Houve uma Ilha em Ti
Houve uma ilha em ti que eu conquistei.
Uma ilha num mar de solidĂŁo.
Tinha um nome a ilha onde morei.
Chamava-se essa ilha Coração.Que saudades do tempo que passei.
Nenhum desses momentos foi em vĂŁo.
Do teu corpo, de ti, já nada sei.
TambĂ©m nĂŁo sei da ilha, nĂŁo sei, nĂŁo.SĂł sei de mim, coberto de raĂzes.
Enterrei os momentos mais felizes.
Vivo agora na sombra a recordar.A ilha que eu amei já não existe.
Agora amo o céu quando estou triste
por não saber do coração do mar.
Sonetos sobre Mar
243 resultadosBastava-nos Amar
Bastava-nos amar. E nĂŁo bastava
o mar. E o corpo? O corpo que se enleia?
O vento como um barco: a navegar.
Pelo mar. Por um rio ou uma veia.Bastava-nos ficar. E nĂŁo bastava
o mar a querer doer em cada ideia.
Já não bastava olhar. Urgente: amar.
E ficar. E fazermos uma teia.Respirar. Respirar. Até que o mar
pudesse ser amor em maré cheia.
E bastava. Bastava respirara tua pele molhada de sereia.
Bastava, sim, encher o peito de ar.
Fazer amor contigo sobre a areia.
No Jardim Das Oliveiras
“Minh’alma Ă© triste atĂ© Ă morte…” Doce,
Jesus falou… E o Nazareno santo
Chorava, como se a su’alma fosse
Um mar imenso de amargura e pranto.Depois, silencioso, ele afastou-se
E foi rezar no mais sombrio canto.
Seu grande olhar formoso iluminou-se
Fitando o etĂ©reo e estrelejado manto.“Pai, tem piedade…” E sua vez plangente
Tremia, enquanto pelas trevas mudas
Baixava manso o triste olhar dolente.Pobre Jesus! Como n’um sonho via:
Em cada sombra a traição de Judas,
Em cada estrela os olhos de Maria!
Caravelas
Cheguei a meio da vida já cansada
De tanto caminhar! Já me perdi!
Dum estranho paĂs que nunca vi
Sou neste mundo imenso a exilada.Tanto tenho aprendido e nĂŁo sei nada.
E as torres de marfim que construĂ
Em trágica loucura as destruĂ
Por minhas prĂłprias mĂŁos de malfadada!Se eu sempre fui assim este Mar-Morto,
Mar sem marés, sem vagas e sem porto
Onde velas de sonhos se rasgaram.Caravelas doiradas a bailar…
Ai, quem me dera as que eu deitei ao Mar!
As que eu lancei Ă vida, e nĂŁo voltaram!…
Ă€ Cruz
Se em golfo de sereias proceloso,
Empenho repetido do cuidado,
O sábio grego, ao duro mastro atado,
As sereias escapa cauteloso;Eu, no mar deste mundo tormentoso,
De sirtes e sereias povoado,
À vossa cruz, Senhor, sempre abraçado,
Os perigos escape venturoso.Oh! Livrai-me, meu Deus, de tanto astuto
Labirinto, de tanto cego encanto,
Para que colha desta planta o fruto;Que Ă© justo, doce Amor, em risco tanto,
Se salva a Ulisses um madeiro bruto,
Que a mim me salve este madeiro santo.
Ignotus
(A Salomão Sáragga)
Onde te escondes? Eis que em vĂŁo clamamos,
Suspirando e erguendo as mĂŁos em vĂŁo!
Já a voz enrouquece e o coração
Está cansado — e já desesperamos…Por cĂ©u, por mar e terras procuramos
O EspĂrito que enche a solidĂŁo,
E sĂł a prĂłpria voz na imensidĂŁo
Fatigada nos volve… e nĂŁo te achamos!CĂ©us e terra, clamai, aonde? aonde? —
Mas o EspĂrito antigo sĂł responde,
Em tom de grande tédio e de pesar:— Não vos queixeis, ó filhos da ansiedade,
Que eu mesmo, desde toda a eternidade,
TambĂ©m me busco a mim… sem me encontrar!
Canção da Partida
Ao meu coração um peso de ferro
Eu hei de prender na volta do mar.
Ao meu coração um peso de ferro… Lançá-lo ao mar.
Quem vai embarcar, que vai degredado,As penas do amor nĂŁo queira levar…
Marujos, erguei o cofre pesado, Lançai-o ao mar.
E hei de mercar um fecho de prata.
