Poemas sobre Lados de CecĂ­lia Meireles

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Poemas de lados de CecĂ­lia Meireles. Leia este e outros poemas de CecĂ­lia Meireles em Poetris.

Retrato de Mulher Triste

Vestiu-se para um baile que não há.
Sentou-se com suas Ăşltimas jĂłias.
E olha para o lado, imĂłvel.

Está vendo os salões que se acabaram,
embala-se em valsas que não dançou,
levemente sorri para um homem.
O homem que nĂŁo existiu.

Se alguém lhe disser que sonha,
levantará com desdém o arco das sobrancelhas,
Pois jamais se viveu com tanta plenitude.

Mas para falar de sua vida
tem de abaixar as quase infantis pestanas,
e esperar que se apaguem duas infinitas lágrimas.

Recado aos Amigos Distantes

Meus companheiros amados,
nĂŁo vos espero nem chamo:
porque vou para outros lados.
Mas Ă© certo que vos amo.

Nem sempre os que estĂŁo mais perto
fazem melhor companhia.
Mesmo com sol encoberto,
todos sabem quando Ă© dia.

Pelo vosso campo imenso,
vou cortando meus atalhos.
Por vosso amor Ă© que penso
e me dou tantos trabalhos.

NĂŁo condeneis, por enquanto,
minha rebelde maneira.
Para libertar-me tanto,
fico vossa prisioneira.

Por mais que longe pareça,
ides na minha lembrança,
ides na minha cabeça,
valeis a minha Esperança.

Apresentação

Aqui está minha vida — esta areia tão clara
com desenhos de andar dedicados ao vento.

Aqui está minha voz — esta concha vazia,
sombra de som curtindo o seu prĂłprio lamento.

Aqui está minha dor — este coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.

Aqui está minha herança — este mar solitário,
que de um lado era amor e, do outro, esquecimento.

Os Homens Gloriosos

Sentei-me sem perguntas Ă  beira da terra,
e ouvi narrarem-se casualmente os que passavam.
Tenho a garganta amarga e os olhos doloridos:
deixai-me esquecer o tempo,
inclinar nas mĂŁos a testa desencantada,
e de mim mesma desaparecer,
— que o clamor dos homens gloriosos
cortou-me o coração de lado a lado.

Pois era um clamor de espadas bravias,
de espadas enlouquecidas e sem relâmpagos,
ah, sem relâmpagos…
pegajosas de lodo e sangue denso.

Como ficaram meus dias, e as flores claras que pensava!
Nuvens brandas, construindo mundos,
como se apagaram de repente!

Ah, o clamor dos homens gloriosos
atravessando ebriamente os mapas!

Antes o murmĂşrio da dor, esse murmĂşrio triste e simples
de lágrima interminável, com sua centelha ardente e eterna.

Senhor da Vida, leva-me para longe!
Quero retroceder aos aléns de mim mesma!
Converter-me em animal tranquilo,
em planta incomunicável,
em pedra sem respiração.

Quebra-me no giro dos ventos e das águas!
Reduze-me ao pĂł que fui!
Reduze a pĂł minha memĂłria!

Reduze a pĂł
a memĂłria dos homens,

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Inscrição

Quem se deleita em tornar minha vida impossĂ­vel
por todos os lados?
Certamente estás rindo de longe,
ó encoberto adversário!

Mas a minha paciĂŞncia Ă© mais firme
que todas as sanhas da sorte:
mais longa que a vida, mais clara
que a luz no horizonte.

Passeio no gume de estradas tĂŁo graves
que afligem o prĂłprio inimigo.
A mim, que me importam espécies de instantes,
se existo infinita?

Guerra

Tanto Ă© o sangue
que os rios desistem de seu ritmo,
e o oceano delira
e rejeita as espumas vermelhas.

Tanto Ă© o sangue
que até a lua se levanta horrível,
e erra nos lugares serenos,
sonâmbula de auréolas rubras,
com o fogo do inferno em suas madeixas.

Tanta Ă© a morte
que nem os rostos se conhecem, lado a lado,
e os pedaços de corpo estão por ali como tábuas sem uso.

Oh, os dedos com alianças perdidos na lama…
Os olhos que já nĂŁo pestanejam com a poeira…
As bocas de recados perdidos…
O coração dado aos vermes, dentro dos densos uniformes…

Tanta Ă© a morte
que sĂł as almas formariam colunas,
as almas desprendidas… — e alcançariam as estrelas.

E as máquinas de entranhas abertas,
e os cadáveres ainda armados,
e a terra com suas flores ardendo,
e os rios espavoridos como tigres, com suas máculas,
e este mar desvairado de incêndios e náufragos,
e a lua alucinada de seu testemunho,
e nĂłs e vĂłs, imunes,
chorando,

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