Poemas sobre Asas de Guerra Junqueiro

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Poemas de asas de Guerra Junqueiro. Leia este e outros poemas de Guerra Junqueiro em Poetris.

O Amor

I

Eu nunca naveguei, pieguĂ­ssimo argonauta
Dans les fleuves du tendre, onde há naufrágios bons,
Conduzindo Florian na tolda a tocar frauta,
E cupidinhos d’oiro a tasquinhar bombons.
Nunca ninguém me viu de capa à trovador,
Às horas em que está já Menelau deitado,
A tanger o arrabil sob os balcões em flor
Dos castelos feudais de papelĂŁo doirado.
NĂŁo canto de Anfitrite as vaporosas fraldas,
(Eu nĂŁo quero com isto, Ăł VĂ©nus, descompor-te)
Nem costumo almoçar c’roado de grinaldas,
Nem nunca pastoreei enfim, vestido Ă  corte,
De bordão de cristal e punhos de Alençon,
Borreguinhos de neve a tosar esmeraldas
Num lameiro qualquer de qualquer Trianon.
Eu não bebo ambrósia em taças cristalinas,
Bebo um vinho qualquer do Douro ou de Bucelas,
Nem vou interrogar as folhas das boninas,
Para saber o amor, o tal amor das Elas.
NĂŁo visto da poesia a tĂşnica inconsĂştil,
Pela simples razĂŁo, sob o pretexto fĂştil
De ter visto passar na rua uns pés bonitos;
Nem do meu coração eu fiz um paliteiro,
Onde venha o amor cravar os seus palitos.

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Carta (a um Amigo que me Pediu Versos)

Como hei-de ser um Petrarca,
Cantar como um rouxinol,
Se o meu termĂłmetro marca
Quarenta e dois graus ao sol!

Da lira bárbara e tosca
Nem saem trovas d’Alfama.
Enxota o PĂ©gaso a mosca,
E eu durmo a sesta na cama.

A hipocondria maciça
Conduzo-a, não há remédio,
Na jumenta da preguiça
Pelas charnecas do tédio.

Eu trago a inspiração oca,
Ando abatido, ando mono;
Meus versos abrem a boca,
Como os porteiros com sono.

NĂŁo tenho a rima imprevista,
Os guizos d’oiro ou de opala,
Que Ă  asa da estrofe o artista
Sublime prende ao largá-la.

P’ra lapidar Ă  vontade
Um belo verso radiante,
Falta-me a tenacidade,
Que Ă© como o pĂł do diamante.

A musa foi-se-me embora;
Para onde foi nem me lembro;
SĂł a torno a ver agora
Lá para os fins de Setembro.

Anda talvez nas florestas
Fazendo orgias pagĂŁs,
Entre os aromas das giestas
E os braços dos Egipãs.

Deixá-la andar lá dois meses
Colhendo imagens e flores,

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A Minha Filha

(Vendo-a dormir)

Que alma intacta e delicada!
Que argila pura e mimosa!
É a estrela d’alvorada
Dentro dum botĂŁo de rosa!

E, enquanto dormes tranquila,
Vejo o divino esplendor
Da alma a sair da argila,
Da estrela a sair da flor!

Anjos, no azul inocente,
Sobre o teu hálito leve
Desdobram candidamente,
Em pálio, as asas de neve…

E eu, urze má das encostas,
Eu sinto o dever sagrado
De te beijar— de mãos postas!
De te abençoar — ajoelhado!

Vendo-a Sorrir

(A minha filha)

Filha, quando sorris, iluminas a casa
Dum celeste esplendor.
A alegria é na infância o que na ave é asa
E perfume na flor.

Ă“ doirada alegria, Ăł virgindade santa
Do sorriso infantil!
Quando o teu lábio ri, filha, a minha alma canta
Todo o poema de Abril.

Ao ver esse sorriso, Ăł filha, se concentro
Em ti o meu olhar,
Engolfa-se-me o céu azul pela alma dentro
Com pombas a voar.

Sou o Sol que agoniza, e tu, meu anjo loiro,
És o Sol que se eleva.
Inunda-me de luz, sorri, polvilha de oiro
O meu manto de treva!

O Primeiro Filho

(Carta ao amigo Bernardo Pindela)

Entre tanta miséria e tantas coisas vis
Deste vil grĂŁo de areia,
Ainda tenho o condĂŁo de me sentir feliz
Com a ventura alheia.

Ă€ minha noite triste, Ă  noite tormentosa,
Onde busco a verdade,
Chegou com asas d’oiro a canção cor-de-rosa
Da tua felicidade.

És pai, viste nascer um fragmento d’aurora
Da tua alma, de ti…
Oh, momento divino em que o sorriso chora,
E em que o pranto sorri!

Que ventura radiante! oh que ventura infinda!
OlĂ­mpicos amores
Ter frutos em Abril com o vergel ainda
Carregado de flores!

Deslumbramento!… ver num berço o teu futuro
Sorrindo ao teu presente!…
Ter a mulher e a mĂŁe: juntar o beijo puro
Com o beijo inocente!…

Eu que vou, javali de flanco ensanguentado,
Pelos rudes caminhos
Ajoelho quando escuto Ă  beira dum valado
Os murmĂşrios dos ninhos!

Em tudo que alvorece há um sorriso d’esperança,
Candura imaculada!…
E quer seja na flor, quer seja na criança
Sente-se a madrugada.

Quando,

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