Poemas sobre Noivos de Adélia Prado

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Poemas de noivos de Adélia Prado. Leia este e outros poemas de Adélia Prado em Poetris.

Casamento

HĂĄ mulheres que dizem:
Meu marido, se quiser pescar, pesque
mas que limpe os peixes.
Eu nĂŁo. A qualquer hora da noite me levanto,
ajudo a escamar, abrir, retalhar e salgar.
É tão bom, só a gente sozinhos na cozinha,
de vez em quando os cotovelos se esbarram,
ele fala coisas como ‘este foi difĂ­cil’
‘prateou no ar dando rabanadas’
e faz o gesto com a mĂŁo.
O silĂȘncio de quando nos vimos a primeira vez
atravessa a cozinha como um rio profundo.
Por fim, os peixes na travessa,
vamos dormir.
Coisas prateadas espocam:
somos noivo e noiva.

Os Lugares-Comuns

Quando o homem que ia casar comigo
chegou a primeira vez na minha casa,
eu estava saindo do banheiro, devastada
de angelismo e carĂȘncia. Mesmo assim,
ele me olhou com olhos admirados
e segurou minha mĂŁo mais que
um tempo normal a pessoas
acabando de se conhecer.
Nunca mencionei o facto.
Até hoje me ama com amor
de vagarezas, sĂșbitos chegares.
Quando eu sei que ele vem,
eu fecho a porta para a grata surpresa.
Vou abri-la como o fazem as noivas
e as amantes. Seu nome Ă©:
Salvador do meu corpo.

A Casa

É um chalĂ© com alpendre,
forrado de hera.
Na sala,
tem uma gravura de Natal com neve.
NĂŁo tem lugar pra esta casa em ruas que se conhecem.
Mas afirmo que tem janelas,
claridade de lĂąmpada atravessando o vidro,
um noivo que ronda a casa
— esta que parece sombria —
e uma noiva lĂĄ dentro que sou eu.
É uma casa de esquina, indestrutível.
Moro nela quando lembro,
quando quero acendo o fogo,
as torneiras jorram,
eu fico esperando o noivo, na minha casa aquecida.
NĂŁo fica em bairro esta casa
infensa à demolição.
Fica num modo tristonho de certos entardeceres,
quando o que um corpo deseja Ă© outro corpo pra escavar.
Uma ideia de exĂ­lio e tĂșnel.