Passagens de Arthur Schnitzler

22 resultados
Frases, pensamentos e outras passagens de Arthur Schnitzler para ler e compartilhar. Os melhores escritores estão em Poetris.

Na maior parte das vezes, uma ideia nova não passa duma banalidade, velha como o mundo, de cuja realidade nos apercebemos subitamente.

O Ódio liga mais os Indivíduos que a Amizade

O ódio, a inveja e o desejo de vingança ligam muitas vezes mais dois indivíduos um ao outro do que o podem fazer o amor e a amizade. Pois está em causa a comunidade de interesses interiores ou exteriores e a alegria que se sente nessa comunidade – onde é muitas vezes determinada a essência das relações positivas entre os indivíduos: o amor e a amizade – é sempre relativa e não é em nenhum caso um estado de alma permanente; mas as relações negativas, essas são, a maior parte das vezes, absolutas e constantes. O ódio, a inveja e o desejo de vingança têm, poder-se-ia dizer, o sono mais ligeiro do que o amor. O menor sopro os desperta, enquanto que o amor e a amizade continuam tranquilamente a dormir, mesmo sob o trovão e os relâmpagos.

A Alma Dominada pela Solidão

Se protegerdes com demasiada devoção o jardin secret da tua alma, ele pode facilmente começar a florescer de um modo excessivamente luxuriante, transbordar para além do espaço que lhe estava reservado e tomar mesmo pouco a pouco posse da tua alma de domínios que não estavam destinados a permanecer secretos. E é possível que toda a tua alma acabe por se tornar um jardim bem fechado, e que no meio de todas as suas flores e dos seus perfumes ela sucumba à sua solidão.

Apreciação Imparcial

Há poucos indivíduos a quem é dado contemplar uma obra de arte como espectadores tranquilos; mas é difícil encontrar um que seja capaz ou tenha a vontade, ao mesmo tempo que deixa a obra penetrá-lo, e escuta as suas impressões ou as palavras de outro, de permanecer simples observador. Sem se dar conta disso, torna-se crítico, procurando mostrar a sua força de juízo, exercer o seu humor e avaliar a sua própria pessoa.
O ingénuo fá-lo inicialmente, é certo, sem a menor intenção malévola; mas mesmo nele, as propriedades naturais do indivíduo não tardam a impôr os seus direitos – vaidade e pedantice, desejo de ser superior aos seus próprios olhos e aos olhos dos outros – de tal modo que depressa estará mais decidido a desvelar as fraquezas de uma obra do que a aceitar os seus lados positivos.

A Obra e o Eco da Obra

São complementares, não a obra e a crítica, mas a obra e o eco da obra. E o crítico é apenas uma forma de eco entre outras; certamente é em geral a mais forte, mas raramente é a mais pura e é sempre aquela que se apaga mais depressa.
Sobretudo nem uma palavra, caro autor – nenhuma resposta! A única que podes opor a todos os ataques, já a pronunciaste: – a tua obra. Se ela perdurar, venceste.

A Verdade por si Mesma não Tem nenhum Valor

Há uma coisa mais dolorosa do que nunca poder ouvir a verdade – é nunca poder exprimi-la, mesmo com a melhor vontade do mundo. Porque o que quer que digamos, o outro não escuta nunca a verdade que lhe queremos transmitir. Aquilo que sai dos nossos lábios e o que se passa na alma do outro, são sempre duas coisas diferentes. No instante seguinte deixa de ser semelhante – isso depende de tantas coisas que nada tinham a ver com a tua verdade e a tua vontade de verdade – isso depende do que o outro queria ouvir, da situação em relação a ti, etc…
E a verdade por si mesma não tem nenhum valor, é como uma moeda num país onde não é corrente.

Somos Todos Corruptíveis

A faculdade de se deixar corromper no sentido mais amplo do termo é uma particularidade da espécie humana em geral; mais ainda, as relações entre os homens só são possíveis porque somos todos corruptíveis em maior ou menor grau. Cada vez que dependemos do amor, da benevolência, da simpatia ou simplesmente da delicadeza, estamos já no fundo corrompidos, e o nosso juízo nunca é, por isso, verdadeiramente objectivo; e ele é-o tanto menos quanto nos esforçamos por permanecer incorruptíveis.
A corruptibilidade está longe de se limitar à estrita relação de pessoa a pessoa; uma obra, uma acção, um gesto pode lisonjear-nos confirmando o nosso amor próprio, as nossas opiniões ou a nossa impressão sobre o mundo.
É apenas quando utilizamos conscientemente a corruptibilidade dos outros para nossa vantagem pessoal ou em detrimento de um terceiro, que ela é um mal, mas a falta é então mais nossa do que daquele cuja corruptibilidade nos beneficia.

Os Piores Inimigos

Os teus piores inimigos não são de modo nenhum aqueles que têm um ponto de vista diferente do teu; são, pelo contrário, aqueles que têm o mesmo mas que, por diversos motivos, prudência, desejo de ter razão, cobardia, estão impedidos de a ele aderir.

Todos nós Somos Crentes

Todos os homens da terra estão conscientes do infinito e da eternidade. A única diferença que existe entre eles é saber até que ponto essa consciência abala cada indivíduo considerado isoladamente. Um acredita num deus pessoal acima das coisas e dos homens, o outro acredita no seu próprio querer como no seu deus, uns são humildes, outros revoltam-se, e todos, seja qual for o comportamento individual de cada um – todos são crentes.

