Poemas sobre Montanhas

54 resultados
Poemas de montanhas escritos por poetas consagrados, filósofos e outros autores famosos. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Timor

Andam lá sem descançar
Nas montanhas a lutar
Iluminam todo o mar
De Timor

Nas montanhas sem dormir
Uma luz a resistir
Arde sem se apagar
Em Timor

Andorinha de asa negra
Se o teu voo lá passar
Faz chegar um grande abraço
Dá saudades a Timor

Eles não podem escrever
Porque vão a combater
Vão de manhã defender
A Timor

As crianças a chorar
Não as posso consolar
Que eu nunca cheguei a ver
A Timor

Andorinha de asa negra
Vem ouvir o meu cantar
Ai que dor rasga o meu peito
Sem notícias de Timor

Nunca mais hei-de voltar
Já não posso lá voltar
À idade de lembrar
A Timor

O Amor

I

Eu nunca naveguei, pieguíssimo argonauta
Dans les fleuves du tendre, onde há naufrágios bons,
Conduzindo Florian na tolda a tocar frauta,
E cupidinhos d’oiro a tasquinhar bombons.
Nunca ninguém me viu de capa à trovador,
Às horas em que está já Menelau deitado,
A tanger o arrabil sob os balcões em flor
Dos castelos feudais de papelão doirado.
Não canto de Anfitrite as vaporosas fraldas,
(Eu não quero com isto, ó Vénus, descompor-te)
Nem costumo almoçar c’roado de grinaldas,
Nem nunca pastoreei enfim, vestido à corte,
De bordão de cristal e punhos de Alençon,
Borreguinhos de neve a tosar esmeraldas
Num lameiro qualquer de qualquer Trianon.
Eu não bebo ambrósia em taças cristalinas,
Bebo um vinho qualquer do Douro ou de Bucelas,
Nem vou interrogar as folhas das boninas,
Para saber o amor, o tal amor das Elas.
Não visto da poesia a túnica inconsútil,
Pela simples razão, sob o pretexto fútil
De ter visto passar na rua uns pés bonitos;
Nem do meu coração eu fiz um paliteiro,
Onde venha o amor cravar os seus palitos.

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Alexandra

Há pequenas aves que têm raízes nas palavras,
essas palavras que não ficam arrumadas com decência
na literatura,
palavras de amantes sem amor, gente que sofre
e a quem falta o ar quando faltam as palavras.
Quando digo o teu nome há uma ave que levanta voo
como se tivesse nascido o dia e uma brisa
encarcerada nas amêndoas se soltasse para a impelir
para o mais frio, para o mais alto, para o mais azul.
Quando volto para casa o teu nome vai comigo
e ao mesmo tempo espera-me já
numa casa construída com dois nomes,
como se tivesse duas frentes,
uma para a montanha e outra para o mar.
Por vezes dou-te o meu nome e fico com o teu,
espreito então pelas janelas de onde
se vêem coisas que nunca antes tinha visto,
coisas que adivinhava mas que não sabia,
coisas que sempre soube mas que nunca quis olhar.
Nessas alturas o meu nome é o teu olhar,
e os meus olhos são justamente a pronúncia do
teu nome que se diz com um pequeno brilho molhado,

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Carta a um «Amor»

Recordo, Margarida, as tardes quando
Cata no Marão o Sol de Julho!
Meu ranchinho de rolas rorolando,
Vós éreis meu orgulho.

O ar como um veludo, os ares tão macios,
Ó tardes do jardim! à fonte da água, aos fios,
íamos todos nós era tão alegre bando
Que desde que eu o não sinto
Sou como um corpo extinto,
Não sinto ora nem quando.

E estar de vós tão longe
Cá neste meu terreno onde pareço um monge,
Sem uma linha, um verso
Desse Corgo sem par, a boa e madre
Terra como outra assim não haverá,
Montanhas que no Céu têm aquase o berço!
Escreve, Margarida, ao teu compadre,
Vá!

