relação a toda a expedição militar: neste caso,

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