Poemas sobre Ruas de Fernando Pessoa

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Poemas de ruas de Fernando Pessoa. Leia este e outros poemas de Fernando Pessoa em Poetris.

De Quem Ă© o Olhar

De quem Ă© o olhar
Que espreita por meus olhos?
Quando penso que vejo,
Quem continua vendo
Enquanto estou pensando?
Por que caminhos seguem,
NĂŁo os meus tristes passos,
Mas a realidade
De eu ter passos comigo ?

Ă€s vezes, na penumbra
Do meu quarto, quando eu
Por mim prĂłprio mesmo
Em alma mal existo,

Toma um outro sentido
Em mim o Universo —
É uma nódoa esbatida
De eu ser consciente sobre
Minha idéia das coisas.

Se acenderem as velas
E nĂŁo houver apenas
A vaga luz de fora —
NĂŁo sei que candeeiro
Aceso onde na rua —
Terei foscos desejos
De nunca haver mais nada
No Universo e na Vida
De que o obscuro momento
Que Ă© minha vida agora!

Um momento afluente
Dum rio sempre a ir
Esquecer-se de ser,
Espaço misterioso
Entre espaços desertos
Cujo sentido Ă© nulo
E sem ser nada a nada.
E assim a hora passa
Metafisicamente.

Tomamos a Vila depois de um Intenso Bombardeamento

A criança loura
Jaz no meio da rua.
Tem as tripas de fora
E por uma corda sua
Um comboio que ignora.

A cara está um feixe
De sangue e de nada.
Luz um pequeno peixe
— Dos que bóiam nas banheiras —
Ă€ beira da estrada.

Cai sobre a estrada o escuro.
Longe, ainda uma luz doura
A criação do futuro…

E o da criança loura?

Olhando o mar, sonho sem ter de quĂŞ

Olhando o mar, sonho sem ter de quĂŞ.
Nada no mar, salvo o ser mar, se vĂŞ.
Mas de se nada ver quanto a alma sonha!
De que me servem a verdade e a fé?

Ver claro! Quantos, que fatais erramos,
Em ruas ou em estradas ou sob ramos,
Temos esta certeza e sempre e em tudo
Sonhamos e sonhamos e sonhamos.

As árvores longínquas da floresta
Parecem, por longĂ­nquas, ‘star em festa.
Quanto acontece porque se nĂŁo vĂŞ!
Mas do que há pouco ou não há o mesmo resta.

Se tive amores? Já não sei se os tive.
Quem ontem fui já hoje em mim não vive.
Bebe, que tudo Ă© lĂ­quido e embriaga,
E a vida morre enquanto o ser revive.

Colhes rosas? Que colhes, se hĂŁo-de ser
Motivos coloridos de morrer?
Mas colhe rosas. Porque nĂŁo colhĂŞ-las
Se te agrada e tudo Ă© deixar de o haver?