Quero que diga
Florinda como vai, e vai assim Loreto,
Lindo pajem, que linda em seu veludo preto!
E os mais amorzinhos, rapariga,
Os que tua amizade aí me deu!

Na alma dum poeta, vê-se nela o céu:
E assim
A tudo, Margarida, o que o prendeu
Arrecada-o na vida, e para a morte.
Escreve mal, e daí,

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Noite Afora

A quem devo dizer que em tua carne
se sobreleva o tempo e o duradouro,
mancha de óleo no azul, alaga e intensifica
o contratempo a que chamei amor?

A quem devo dizer dos meus perigos
quando, o corcel furioso, olhei ao longe
e não vi mais limites que o oceano
nem mais convites que o das ondas frias?

Como antepor o corte nas montanhas
— Liberdade — ao dever que a si mesma impõe a terra
de estender-se conforme o espaço havido?

Malícia do destino, ardil composto outrora…
Arde a grama da noite em que te vais embora,
e essa chama caminha, essa chama, essas vinhas,

essas uvas, cortadas noite afora.

Tão Grande Dor

“Tão grande dor para tão pequeno povo” palavras de um timorense à RTP
Timor fragilíssimo e distante
Do povo e da guerrilha
Evanescente nas brumas da montanha

“Sândalo flor búfalo montanha
Cantos danças ritos
E a pureza dos gestos ancestrais”

Em frente ao pasmo atento das crianças
Assim contava o poeta Rui Cinatti
Sentado no chão
Naquela noite em que voltara da viagem

Timor
Dever que não foi cumprido e que por isso dói

Depois vieram notícias desgarradas
Raras e confusas
Violências mortes crueldade
E anos após ano
Ia crescendo sempre a atrocidade
E dia a dia – espanto prodígio assombro –
Cresceu a valentia
Do povo e da guerrilha
Evanescente nas brumas da montanha

Timor cercado por um bruto silêncio
Mais pesado e mais espesso do que o muro
De Berlim que foi sempre falado
Porque não era um muro mas um cerco
Que por segundo cerco era cercado

O cerco da surdez dos consumistas
Tão cheios de jornais e de notícias

Mas como se fosse o milagre pedido
Pelo rio da prece ao som das balas
As imagens do massacre foram salvas
As imagens romperam os cercos do silêncio
Irromperam nos écrans e os surdos viram
A evidência nua das imagens

A Caridade

Eu podia falar todas as línguas
Dos homens e dos anjos;
Logo que não tivesse caridade,
Já não passava de um metal que tine,
De um sino vão que soa.

Podia ter o dom da profecia,
Saber o mais possível,
Ter fé capaz de transportar montanhas;
Logo que eu não tivesse caridade,
Já não valia nada!

Eu podia gastar toda afortuna
A bem dos miseráveis,
Deixar que me arrojassem vivo às chamas;
Logo que eu não tivesse caridade,
De nada me servia!

A caridade é dócil, é benévola,
Nunca foi invejosa,
Nunca procede temerariamente,
Nunca se ensoberbece!

Não é ambiciosa; não trabalha
Em seu proveito próprio; não se irrita;
Nunca suspeita mal!

Nunca folgou de ver uma injustiça;
Folga com a verdade!

Tolera tudo! Tudo crê e espera!
Em suma tudo sofre!

A Melhor Maneira de Viajar é Sentir

Afinal, a melhor maneira de viajar é sentir.
Sentir tudo de todas as maneiras.
Sentir tudo excessivamente,
Porque todas as coisas são, em verdade, excessivas
E toda a realidade é um excesso, uma violência,
Uma alucinação extraordinariamente nítida
Que vivemos todos em comum com a fúria das almas,
O centro para onde tendem as estranhas forças centrífugas
Que são as psiques humanas no seu acordo de sentidos.

