Conceitos de Perfeição
Nasce o ideal da nossa consciência da imperfeição da vida. Tantos, portanto, serão os ideais possíveis, quantos forem os modos por que é possível ter a vida por imperfeita. A cada modo de a ter por imperfeita corresponderá, por contraste e semelhança, um conceito de perfeição. É a esse conceito de perfeição que se dá o nome de ideal.
Por muitas que pareça que devem ser as maneiras por que se pode ter a vida por imperfeita, elas são, fundamentalmente, apenas três. Com efeito, há só três conceitos possíveis de imperfeição, e, portanto, da perfeição que se lhe opõe.Podemos ter qualquer coisa por imperfeita simplesmente por ela ser imperfeita; é a imperfeição que imputamos a um artefacto mal fabricado. Podemos, por contra, tê-la por imperfeita porque a imperfeição resida, não na realização, senão na essência. Será quantitativa ou qualitativa a diferença entre a essência dessa coisa imperfeita e a essência do que consideramos perfeição; quantitativa como se disséssemos da noite, comparando-a ao dia, que é imperfeita porque é menos clara; qualitativa como se, no mesmo caso, disséssemos que a noite é imperfeita porque é o contrário do dia.
Pelo primeiro destes critérios, aplicando-o ao conjunto da vida,
Passagens sobre Efeito
387 resultadosArrependimento Imoral
O homem a quem o arrependimento, após o pecado, impõe grandes exigências morais, expõe-se à acusação de ter tornado a sua tarefa demasiado fácil. Não praticou o que é essencial na moral, a renúncia; com efeito, o comportamento
moral ao longo da vida é exigido em função dos interesses práticos da humanidade. O homem citado recorda-nos os bárbaros das grandes ondas migradoras, que matavam e depois faziam penitência, e para os quais fazer penitência acabou por se tornar uma técnica facilitadora do assassínio.
A glória, como a luz, é mais útil aos que lhe sentem os efeitos, do que aos que dela são revestidos.
O Amor não se Pode Definir
O amor não se pode definir; e talvez que esta seja a sua melhor definição. Sendo em nós limitado o modo de explicar, é infinito o modo de sentir; por isso nem tudo o que se sabe sentir, se sabe dizer: o gosto, e a dor, não se podem reduzir a palavras. O amor não só tem ocupado, e há-de ocupar o coração dos homens, mas também os seus discursos; porém por mais que a imaginação se esforce, tudo o que produzir a respeito do amor, são átomos. Os que amam não têm livre o espírito para dizerem o que sentem; e sempre acham que o que sentem é mais do que o que dizem; o mesmo amor entorpece a ideia e lhes serve de embaraço: os que não amam, mal podem discorrer sobre uma impressão, que ignoram; os que amaram são como a cinza fria, donde só se reconhece o efeito da chama, e não a sua natureza; ou também como o cometa, que depois de girar a esfera, sem deixar vestígio algum, desaparece.
Ter firmeza de carácter, é havermos sofrido o efeito dos outros sobre nós próprios.
O Leitor Ideal
O grande sonho de todo o escritor – se o tiver – será o de nunca encontrar o leitor «ideal». Porque se o encontrasse, a sua obra morreria aí. Cada leitor, com efeito, recria a obra que lê; e a perpetuidade de uma obra significará a sua perpétua recriação. Uma obra é o que é, mais o que dela foram fazendo os seus leitores. Um «leitor» ideal seria o que esgotasse todas as possiblidades dessa obra. Que haveria a fazer dela depois? Mas como conceber mesmo um leitor «ideal»? Pobre é a obra cujas virtualidades o seu autor conhece antecipadamente. Eis porque é banal dizer-se por exemplo que um Sófocles ficaria surpreendido se soubesse o que nós hoje lemos na sua obra. É que essa obra, porque é grande, necessariamente o excedeu.
O passado, é infinitamente mais estável do que o presente. Em consequência os seus efeitos são muito maiores.