XLVII
Que inflexĂvel se mostra, que constante
Se vê este penhasco! já ferido
Do proceloso vento, e já batido
Do mar, que nele quebra a cada instante!NĂŁo vi; nem hei de ver mais semelhante
Retrato dessa ingrata, a que o gemido
Jamais pode fazer, que enternecido
Seu peito atenda Ă s queixas de um amante.Tal Ă©s, ingrata Nise: a rebeldia,
Que vĂŞs nesse penhasco, essa dureza
Há de ceder aos golpes algum dia:Mas que diversa é tua natureza!
Dos contĂnuos excessos da porfia,
Recobras novo estĂmulo Ă fereza.
Sonetos sobre Mar de Cláudio Manuel da Costa
3 resultadosXLV
A cada instante, Amor, a cada instante
No duvidoso mar de meu cuidado
Sinto de novo um mal, e desmaiado
Entrego aos ventos a esperança errante.Por entre a sombra fúnebre, e distante
Rompe o vulto do alivio mal formado;
Ora mais claramente debuxado,
Ora mais frágil, ora mais constante.Corre o desejo ao vê-lo descoberto;
Logo aos olhos mais longe se afigura,
O que se imaginava muito perto.Faz-se parcial da dita a desventura;
Porque nem permanece o dano certo,
Nem a glória tão pouco está segura
XLIX
Os olhos tendo posto, e o pensamento
No rumo, que demanda, mais distante;
As ondas bate o Grego Navegante,
Entregue o leme ao mar, a vela ao ventoEm vão se esforça o harmonioso acento
Da sereia, que habita o golfo errante;
Que resistindo o espĂrito constante,
Vence as lisonjas do enganoso intento.Se pois, ninfas gentis, rompe a Cupido
O arco, a flecha, o dardo, a chama acesa
De um peito entre os heróis esclarecido;Que vem buscar comigo a néscia empresa,
Se inda mais, do que Ulisses atrevido,
Sei vencer os encantos da beleza!