O meu coração Ă© o cofre selado.A sete chaves: tem dentro uma carta…
_ A Ăşltima, de antes do teu noivado.
A sete chaves, _ a carta encantada!E um lenço bordado… Esse hei de o levar,
Que é para o molhar na água salgada
No dia em que enfim deixar de chorar.
IdĂlio
Quando nĂłs vamos ambos, de mĂŁos dadas,
Colher nos vales lĂrios e boninas,
E galgamos dum fĂ´lego as colinas
Dos rocios da noite inda orvalhadas;Ou, vendo o mar das ermas cumeadas
Contemplamos as nuvens vespertinas,
Que parecem fantásticas ruĂnas
Ao longo, no horizonte, amontoadas:Quantas vezes, de sĂşbito, emudeces!
NĂŁo sei que luz no teu olhar flutua;
Sinto tremer-te a mão e empalidecesO vento e o mar murmuram orações,
E a poesia das coisas se insinua
Lenta e amorosa em nossos corações.
Triunfo Supremo
Quem anda pelas lágrimas perdido,
Sonâmbulo dos trágicoa flagelos,
É quem deixou para sempre esquecido
O mundo e os fúteis ouropéis mais belos!É quem ficou no mundo redimido,
Expurgado dos vĂcios mais singelos
E disse a tudo o adeus indefinido
E desprendeu-se dos carnais anelos!É quem entrou por todas as batalhas
As mãos e os pés e o flanco ensangüentado,
Amortalhado em todas as mortalhas.Quem florestas e mares foi rasgando
E entre raios, pedradas e metralhas,
Ficou gemendo mas ficou sonhando!
Frustração
Persegui-a com as mãos, como uma criança a um brinquedo.
Era um sonho; era mais: – a alegria que chega,
o prazer que nos toma e nos deixa inebriados,
atirando Ă corrente, num gesto, os sentidos…Ah! Povoou minhas noites de sono sem pálpebras;
dançava entre estrelas na distância, – via-a!
Meu destino! pensei, – eis o amor! – É esse sangue
que me queima por dentro e me agita: eis o amor!E alcancei-a! Eis o mar ao redor atordoante!
Nos meus braços em concha era como uma pérola
escondida, o mistĂ©rio do oceano a guardar…E de repente, Ă© estranho! esse vazio, esta ânsia!
Como a posse do amor está longe do amor
e o rumor que há na concha… está longe do mar!
Chuva De Fogo
Meus olhos vĂŁo seguindo incendiados
a chama da leveza nesta dança,
que mostra velho sonho acalentado
de ver a bailarina que me alcançaos sentidos em febre, inebriados,
cativos do delĂrio e dessa trança.
É sonho, eu sei. E chega enevoado
na mantilha macia da lembrança:o palco antigo, as luzes da ribalta,
renascença da graça do seu corpo,
balé de sedução, mar que me faltapara o mergulho calmo de um amante,
que se sabe maduro de esperar
essa viva paixĂŁo e seu levante.
Na Aldeia
A CristĂłvĂŁo Aires
Duas horas da tarde. Um sol ardente
Nos colmos dardejando, e nos eirados.
Sobreleva aos sussurros abafados
O grito das bigornas estridente.A taberna Ă© vazia; mansamente
Treme o loureiro nos umbrais pintados;
Zumbem Ă porta insectos variegados,
Envolvidos do sol na luz tremente.Fia Ă soleira uma velhinha: o filho
No céu mal acordou da aurora o brilho
Saiu para os cansaços da lavoura.A nora lava na ribeira, e os netos
Ao longe correm seminus, inquietos,
No mar ondeante da seara loura.
Simples Soneto
Desejado soneto este que Ă© escrito
sem as firulas graves do solene,
que leva na palavra o simples rito
da fala cotidiana. NĂŁo condeneno entanto, a falta de um estro especioso,
nem de brega rotule esse meu vezo.
Apenas sinta o som oco e poroso
do fundo mar de anĂŞmonas, o pesorarefeito das algas nos peraus.
Essa cantiga filtra nossos medos,
as culpas e os tabus, e dá-me o aval
para buscar o simples e em querê-loornamento de estética espartana
na faxina ao supérfluo que se espana.
