Ninguém o Tinha Amado, Afinal
O pastor amoroso perdeu o cajado,
E as ovelhas tresmalharam-se pela encosta,
E de tanto pensar, nem tocou a flauta que trouxe pira tocar.
Ninguém lhe apareceu ou desapareceu.
Nunca mais encontrou o cajado.
Outros, praguejando contra ele, recolheram-lhe as ovelhas.
Ninguém o tinha amado, afinal.
Quando se ergueu da encosta e da verdade falsa, viu tudo:
Os grandes vales cheios dos mesmos verdes de sempre,
As grandes montanhas longe, mais reais que qualquer sentimento,
A realidade toda, com o céu e o ar e os campos que existem,
estão presentes.
(E de novo o ar, que lhe faltara tanto tempo, lhe entrou fresco
nos pulmões)
E sentiu que de novo o ar lhe abria, mas com dor,
uma liberdade
no peito.
Poemas sobre Presente de Alberto Caeiro
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Eu não Quero o Presente, Quero a Realidade
Vive, dizes, no presente,
Vive só no presente.Mas eu não quero o presente, quero a realidade;
Quero as cousas que existem, não o tempo que as mede.O que é o presente?
É uma cousa relativa ao passado e ao futuro.
É uma cousa que existe em virtude de outras cousas existirem.
Eu quero só a realidade, as cousas sem presente.Não quero incluir o tempo no meu esquema.
Não quero pensar nas cousas como presentes; quero pensar nelas
como cousas.Não quero separá-las de si-próprias, tratando-as por presentes.
Eu nem por reais as devia tratar.
Eu não as devia tratar por nada.Eu devia vê-las, apenas vê-las;
Vê-las até não poder pensar nelas,
Vê-las sem tempo, nem espaço,
Ver podendo dispensar tudo menos o que se vê.
É esta a ciência de ver, que não é nenhuma.