O Desejo de Discutir

Se as discussões políticas se tornam facilmente inúteis, é porque quando se fala de um país se pensa tanto no seu governo como na sua população, tanto no Estado como na noção de Estado enquanto tal. Pois o Estado como noção é uma coisa diferente da população que o compõe, igualmente diferente do governo que o dirige. É qualquer coisa a meio caminho entre o físico e o metafísico, entre a realidade e a ideia.
È a esse género de estirilidade que estão geralmente condenadas, tal como acontece com as discussões políticas, as que incidem sobre a religião, pois a religião pode ser sinónima de dogmas, ou de ritual, ou referir-se a posições pessoais do indivíduo sobre questões ditas eternas, o infinito e a eternidade, problemas do livre arbítrio e da responsabilidade ou, como se diz também: Deus.
E o mesmo acontece com as discussões que têm a ver com a maior parte dos assuntos abstractos, sobretudo a ética e os temas filosóficos, mas também com campos de análise mais restritos, incidindo sobre os problemas mais imediatos, como por exemplo o socialismo, o capitalismo, a aristocracia, a democracia, etc…, em que as noções são tomadas tanto no sentido amplo como no restrito,

Continue lendo…

Empatia com as Fraquezas

A admiração que um discípulo deve ao seu mestre oculta muitas vezes, e nem sempre de modo consciente, uma certa satisfação sentida pela observação das suas fraquezas, pelas quais ele se lhe sente ligado, justificado nas próprias fraquezas e dispensado de produzir qualquer outra prova legitimando a sua ligação.

Liberdade Ilusória

A forma é sempre ausência de liberdade, mesmo quando é desejada. Por isso, em nenhuma forma de Estado, mesmo na aparentemente mais livre, a noção filosófica ou mesmo política de liberdade pode ser transposta para a realidade. Em si, pois, a república é tão pouco sinónima de liberdade como a monarquia – mesmo absoluta – é sinónimo de falta de liberdade. A diferença entre as formas de Estado reside sempre no ritual, e o ritual é sempre determinado, em última análise, pela personalidade daquele que está no cimo (quer seja imperador ou presidente).

Estabelecer Princípios

Existem pessoas que têm propensão para modelar a sua vida de acordo com princípios definidos, – e outras que gostam de forjar os seus princípios de acordo com os acasos do seu destino pessoal. Em ambos os casos trata-se apenas de experimentar tornar a vida o mais cómoda possível, quando o importante é, apesar de tudo, enfrentar cada acontecimento, desembaraçado de qualquer preconceito e prevenção, mesmo correndo o risco de um constante extravio.

Apenas Conhecemos Fragmentos dos Outros

Quando te encontras na base de um importante maciço montanhoso, estás longe de conhecer toda a sua diversidade, não tens nenhuma ideia das alturas que se ergueram por trás do seu cimo ou por trás daquele que te parece ser o cimo, não suspeitas nem o perigo dos abismos nem os confortáveis assentos ocultos entre os rochedos. É apenas se sobes e se persegues o teu caminho que se revelam pouco a pouco a teus olhos os segredos da montanha, alguns que esperavas, outros que te surpreendem, uns essenciais, outros insignificantes, tudo isso sempre e unicamente em função da direcção que tomares; e nunca te revelarão todas.
O mesmo acontece quando te encontras diante de uma alma humana.
Aquilo que se te oferece ao primeiro olhar, por mais perto que estejas, está longe de ser a verdade e certamente nunca é toda a verdade. É apenas no decurso do caminho, quando os teus olhos se tornam mais penetrantes e nenhuma bruma perturba o teu olhar, que a natureza íntima dessa alma se revela a pouco a pouco e sempre por fragmentos. Aqui é a mesma coisa: à medida que te afastas da zona explorada, toda a diversidade que encontraste no caminho se esbate como um sonho,

Continue lendo…

Um Certo Grau de Vida

Quando atingimos um certo grau da vida, da experiência e do conhecimento dos homens, toda a relação, mesmo com os mais avisados e os mais amáveis dos nossos amigos, quase não vale mais do que pela atmosfera que a envolve, e todas as nossas conversas, mesmo aquelas que se dizem profundas, já não são capazes de nos dar riqueza e felicidade no plano intelectual, mas unicamente de um modo quase melódico ou musical.

Mais Vale Mostrar Talento que Bom Humor

O talento de um indivíduo reconcilia-nos muitas vezes com aquilo que pode haver de discutível no seu carácter, quando não temos de lhe suportar pessoalmente os efeitos. Mas nunca o humor agradável de alguém nos tornará indulgentes para com a sua falta de talento.

A humanidade tem o ouvido concebido de tal forma que ela continua a dormir quando o barulho retumba e só acorda com o eco.

Influências Negativas do Passado

Que um acontecimento projecte a sua sombra no futuro é um processo regular que devemos aceitar como tal; mais grave é o acontecimento que lança uma sombra sobre o passado, mergulhando numa obscuridade súbita fragmentos da vida que se encontravam na luz e haviam por muito tempo conservado o seu brilho.

O Melhor Motivo para Criar Arte

No artista criador, qualquer produção deve estar marcada com o cunho da necessidade, caso contrário, é desviada no sentido exacto do termo. Naquele que cria por imitação e se prende em todo o caso ao efeito do instante, esse elemento de necessidade interior pode ser também substituído por um outro: a rotina, a ambição, o desejo de causar efeito.