Amor E Vida
Esconde-me a alma, no Ăntimo, oprimida,
Este amor infeliz, como se fora
Um crime aos olhos dessa, que ela adora,
Dessa, que crendo-o, crera-se ofendida.A crua e rija lâmina homicida
Do seu desdém vara-me o peito; embora,
Que o amor que cresce nele, e nele mora,
Só findará quando findar-me a vida!Ó meu amor! como num mar profundo,
Achaste em mim teu álgido, teu fundo,
Teu derradeiro, teu feral abrigo!E qual do rei de Tule a taça de ouro,
Ă“ meu sacro, Ăł meu Ăşnico tesouro!
Ó meu amor! tu morrerás comigo!
Carlos Gomes
Essa que plange, que soluça e pensa,
Amorosa e febril, tĂmida e casta,
Lira que raiva, lira que devasta,
E que dos prĂłprios sons vive suspensa.Guarda nas costas uma escala imensa,
Que, quando rompe, espaço fora, arrasta
Ora do mar as queixas ora a vasta
Sussurração de uma floresta densa.Ei-la muda, mas tal intensidade
Teve a mĂşsica enorme do seu choro
O dilúvio orquestral dos seus lamentos.Que muda assim, rotas as cordas há de
Para sempre vibrar o eco sonoro
Que sua alma lançou aos quatro ventos.
Floresce!
Floresce, vive para a Natureza,
Para o Amor imortal, largo e profundo.
O Bem supremo de esquecer o mundo
Reside nessa lĂmpida grandeza.Floresce para a FĂ©, para a Beleza
Da Luz que Ă© como um vasto mar sem fundo,
Amplo, inflamado, mágico, fecundo,
De ondas de resplendor e de pureza.Andas em vĂŁo na Terra, apodrecendo
Ă€ toa pelas trevas, esquecendo
A Natureza e os seus aspectos calmos.Diante da luz que a Natureza encerra
Andas a apodrecer por sobre a Terra,
Antes de apodrecer nos sete palmos!
AtĂ© que um Dia…
Meus versos eram rosas, lĂrios, heras,
borboletas, regatos, cotovias
cantando suas doces melodias,
anjos, sereias, ninfas e quimeras.Meus versos eram pombas entre as feras
e, na festa das horas e dos dias,
ia dançando penas e alegrias
e o ano tinha quatro primaveras.E a festa continua… Ă© tambĂ©m festa
o cardo e a urze, o tojo, a murta, a giesta,
a chuva no beiral, o vento Norte,o gosto a mar, a lágrimas, a sal,
até que um dia a vida, a bem ou mal,
exausta de cantar me empreste Ă morte.
Alucinação
Ă“ solidĂŁo do Mar, Ăł amargor das vagas,
Ondas em convulsões, ondas em rebeldia,
Desespero do Mar, furiosa ventania,
Boca em fel dos tritões engasgada de pragas.Velhas chagas do sol, ensangüentadas chagas
De ocasos purpurais de atroz melancolia,
Luas tristes, fatais, da atra mudez sombria
Da trágica ruĂna em vastidões pressagas.Para onde tudo vai, para onde tudo voa,
Sumido, confundido, esboroado, Ă -toa,
No caos tremendo e nu dos tempo a rolar?Que Nirvana genial há de engolir tudo isto –
– Mundos de Inferno e CĂ©u, de Judas e de cristo,
Luas, chagas do sol e turbilhões do Mar?!
Sonho Oriental
Sonho-me Ă s vezes rei, n’alguma ilha,
Muito longe, nos mares do Oriente,
Onde a noite é balsâmica e fulgente
E a lua cheia sobre as águas brilha…O aroma da magnĂłlia e da baunilha
Paira no ar diáfano e dormente…
Lambe a orla dos bosques, vagamente,
O mar com finas ondas de escumilha…E enquanto eu na varanda de marfim
Me encosto, absorto n’um cismar sem fim,
Tu, meu amor, divagas ao luar,Do profundo jardim pelas clareiras,
Ou descanças debaixo das palmeiras,
Tendo aos pés um leão familiar.
Cegueira Bendita
Ando perdida nestes sonhos verdes
De ter nascido e nĂŁo saber quem sou,
Ando ceguinha a tatear paredes
E nem ao menos sei quem me cegou!NĂŁo vejo nada, tudo Ă© morto e vago…
E a minha alma cega, ao abandono
Faz-me lembrar o nenĂşfar dum lago
´Stendendo as asas brancas cor do sonho…Ter dentro d´alma na luz de todo o mundo
E nĂŁo ver nada nesse mar sem fundo,
Poetas meus irmĂŁos, que triste sorte!…E chamam-nos a nĂłs Iluminados!
Pobres cegos sem culpas, sem pecados,
A sofrer pelos outros té à morte!