Poemas Exclamativos de Egito Gonçalves

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Com Palavras

Com palavras me ergo em cada dia!
Com palavras lavo, nas manhĂŁs, o rosto
e saio para a rua.
Com palavras – inaudĂ­veis – grito
para rasgar os risos que nos cercam.
Ah!, de palavras estamos todos cheios.
PossuĂ­mos arquivos, sabemo-las de cor
em quatro ou cinco lĂ­nguas.
Tomamo-las Ă  noite em comprimidos
para dormir o cansaço.
As palavras embrulham-se na lĂ­ngua.
As mais puras transformam-se, violĂĄceas,
roxas de silĂȘncio. De que servem
asfixiadas em saliva, prisioneiras?
PossuĂ­mos, das palavras, as mais belas;
as que seivam o amor, a liberdade…
Engulo-as perguntando-me se um dia
as poderei navegar; se alguma vez
dilatarei o pulmĂŁo que as encerra.
Atravessa-nos um rio de palavras:
Com elas eu me deito, me levanto,
e faltam-me palavras para contar…

À Memória de Minha Mãe

MĂŁe! Morreste!
Agora Ă© tĂŁo tarde para te dizer as palavras necessĂĄrias.
O relógio bateu duas e meia. É noite escura
E a dor galopa surdamente no meu peito.
Teu corpo jaz ainda morno, jĂĄ sem interesse para ti.
Por tua causa, amanhĂŁ, movimentar-se-ĂŁo pessoas
Diversas
Que nĂŁo te conheceram.
Serão preenchidos papéis: requerimentos, boletins;
PĂĄs ou picaretas (nem eu sei) ferirĂŁo a terra
E sobre ela erguerĂŁo, depois, um nĂșmero qualquer
Que serĂĄ de futuro o teu bilhete de identidade.
Agora, porém, tudo ainda é quieto.
SĂł um galo canta, feliz, na sua inconsciĂȘncia de ser vivo.
As lĂĄgrimas rompem-me incontrolĂĄveis e inĂșteis.
É tarde!
JĂĄ sĂł existem saudades e fotografias.
As palavras que eu amaria ter-te dito
Sobem-me ao silĂȘncio dos lĂĄbios cerrados.
LĂĄ fora a chuva molha a madrugada
Enquanto os familiares se olham
Com o rosto congestionado de lĂĄgrimas
E sono interrompido,
Adorando-te em silĂȘncio,
Mais que nunca,
— Esmagados pelo prestígio da morte.

AnĂșncio no Ar

CĂ©us, nuvens, ondas, ventos,
dai-me notĂ­cias do meu amor norueguĂȘs.

Elementos da natureza gastos por tantos versos,
ferralha romĂąntica, brilhai de novo
e trazei-me notĂ­cias do meu amor norueguĂȘs.

Aquela que eu amei um verĂŁo na praia
– pĂ©rola cuja ostra era um barco de carvĂŁo,
matrĂ­cula de Bergen, essa mesma, elementos!,
notĂ­cias, notĂ­cias do meu amor norueguĂȘs.

A que veio dos fiordes e vivia num barco
encostado ao cais, junto de um guindaste;
a que me acendeu a manhĂŁ do amor,
a que abriu a porta Ă s tempestades,
a que me deu a chave da invenção…
Existe? Fugiu à ocupação? Morreu prisioneira?

NotĂ­cias, notĂ­cias do seu rosto que mal lembro,
do seu corpo de caule adolescente…
NotĂ­cias do seixo branco que trocĂĄmos
com palavras de amor em inglĂȘs mal decorado.

NotĂ­cias da que foi espiga mal madura,
notĂ­cias do meu amor norueguĂȘs.