Quanto mais eu sinta, quanto mais eu sinta como várias pessoas,
Quanto mais personalidade eu tiver,
Quanto mais intensamente, estridentemente as tiver,
Quanto mais simultaneamente sentir com todas elas,
Quanto mais unificadamente diverso, dispersadamente atento,
Estiver, sentir, viver, for,
Mais possuirei a existência total do universo,
Mais completo serei pelo espaço inteiro fora.
Mais análogo serei a Deus, seja ele quem for,
Porque, seja ele quem for, com certeza que é Tudo,
E fora d’Ele há só Ele, e Tudo para Ele é pouco.

Cada alma é uma escada para Deus,
Cada alma é um corredor-Universo para Deus,
Cada alma é um rio correndo por margens de Externo
Para Deus e em Deus com um sussurro soturno.

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Arrojos

Se a minha amada um longo olhar me desse
Dos seus olhos que ferem como espadas,
Eu domaria o mar que se enfurece
E escalaria as nuvens rendilhadas.

Se ela deixasse, extático e suspenso
Tomar-lhe as mãos mignonnes e aquecê-las,
Eu com um sopro enorme, um sopro imenso
Apagaria o lume das estrelas.

Se aquela que amo mais que a luz do dia,
Me aniquilasse os males taciturnos,
O brilho dos meus olhos venceria
O clarão dos relâmpagos noturnos.

Se ela quisesse amar, no azul do espaço,
Casando as suas penas com as minhas,
Eu desfaria o Sol como desfaço
As bolas de sabão das criancinhas.

Se a Laura dos meus loucos desvarios
Fosse menos soberba e menos fria,
Eu pararia o curso aos grandes rios
E a terra sob os pés abalaria.

Se aquela por quem já não tenho risos
Me concedesse apenas dois abraços,
Eu subiria aos róseos paraísos
E a Lua afogaria nos meus braços.

Se ela ouvisse os meus cantos moribundos
E os lamentos das cítaras estranhas,

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Elevação

Por cima dos paúes, das montanhas agrestes,
Dos rudes alcantis, das nuvens e do mar,
Muito acima do sol, muito acima do ar,
Para além do confim dos páramos celestes,

Paira o espírito meu com toda a agilidade,
Como um bom nadador, que na água sente gozo,
As penas a agitar, gazil, voluptuoso,
Através das regiões da etérea imensidade.

Eleva o vôo teu longe das montureiras,
Vai-te purificar no éter superior,
E bebe, como um puro e sagrado licor,
A alvinitente luz das límpidas clareiras!

Neste bisonho dai’ de mágoas horrorosas,
Em que o fastio e a dor perseguem o mortal,
Feliz de quem puder, numa ascensão ideal,
Atingir as mansões ridentes, luminosas!

De quem, pela manhã, andorinha veloz,
Aos domínios do céu o pensamento erguer,
— Que paire sobre a vida, e saiba compreender
A linguagem da flor e das coisas sem voz!

Tradução de Delfim Guimarães

Os Vencidos

Tres cavaleiros seguem lentamente
Por uma estrada erma e pedregosa.
Geme o vento na selva rumorosa,
Cae a noite do céo, pesadamente.

Vacilam-lhes nas mãos as armas rotas,
Têm os corceis poentos e abatidos,
Em desalinho trazem os vestidos,
Das feridas lhe cae o sangue, em gotas.

A derrota, traiçoeira e pavorosa,
As fontes lhes curvou, com mão potente.
No horisonte escuro do poente
Destaca-se uma mancha sanguinosa.

E o primeiro dos três, erguendo os braços,
Diz n’um soluço: «Amei e fui amado!
Levou-me uma visão, arrebatado,
Como em carro de luz, pelos espaços!

Com largo vôo, penetrei na esphera
Onde vivem as almas que se adoram,
Livre, contente e bom, como os que moram
Entre os astros, na eterna primavera.

Porque irrompe no azul do puro amor
O sopro do desejo pestilente?
Ai do que um dia recebeu de frente
O seu halito rude e queimador!

