Sonetos sobre Melhor de Luís de Camões

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Lembranças, que lembrais meu bem passado

Lembranças, que lembrais meu bem passado,
Pera que sinta mais o mal presente,
Deixai-me, se quereis, viver contente,
NĂŁo me deixeis morrer em tal estado.

Mas se também de tudo está ordenado
Viver, como se vĂŞ, tĂŁo descontente,
Venha, se vier, o bem por acidente,
E dĂŞ a morte fim a meu cuidado.

Que muito melhor Ă© perder a vida,
Perdendo-se as lembranças da memória,
Pois fazem tanto dano ao pensamento.

Assim que nada perde quem perdida
A esperança traz de sua glória,
Se esta vida há-de ser sempre em tormento.

Quem presumir, Senhora, de louvar-vos

Quem presumir, Senhora, de louvar-vos
Com humano saber, e nĂŁo divino,
Ficará de tamanha culpa dino
Quamanha ficais sendo em contemplar-vos.

Não pretenda ninguém de louvor dar-vos,
Por mais que raro seja, e peregrino:
Que vossa fermosura eu imagino
Que Deus a ele sĂł quis comparar-vos.

Ditosa esta alma vossa, que quisestes
Em posse pĂ´r de prenda tĂŁo subida,
Como, Senhora, foi a que me destes.

Melhor a guardarei que a prĂłpria vida;
Que, pois mercĂŞ tamanha me fizestes,
De mim será jamais nunca esquecida.

Verdade, Amor, RazĂŁo, Merecimento

Verdade, Amor, RazĂŁo, Merecimento,
qualquer alma farĂŁo segura e forte;
porém, Fortuna, Caso, Tempo e Sorte,
tĂŞm do confuso mundo o regimento.

Efeitos mil revolve o pensamento
e nĂŁo sabe a que causa se reporte;
mas sabe que o que Ă© mais que vida e morte,
que não o alcança humano entendimento.

Doctos varões darão razões subidas,
mas sĂŁo experiĂŞncias mais provadas,
e por isso Ă© melhor ter muito visto.

Cousas há i que passam sem ser criadas
e cousas criadas há sem ser passadas,
mas o melhor de tudo Ă© crer em Cristo.

Dos Ilustres Antigos Que Deixaram

Dos ilustres antigos que deixaram
tal nome, que igualou fama Ă  memĂłria,
ficou por luz do tempo a larga histĂłria
dos feitos em que mais se assinalaram.

Se se com cousas destes cotejaram
mil vossas, cada ĂĽa tĂŁo notĂłria,
vencera a menor delas a mor glĂłria
que eles em tantos anos alcançaram.

A glória sua foi; ninguém lha tome.
Seguindo cada um vários caminhos,
estátuas levantando no seu Templo.

VĂłs, honra portuguesa e dos Coutinhos,
ilustre Dom JoĂŁo, com melhor nome
a vĂłs encheis de glĂłria e a nĂłs de exemplo.

Amor Fero e Cruel, Fortuna Escura

Grão tempo há já que soube da Ventura
A vida que me tinha destinada,
Que a longa experiĂŞncia da passada
Me dava claro indĂ­cio da futura.

Amor fero e cruel, Fortuna escura,
Bem tendes vossa força exprimentada;
Assolai, destruĂ­, nĂŁo fique nada;
Vingai-vos desta vida, que inda dura.

Soube Amor da Ventura que a nĂŁo tinha,
E por que mais sentisse a falta dela,
De imagens impossĂ­veis me mantinha.

Mas vĂłs, Senhora, pois que minha estrela
NĂŁo foi melhor, vivei nesta alma minha,
Que nĂŁo tem a Fortuna poder nela.

Quando nĂŁo te Vejo Perco o Siso

Formosura do CĂ©u a nĂłs descida,
Que nenhum coração deixas isento,
Satisfazendo a todo pensamento,
Sem que sejas de algum bem entendida;

Qual lĂ­ngua pode haver tĂŁo atrevida,
Que tenha de louvar-te atrevimento,
Pois a parte melhor do entendimento,
No menos que em ti há se vê perdida?

Se em teu valor contemplo a menor parte,
Vendo que abre na terra um paraĂ­so,
Logo o engenho me falta, o espĂ­rito mĂ­ngua.

Mas o que mais me impede inda louvar-te,
É que quando te vejo perco a língua,
E quando nĂŁo te vejo perco o siso.