* Vão para o diabo sem mim, ou deixem-me ir sozinho para o diabo! Para que haveremos de ir juntos?
Passagens de Fernando Pessoa
1382 resultadosUma criatura de nervos modernos, de inteligência sem cortinas, de sensibilidade acordada, tem a obrigação cerebral de mudar de opinião e de certeza várias vezes no mesmo dia.
Toda a acção é incompleta e imperfeita. O poema que eu sonho não tem falhas senão quando tento realizá-lo.
Tão cansado de ter achado como de não ter achado. O fim e a soma do que somos, já o Pregador o disse: vaidade e aflição de ânimo.
Pertenço àquela espécie de homens que estão sempre na margem daquilo a que pertencem, nem veem só a multidão de que são, senão também os grandes espaços que há ao lado.
Citar é ser injusto. Enumerar é esquecer. Não quero esquecer ninguém de quem não me lembre.
Outrora eu era daqui, e hoje regresso estrangeiro, Forasteiro do que vejo e ouço, velho de mim. Já vi tudo, ainda o que nunca vi, nem o que nunca verei. Eu reinei no que nunca fui.
O amor é um sonho que chega para o pouco ser que se é.
Abdicar do fim procriativo do amor, sem abdicar do meio voluptuoso, é impróprio de um superior.
Quem Pensa, Ri
Quem raciocina com intensidade e violência tem que expressar com descongestionamento. Rir não é não ter razão. Não há relação entre a solenidade e a verdade. Deixemos a seriedade aos que têm ideais em que perdem tempo e jeito. Pensemos, e acabemos de pensar com uma gargalhada.
A dor do mundo é grande? Talvez seja. Como não há metro para ela, não sabemos. Mas, ainda que seja grande, curar-se-á aumentando-a com a nossa?
Pensa a sério mas não com sério. Pensa profundamente, mas não às escuras. Quer fortemente, mas não com as sobrancelhas.
Sinceros? Quantos gramas de verdade é que a vossa sinceridade pesa?
Quem pensa, ri; só não ri quem só faz cara que pensa.
Ri, bruto!
É claro que o português, com a sua tendência para ser tudo, forçosamente havia de ser nada de todas as maneiras possíveis.
Os outros não são para nós mais que paisagem, e, quase sempre, paisagem invisível de rua desconhecida.
As Três Espécies de Portugueses
Há três espécies de Portugal, dentro do mesmo Portugal; ou, se se preferir, há três espécies de português. Um começou com a nacionalidade: é o português típico, que forma o fundo da nação e o da sua expansão numérica, trabalhando obscura e modestamente em Portugal e por toda a parte de todas as partes do Mundo. Este português encontra-se, desde 1578, divorciado de todos os governos e abandonado por todos. Existe porque existe, e é por isso que a nação existe também.
Outro é o português que o não é. Começou com a invasão mental estrangeira, que data, com verdade possível, do tempo do Marquês de Pombal. Esta invasão agravou-se com o Constitucionalismo, e tornou-se completa com a República. Este português (que é o que forma grande parte das classes médias superiores, certa parte do povo, e quase toda a gente das classes dirigentes) é o que governa o país. Está completamente divorciado do país que governa. É, por sua vontade, parisiense e moderno. Contra sua vontade, é estúpido.
Há um terceiro português, que começou a existir quando Portugal, por alturas de El-Rei D. Dinis, começou, de Nação, a esboçar-se Império. Esse português fez as Descobertas,
Cada dia da minha vida é o dia mais infeliz da minha vida. Cada sonho é o sonho mais belo que eu tive.
Quero aceitar menos, indagar mais, ousar mais. E o resto que venha se vier, ou tiver que vir, ou não venha.
Uma ficção é um erro relativo. Um erro é uma ficção absoluta.
E subia-nos o choro à lembrança, porque nem aqui, ao sermos felizes, o éramos…
Nada vale a pena, ó meu amor longínquo, senão o saber como é suave saber que nada vale a pena…
Ela Ia, Tranquila Pastorinha
Ela ia, tranquila pastorinha,
Pela estrada da minha imperfeição.
Segui-a, como um gesto de perdão,
O seu rebanho, a saudade minha…“Em longes terras hás de ser rainha”
Um dia lhe disseram, mas em vão…
Seu vulto perde-se na escuridão…
Só sua sombra ante meus pés caminha…Deus te dê lírios em vez desta hora,
E em terras longe do que eu hoje sinto
Serás, rainha não, mas só pastoraSó sempre a mesma pastorinha a ir,
E eu serei teu regresso, esse indistinto
Abismo entre o meu sonho e o meu porvir…
A coragem que vence o medo tem mais elementos de grandeza que aquela que o não tem. Uma começa interiormente; outra é puramente exterior. A última faz frente ao perigo; a primeira faz frente, antes de tudo, ao próprio temor dentro da sua alma.