A flor rubra e olorosa da paixão
Abre languida ao raio matutino,
Mas seu profundo calix purpurino
Só reçuma veneno e podridão.

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O Amor e o Tempo

Pela montanha alcantilada
Todos quatro em alegre companhia,
O Amor, o Tempo, a minha Amada
E eu subíamos um dia.

Da minha Amada no gentil semblante
Já se viam indícios de cansaço;
O Amor passava-nos adiante
E o Tempo acelerava o passo.

— «Amor! Amor! mais devagar!
Não corras tanto assim, que tão ligeira
Não pode com certeza caminhar
A minha doce companheira!»

Súbito, o Amor e o Tempo, combinados,
Abrem as asas trémulas ao vento…
— «Porque voais assim tão apressados?
Onde vos dirigis?» — Nesse momento,

Volta-se o Amor e diz com azedume:
— «Tende paciência, amigos meus!
Eu sempre tive este costume
De fugir com o Tempo… Adeus! Adeus!

Não Voltarás

não voltarás
olhando as ruas
na vidraça nua os zimbros
da terra ocre

moras secreta nestes barros
tua flauta canta nas montanhas
pedras e trepadeiras se enroscam
perto do teu rosto
e são de
água

sabes plantar o odor
dos frutos
tangerina limão
pássaras orvalho
a nervura das manhãs
e o lume dos poemas
quente metalurgia
das palavras

como ontem (tu eras morta)
prolonga-te nestas mãos
no maio das rotas
de abril
tecidas

Debaixo das Oliveiras

Este foi o mês em que cantei
dentro de minha casa
debaixo
das oliveiras.

O mês em que a brisa me pôs nas mãos
uma harpa de folhas
e a terra me emprestou
sua flauta e sua lua.
Maré viva. Meu sangue atravessado
por um cometa visível a olho nu
tangido por satélites e aves de arribação
navegado por peixes desconhecidos.

Este foi o mês em que cantei
como quem morre e ressuscita
no terceiro dia
de cada sílaba.

O mês em que subi a uma colina
dentro de minha casa
olhei a terra e o mar
depois cantei
como quem faz com duas pedras
o primeiro lume. Palavras
e pedras. Palavras e lume
de uma vida.

Este foi o mês em que fui a um lugar santo
dentro de minha casa.
O mês em que saí dos campos
e me banhei no rio como quem se baptiza
e cantei debaixo das oliveiras
as mãos cheias de terra. Palavras
e terra
de uma vida.

Este foi o mês em que cantei
como quem espelha ao vento suas cinzas
e cresce de seu próprio adubo
carregado de folhas.

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Não Posso Adiar o Amor

Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a minha vida
nem o rneu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

Irmão

Eu não fiz uma revolução.
Mas me fiz irmão de todas as revoluções.
Eu fiquei irmão de muitas coisas no mundo.
Irmão de uma certa camisa.
Uma certa camisa que era de um gesto de céu
e com certo carinho me vestia, como se me
vestisse de árvore e de nuvens.
Eu fiquei irmão de uma vaca, como se ela
também sonhasse. Fiquei irmão de um vira-lata
com o brio com que ele também me abraçava.
Fiquei irmão de um riacho, que é nome
de rio pequeno, um pequeno que cabe
todo dentro de mim, me falando,
me beijando, me lambendo, me lembrando.
Brincava e me envolvia, certos dias eu
girava em torno do redemoinho do cachorro
e do riacho e da vaca, sem às vezes saber
se estava beijando o riacho, o cachorro
ou a vaca, com um grande céu
me entornando, com um grande céu
com a vaca no lombo e com o cão,
com o riacho rindo de nós todos.
Eu fiquei irmão de livros, de gentes.
Eu fiquei irmão de uma certa montanha.

