Deus Ă© o Ășnico ser que, para reinar, nem precisa existir.
Passagens de Charles Baudelaire
112 resultadosPerfume ExĂłtico
Quando eu a dormitar, num Ăntimo abandono,
Respiro o doce olor do teu colo abrasante,
Vejo desenrolar paisagem deslumbrante
Na aurĂ©ola de luz d’um triste sol de outono;Um Ă©den terreal, uma indolente ilha
Com plantas tropicais e frutos saborosos;
Onde hĂĄ homens gentis, fortes e vigorosos,
E mulher’s cujo olhar honesto maravilha.Conduz-me o teu perfume Ă s paragens mais belas;
Vejo um porto ideal cheio de caravelas
Vindas de percorrer paĂses estrangeiros;E o perfume subtil do verde tamarindo,
Que circula no ar e que eu vou exaurindo,
Vem juntar-se em minh’alma Ă voz dos marinheiros.Tradução de Delfim GuimarĂŁes
Que é o amor? A necessidade de sair de si. O homem é um animal adorador Adorar é sacrificar-se e prostituir-se Assim, todo amor é prostituição.
A MĂșsica
A mĂșsica p’ra mim tem seduçÔes de oceano!
Quantas vezes procuro navegar,
Sobre um dorso brumoso, a vela a todo o pano,
Minha pålida estrela a demandar!O peito saliente, os pulmÔes distendidos
Como o rijo velame d’um navio,
Intento desvendar os reinos escondidos
Sob o manto da noite escuro e frio;Sinto vibrar em mim todas as comoçÔes
D’um navio que sulca o vasto mar;
Chuvas temporais, ciclones, convulsĂ”esConseguem a minh’alma acalentar.
â Mas quando reina a paz, quando a bonança impera,
Que desespero horrĂvel me exaspera!Tradução de Delfim GuimarĂŁes
Valorize acima de tudo o amor que vocĂȘ recebe. Ele continuarĂĄ a existir muito depois do seu ouro e da sua saĂșde terem acabado.
A Teodoro de Banville
De tal modo agarraste a Deusa pela crina,
Com ar dominador, num gesto sacudido
Que se alguém presencia o caso acontecido
Poderia julgar-te um rufiĂŁo de esquina.Com o lĂmpido olhar, â precoce e ardente vista,
Audaz, vais expandido o orgulho de arquitecto
Em nobres produçÔes, de traço tão correcto,
Que deixam futurar um prodigioso artista.O nosso sangue, Poeta, esvai-se dia a dia!…
Acaso, do Centauro, a tĂșnica sombria,
â Que, fĂșnebres caudais as velas transformava âTrĂȘs vezes se tingiu com as barbas subtis
D’aqueles infernais, monstruosos, rĂ©pteis,
Que Hércules, em crença, a rir, estrangulava?Tradução de Delfim Guimarães
NĂŁo podendo suportar o amor, a Igreja quis ao menos desinfectĂĄ-lo, e entĂŁo fez o casamento.
Tout homme bien portant peut se passer de manger pendant deux jours – de poĂ©sie, jamais!
A Vida Anterior
Longos anos vivi sob um pĂłrtico alto
De gigantes pilares, nobres, dominadores,
Que a luz, vinda do mar, esmaltava de cores,
Tornando-o semelhante às grutas de basalto.Chegavam até mim os ecos da harmonia
Do orfeĂŁo colossal das ondas chamejantes,
Ligando a sua voz Ă s tintas deslumbrantes
Da luz crepuscular que em meus olhos fugia.Em meio do esplendor do céu, do mar, dos lumes,
Foi-me dado gozar, voluptuosas calmas!
Escravos seminus, rescendendo perfumes,Minha fronte febril refrescavam com palmas,
E tinham por missĂŁo apenas descobrir
A misteriosa dor que eu andava a carpirTradução de Delfim Guimarães
Spleen
Quando o cinzento céu, como pesada tampa,
Carrega sobre nĂłs, e nossa alma atormenta,
E a sua fria cor sobre a terra se estampa,
O dia transformado em noite pardacenta;Quando se muda a terra em hĂșmida enxovia
D’onde a Esperança, qual morcego espavorido,
Foge, roçando ao muro a sua asa sombria,
Com a cabeça a dar no tecto apodrecido;Quando a chuva, caindo a cùntaros, parece
D’uma prisĂŁo enorme os sinistros varĂ”es,
E em nossa mente em frebre a aranha fia e tece,
Com paciente labor, fantĂĄsticas visĂ”es,– Ouve-se o bimbalhar dos sinos retumbantes,
Lançando para os céus um brado furibundo,
Como os doridos ais de espĂritos errantes
Que a chorrar e a carpir se arrastam pelo mundo;Soturnos funerais deslizam tristemente
Em minh’alma sombria. A sucumbida Esp’rança,
Lamenta-se, chorando; e a AngĂșstia, cruelmente,
Seu negro pavilhão sobre os meus ombros lança!Tradução de Delfim Guimarães
Que demĂŽnio benĂ©volo Ă© esse que me deixou assim envolto em mistĂ©rio, em silĂȘncio, em paz e perfumes?
O mais irritante no amor Ă© que se trata do tipo de crime que exige um cĂșmplice.