Primavera
Passei a Primavera de meus anos
Com maternais desvelos amorosos.
Com meiguices, afagos carinhosos,
Com mimos de solĂcitos afanos.Desenfaixado dos primeiros panos,
Pus-me em pé, dei passinhos vagarosos,
Logo corridas, saltos brincalhosos,
Travessuras de meninais enganos.Nesta idade infantil da Primavera,
Com outros meus iguais brincÔes folgava.
Ah, quĂŁo gostoso, entĂŁo, o tempo me era!Inocente brincar sĂł me encantava:
Feliz, se aqui ficando eu conhecera
A força do prazer que desfrutava!
Sonetos sobre Iguais de Francisco Joaquim Bingre
5 resultadosMorte
Num imenso salĂŁo, alto e rotundo,
De caveiras iguais, ossos sem dono,
Perpétua habitação de eterno sono
Que tem por tecto o CĂ©u, por base o mundo:Bem no meio, em silĂȘncio o mais profundo,
Se levanta da Morte o fatal trono:
Ceptros sem rei, arados sem colono,
São os degraus do sólio furibundo.Lanças, arneses pelo chão, quebrados,
Murchas grinaldas, bĂĄculos partidos,
Liras de vates, pastoris cajados,Algemas, ferros e brasÔes luzidos,
No terrĂvel salĂŁo sĂŁo misturados,
No palĂĄcio da Morte confundidos.
JuĂzo
Quando, nos quatro Ăąngulos da Terra,
Troarem as trombetas ressurgentes,
Despertadoras dos mortais dormentes,
Por onde um Deus irado aos homens berra:Prontos, num campo, em apinhada serra,
Todos nus assistir devem viventes
Ao JuĂzo Final e ver, patentes,
Seus delitos, que um livro eterno encerra.Então, aberto o Céu, e o Inferno aberto,
Todos ali verĂŁo: e a sorte imensa
Duma mĂĄgoa sem fim, dum gozo certo.VerĂŁo recto juiz pesar a ofensa
Na balança integral, e o justo acerto,
Dando da vida e morte igual sentença.
Terra
Ă Terra, amĂĄvel mĂŁe da Natureza!
Fecunda em produçÔes de imensos entes,
Criadora das prĂłvidas sementes
Que abastam toda a tua redondeza!Teu amor sem igual, sem par fineza,
Teus maternais efeitos providentes
DĂŁo vida aos seres todos existentes,
DĂŁo brio, dĂŁo vigor, dĂŁo fortaleza.Tu rasgas do teu corpo as grossas veias
E as cristalinas fontes de ĂĄgua pura
Tens, para a nossa sede, sempre cheias.Tu, na vida e na morte, com ternura
Amas os filhos teus, tu te recreias
Em lhes dar, no teu seio, a sepultura.
PrincĂpio de Amores com MarĂlia
Um rĂĄcimo ferral engrinaldado
Com rosas carmesins no seu regaço,
Tinha MarĂlia um dia, e o pĂ©, c’um laço,
De fita verde mar lhe tinha atado.Eu, de seus magos olhos jĂĄ tocado,
Junto dela cheguei com leve passo,
E furtando-lhe o cacho, dele faço
NĂ©ctar que a Jove, igual, nunca foi dadoEm taça de cristal, co’as mesmas rosas,
E do mesmo listĂŁo toda enfeitada,
O licor lhe fui pĂŽr nas mĂŁos mimosas.MarĂlia se sorriu, bebeu, corada,
O sagrado elixir e as deleitosas
PrimĂcias deu d’Amor, por Baco instada.