Sonetos Interrogativos

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Sonetos interrogativos sobre diversos assuntos para ler e compartilhar. Conheça estes e outros temas em Poetris.

Versos de Orgulho

O mundo quer-me mal porque ninguém
Tem asas como eu tenho! Porque Deus
Me fez nascer Princesa entre plebeus
Numa torre de orgulho e de desdém!

Porque o meu Reino fica para Além!
Porque trago no olhar os vastos céus,
E os oiros e os clarÔes são todos meus!
Porque Eu sou Eu e porque Eu sou Alguém!

O mundo! O que Ă© o mundo, Ăł meu amor?!
O jardim dos meus versos todo em flor,
A seara dos teus beijos, pĂŁo bendito,

Meus ĂȘxtases, meus sonhos, meus cansaços…
São os teus braços dentro dos meus braços:
Via LĂĄctea fechando o Infinito!…

Amor um Mal que Falta quando Cresce

Aquela fera humana que enriquece
A sua presunçosa tirania
Destas minhas entranhas, onde cria
Amor um mal que falta quando cresce;

Se nela o CĂ©u mostrou (como parece)
Quanto mostrar ao mundo pretendia,
Porque de minha vida se injuria?
Porque de minha morte se enobrece?

Ora, enfim, sublimai vossa vitĂłria,
Senhora, com vencer-me e cativar-me;
Fazei dela no mundo larga histĂłria.

Pois, por mais que vos veja atormentar-me,
JĂĄ me fico logrando desta glĂłria
De ver que tendes tanta de matar-me.

CrepĂșsculo

Teus olhos, borboletas de oiro, ardentes
Batendo as asas leves, irisadas,
Poisam nos meus, suaves e cansadas
Como em dois lĂ­rios roxos e dolentes…

E os lĂ­rios fecham… Meu Amor, nĂŁo sentes?
Minha boca tem rosas desmaiadas,
E as minhas pobres mĂŁos sĂŁo maceradas
Como vagas saudades de doentes…

O SilĂȘncio abre as mĂŁos… entorna rosas…
Andam no ar carĂ­cias vaporosas
Como pĂĄlidas sedas, arrastando…

E a tua boca rubra ao pé da minha
É na suavidade da tardinha
Um coração ardente palpitando…

Soneto

Fecham-se os dedos donde corre a esperança,
Toldam-se os olhos donde corre a vida.
PorquĂȘ esperar, porquĂȘ, se nĂŁo se alcança
Mais do que a angĂșstia que nos Ă© devida?

Antes aproveitar a nossa herança
De intençÔes e palavras proibidas.
Antes rirmos do anjo, cuja lança
Nos expulsa da terra prometida.

Antes sofrer a raiva e o sarcasmo,
Antes o olhar que peca, a mĂŁo que rouba,
O gesto que estrangula, a voz que grita.

Antes viver do que morrer no pasmo
Do nada que nos surge e nos devora,
Do monstro que inventĂĄmos e nos fita.

JĂĄ nĂŁo Vivi, SĂł Penso

JĂĄ nĂŁo vivo, sĂł penso. E o pensamento
Ă© uma teia confusa, complicada,
uma renda subtil feita de nada:
de nuvens, de crepĂșsculos, de vento.

Tudo Ă© silĂȘncio. O arco-Ă­ris Ă© cinzento,
e eu cada vez mais vaga, mais alheada.
Percorro o céu e a terra aqui sentada,
sem uma voz, um olhar, um movimento.

Terei morrido jĂĄ sem o saber?
Seria bom mas nĂŁo, nĂŁo pode ser,
ainda me sinto presa por mil laços,

ainda sinto na pele o sol e a lua,
ouço a chuva cair na minha rua,
e a vida ainda me aperta nos seus braços.

Paisagens De Inverno I

Ó meu coração, torna para trás.
Onde vais a correr, desatinado?
Meus olhos incendidos que o pecado
Queimou! – o sol! Volvei, noites de paz.

Vergam da neve os olmos dos caminhos.
A cinza arrefeceu sobre o brasido.
Noites da serra, o casebre transido…
Ó meus olhos, cismai como os velhinhos.

Extintas primaveras evocai-as:
– JĂĄ vai florir o pomar das maceiras.
Hemos de enfeitar os chapéus de maias.-

Sossegai, esfriai, olhos febris.
-E hemos de ir cantar nas derradeiras
Ladainhas…Doces vozes senis…-

Digo Que Esqueço

Creio que te esqueci… de agora em diante
jĂĄ nĂŁo hĂĄ nada entre nĂłs dois, nĂŁo hĂĄ,
– achaste-me orgulhoso e intolerante
e eu te achei menos fĂștil do que mĂĄ…

Foi um momento sĂł… foi um instante
essa nossa ilusĂŁo, e hoje, onde estĂĄ
aquele amor inquieto e delirante ?
– Bem que pensava: – Ă© falso! morrerĂĄ!