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Rêve Oublié

Neste meu hábito surpreendente de te trazer de costas
neste meu desejo irreflectido de te possuir num trampolim
nesta minha mania de te dar o que tu gostas
e depois esquecer-me irremediavelmente de ti

Agora na superfície da luz a procurar a sombra
agora encostado ao vidro a sonhar a terra
agora a oferecer-te um elefante com uma linda tromba
e depois matar-te e dar-te vida eterna

Continuar a dar tiros e modificar a posição dos astros
continuar a viver até cristalizar entre neve
continuar a contar a lenda duma princesa sueca
e depois fechar a porta para tremermos de medo

Contar a vida pelos dedos e perdê-los
contar um a um os teus cabelos e seguir a estrada
contar as ondas do mar e descobrir-lhes o brilho
e depois contar um a um os teus dedos de fada

Abrir-se a janela para entrarem estrelas
abrir-se a luz para entrarem olhos
abrir-se o tecto para cair um garfo no centro da sala
e depois ruidosa uma dentadura velha
E no CIMO disto tudo uma montanha de ouro

E no FIM disto tudo um Azul-de-Prata.

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Partida

Ao ver escoar-se a vida humanamente
Em suas águas certas, eu hesito,
E detenho-me às vezes na torrente
Das coisas geniais em que medito.

Afronta-me um desejo de fugir
Ao mistério que é meu e me seduz.
Mas logo me triunfo. A sua luz
Não há muitos que a saibam reflectir.

A minh’alma nostálgica de além,
Cheia de orgulho, ensombra-se entretanto,
Aos meus olhos ungidos sobe um pranto
Que tenho a fôrça de sumir também.

Porque eu reajo. A vida, a natureza,
Que são para o artista? Coisa alguma.
O que devemos é saltar na bruma,
Correr no azul á busca da beleza.

É subir, é subir àlem dos céus
Que as nossas almas só acumularam,
E prostrados resar, em sonho, ao Deus
Que as nossas mãos de auréola lá douraram.

É partir sem temor contra a montanha
Cingidos de quimera e d’irreal;
Brandir a espada fulva e medieval,
A cada hora acastelando em Espanha.

É suscitar côres endoidecidas,
Ser garra imperial enclavinhada,
E numa extrema-unção d’alma ampliada,

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Se Eu Pudesse Trincar a Terra Toda

Se eu pudesse trincar a terra toda
E sentir-lhe um paladar,
Seria mais feliz um momento …
Mas eu nem sempre quero ser feliz.
É preciso ser de vez em quando infeliz
Para se poder ser natural…
Nem tudo é dias de sol,
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso tomo a infelicidade com a felicidade
Naturalmente, como quem não estranha
Que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e erva …
O que é preciso é ser-se natural e calmo
Na felicidade ou na infelicidade,
Sentir como quem olha,
Pensar como quem anda,
E quando se vai morrer, lembrar-se de que o dia morre,
E que o poente é belo e é bela a noite que fica…
Assim é e assim seja …

Minha Mãe, Minha Mãe!

Minha mãe, minha mãe! ai que saudade imensa,
Do tempo em que ajoelhava, orando, ao pé de ti.
Caía mansa a noite; e andorinhas aos pares
Cruzavam-se voando em torno dos seus lares,
Suspensos do beiral da casa onde eu nasci.
Era a hora em que já sobre o feno das eiras
Dormia quieto e manso o impávido lebréu.
Vinham-nos da montanha as canções das ceifeiras,
E a Lua branca, além, por entre as oliveiras,
Como a alma dum justo, ia em triunfo ao Céu!…
E, mãos postas, ao pé do altar do teu regaço,
Vendo a Lua subir, muda, alumiando o espaço,
Eu balbuciava a minha infantil oração,
Pedindo ao Deus que está no azul do firmamento
Que mandasse um alívio a cada sofrimento,
Que mandasse uma estrela a cada escuridão.
Por todos eu orava e por todos pedia.
Pelos mortos no horror da terra negra e fria,
Por todas as paixões e por todas as mágoas…
Pelos míseros que entre os uivos das procelas
Vão em noite sem Lua e num barco sem velas
Errantes através do turbilhão das águas.

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