Sinto apenas que tenha te adorado,
e que hoje sofra em vĂŁo, inutilmente
procurando apagar todo o passado…

Digo que esqueço… que nĂŁo penso em ti!
– Mas nĂŁo te esqueço nunca, e justamente
porque fico a pensar que te esqueci.

LXXX

Quando cheios de gosto, e de alegria
Estes campos diviso florescentes,
EntĂŁo me vĂȘm as lĂĄgrimas ardentes
Com mais Ăąnsia, mais dor, mais agonia.

Aquele mesmo objeto, que desvia
Do humano peito as mĂĄgoas inclementes,
Esse mesmo em imagens diferentes
Toda a minha tristeza desafia.

Se das flores a bela contextura
Esmalta o campo na melhor fragrĂąncia,
Para dar uma idéia da ventura;

Como, Ăł CĂ©us, para os ver terei constĂąncia,
Se cada flor me lembra a formosura
Da bela causadora de minha Ăąnsia?

Paisagem Única

Olhas-me tu: e nos teus olhos vejo
Que eu sou apenas quem se vĂȘ: assim
Tu tanto me entregaste ao teu desejo
Que Ă© nos teus olhos que eu me vejo a mim.

Em ti, que bem meu corpo se acomoda!
Ah! quanto amor por os teus olhos arde!
Contigo sou? — perco a paisagem toda…
Longe de ti? — sou como um dobre Ă  tarde…

Adeuses aos casais dessas Marias
Em cuja graça o meu olhar flutua,
Tudo o que amei ao teu amor o entrego.

Choupos com ar de velhas Senhorias,
Castelo moiro donde nasce a Lua,
E apenas tu, a tudo o mais sou cego.

A Musa Enferma

Ó minha musa, então! que tens tu, meu amor?
Que descorada estĂĄs! No teu olhar sombrio
Passam fulguraçÔes de loucura e terror;
Percorre-te a epiderme em fogo um suor frio.

Esverdeado gnomo ou duende tentador,
Em teu corpo infiltrou, acaso, um amavio?
Foi algum sonho mau, visĂŁo cheia de terror,
Que assim te magoou o teu olhar macio?

Eu quisera que tu, saudĂĄvel e contente.
Só nobres idéias abrigasses na mente,
E que o sangue cristĂŁo, ritmado, te pulsara

Como do silabĂĄlirio antigo os sons variados,
Onde reinam, o par, os deuses decantados;
Febo — pai das cançÔes, e PĂŁ — senhor da seara!

Tradução de Delfim Guimarães

IV

Vagueiam suavemente os teus olhares
Pelo amplo céu franjado em linho:
Comprazem-te as visĂ”es crepusculares…
Tu Ă©s uma ave que perdeu o ninho.

Em que nichos doirados, em que altares
Repoisas, anjo errante, de mansinho?
E penso, ao ver-te envolta em véus de luares,
Que vĂȘs no azul o teu caixĂŁo de pinho.

És a essĂȘncia de tudo quanto desce
Do solar das celestes maravilhas…
– Harpa dos crentes, cĂ­tola da prece…

Lua eterna que nĂŁo tivesse fases,
Cintilas branca, imaculada brilhas,
E poeiras de astros nas sandĂĄlias trazes…

A Noite nĂŁo me Deu nenhum Sossego

Como voltar feliz ao meu trabalho
se a noite nĂŁo me deu nenhum sossego?
A noite, o dia, cartas dum baralho
sempre trocadas neste jogo cego.

Eles dois, inimigos de mĂŁos dadas,
me torturam, envolvem no seu cerco
de fadiga, de dĂșbias madrugadas:
e tu, quanto mais sofro mais te perco.

Digo ao dia que brilhas para ele,
que desfazes as nuvens do seu rosto;
digo Ă  noite sem estrelas que Ă©s o mel

na sua pele escura: o oiro, o gosto.
Mas dia a dia alonga-se a jornada
e cada noite a noite Ă© mais fechada.

Tradução de Carlos de Oliveira

Anima Mea

Estava a Morte ali, em pé, diante,
Sim, diante de mim, como serpente
Que dormisse na estrada e de repente
Se erguesse sob os pés do caminhante.

Era de ver a fĂșnebre bachante!
Que torvo olhar! que gesto de demente!
E eu disse-lhe: «Que buscas, impudente,
Loba faminta, pelo mundo errante?»

— Não temas, respondeu (e uma ironia
Sinistramente estranha, atroz e calma,
Lhe torceu cruelmente a boca fria).

Eu nĂŁo busco o teu corpo… Era um trofĂ©u
Glorioso de mais… Busco a tua alma —
Respondi-lhe: «A minha alma jå morreu!»

Estoicismo

(A Manoel Duarte de Almeida)

Tu que nĂŁo crĂȘs, nem amas, nem esperas,
Espírito de eterna negação,
Teu hålito gelou-me o coração
E destroçou-me da alma as primaveras…

Atravessando regiÔes austeras,
Cheias de noite e cava escuridĂŁo,
Como n’um sonho mau, sĂł oiço um nĂŁo,
Que eternamente ecoa entre as esferas…

— Porque suspiras, porque te lamentas,
Cobarde coração? Debalde intentas
OpĂŽr ĂĄ Sorte a queixa do egoĂ­smo…

Deixa aos tĂ­midos, deixa aos sonhadores
A esperança vĂŁ, seus vĂŁos fulgores…
Sabe tu encarar sereno o abismo!

Visita

Adornou o meu quarto a flor do cardo,
Perfumei-o de almiscar recendente;
Vesti-me com a purpura fulgente,
Ensaiando meus cantos, como um bardo;

Ungi as mĂŁos e a face com o nardo
Crescido nos jardins do Oriente,
A receber com pompa, dignamente,
Mysteriosa visita a quem aguardo.

Mas que filha de reis, que anjo ou que fada
Era essa que assim a mim descia,
Do meu casebre ĂĄ humida pousada?…

Nem princezas, nem fadas. Era, flor,
Era a tua lembrança que batia
Ás portas de ouro e luz do meu amor!

Soneto Da Perdida Esperança

Perdi o bonde e a esperança
Volto pĂĄlido para casa.
A rua Ă© inĂștil e nenhum auto
passaria sobre meu corpo.

Vou subir a ladeira lenta
em que os caminhos se fundem.
Todos eles conduzem ao
princĂ­pio do drama e da flora.

NĂŁo sei se estou sofrendo
ou se é alguém que se diverte
porque nĂŁo? na noite escassa

com um insolĂșvel flautim.
Entretanto hĂĄ muito tempo
nĂłs gritamos: sim! ao eterno.

Amor E Crença

E sĂȘ bendita!
H. Sienkiewicz

Sabes que Ă© Deus?! Esse infinito e santo
Ser que preside e rege os outros seres,
Que os encantos e a força dos poderes
ReĂșne tudo em si, num sĂł encanto?

Esse mistério eterno e sacrossanto,
Essa sublime adoração do crente,
Esse manto de amor doce e clemente
Que lava as dores e que enxuga o pranto?!

Ah! Se queres saber a sua grandeza,
Estende o teu olhar Ă  Natureza,
Fita a cĂșp’la do CĂ©u santa e infinita!

Deus Ă© o templo do Bem. Na altura Imensa,
O amor é a hóstia que bendiz a Crença,
ama, pois, crĂȘ em Deus, e… sĂȘ bendita!

O Inconsciente

O Espectro familiar que anda comigo,
Sem que pudesse ainda ver-lhe o rosto,
Que umas vezes encaro com desgosto
E outras muitas ansioso espreito e sigo.

É um espectro mudo, grave, antigo,
Que parece a conversas mal disposto…
Ante esse vulto, ascético e composto
Mil vezes abro a boca… e nada digo.

SĂł uma vez ousei interrogĂĄ-lo:
Quem Ă©s (lhe perguntei com grande abalo)
Fantasma a quem odeio e a quem amo?

Teus irmĂŁos (respondeu) os vĂŁos humanos,
Chamam-me Deus, ha mais de dez mil anos…
Mas eu por mim nĂŁo sei como me chamo…

ReminiscĂȘncia

Um dia a vi, nas lamas da miséria,
Como entre pĂąntanos um branco lĂ­rio,
Velada a fronte em palidez funérea,
O frio véu das noivas do martírio!

Pedia esmola — pequena e sĂ©ria —
Os seios, pastos de eternal delĂ­rio,
Cobertos eram de uma cor cinĂ©rea —
Seus olhos tinham o brilhar do cĂ­rio.

Tempos depois n’um carro — audaz, brilhante,
Uma mulher eu vi — febril, galante…
Lancei-lhe o olhar e… maldição! tremi…

Ria-se — cĂ­nica, servil… faceira?
O carro n’uma nuvem de poeira
Se arremessou… e eu nunca mais a vi!

Maldade

Tu podes ser igual a todo o mundo
teres defeitos mais que toda a gente,
– que importa ? se este amor cego e profundo
teima em dizer que te acha diferente!

Para mim (eu que te amo como um louco)
os que falam de ti sĂŁo lĂ­nguas mĂĄs,
– ah! todo o amor que te dedico Ă© pouco
e Ă© sempre pouco o amor que tu me dĂĄs!

Sou a sombra que segue os teus desejos
e aos teus pés, numa oferta extraordinåria
a minha alma vendeu-se por teus beijos…

Falam de ti… Escuto-os… Fico mudo…
Quanta maldade cruel, desnecessĂĄria
se eu jĂĄ sei quem tu Ă©s… se eu sei de tudo!